Como uma espécie de Clark Kent, eles saem do escritório desafrochando o nó da gravata e buscando a segunda identidade ao jogar o paletó de lado. Ou seria a primeira identidade? Vinicius da Cunha, Rafael Zimath e Ricardo Nery Subires vivem a experiência de trocar de lado ao saírem de trabalhos burocráticos, que nada tem a ver com a atividade artística que desenvolvem paralelamente. O prêmio pela “vida dupla” é salvar a própria vida da rotina.
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Foi numa ida despretensiosa à uma loja de molduras que Ricardo Nery Subires descobriu seu talento. Na ocasião, a vendedora informou que artistas tinham descontos – qual foi sua surpresa ao tentar esclarecer que o resultado na tela fora apenas uma tentativa de abstrair o estresse do dia a dia como gerente de atendimento ao cliente em uma grande empresa de tecnologia de Joinville.
A aventura pelas tintas e telas surgiu em 2010, no segundo dia de férias. Ricardo acordou decidido a pintar. Sem entender nada de artes visuais, foi a uma loja e, com o auxílio da vendedora, saiu com telas, tintas e pincéis. Ele não sabia, mas era o início da vida de artista plástico.
Ricardo gerencia uma equipe de 70 pessoas e precisa estar disponível 24 horas por dia para atender a demanda dos cerca de 300 mil clientes da empresa. A graduação em processamento de dados e administração de empresas nunca o aproximou das artes plásticas. Além da constante pressão diária do meio empresarial, ele também precisava reservar tempo para a família.
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– Precisava encontrar algo que me colocasse no centro e que fosse a válvula de escape – desabafa.
Casado e pai de dois meninos, Ricardo teve melhora no humor e mais motivação depois de descobrir sua paixão pela arte. Há cerca de um ano, faz curso de pintura com a artista plástica Denise Schlickmann.
Nas telas, são frequentes os retratos de mulheres negras e de ícones do rock. Antes de frequentar as aulas, suas técnicas eram exóticas: no lugar do pincel, dedos, garfos e espátula. Atualmente, o gerente recebeu encomendas de amigos e colegas de trabalho, além do convite para criar um rótulo de cerveja. Em casa, o espaço está ficando restrito – são cerca de 20 telas finalizadas.
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Mesmo com certa flexibilidade de horário no escritório, os ensaios da banda ocorrem em horários nada convencionais – que pode ser ao meio dia ou às 23h30 de uma segunda-feira. A estratégia é necessária para se adaptar à rotina de cada integrante da banda.
Com dois ofícios tão diferentes ao primeiro olhar, o advogado nunca sofreu preconceito dos clientes, mas comentários como “que diferente” ou “que exótico” se tornaram comuns, geralmente vindos de pessoas mais tradicionais. Incentivo e elogios são mais frequentes do que o espanto.
– Ser músico é uma profissão que, querendo ou não, possui certa publicidade gratuita – comenta.
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O primeiro passo no teatro foi graças ao estímulo de uma professora do ensino médio, em 2001. Na época, ele encontrou o projeto da Univille e por lá ficou durante sete anos – e descobriu que o caminho era sem volta. Depois, se envolveu com outras companhias, outros projetos e, em 2008, montou a própria companhia teatral.
Conciliar as duas profissões não é impossível para Vinícius, mas existe certa dificuldade. A função de grande responsabilidade que assume na empresa exige dedicação extrema durante a semana.
O ritmo no teatro diminuiu – ele confessa que precisou ficar um tempo afastado e que não pode se envolver em projetos maiores e turnês, como gostaria. No entanto, ele avalia esta como uma escolha.
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– Viver do teatro é possível: minha esposa é atriz e professora de teatro. Passei por várias profissões, estava experimentando e descobrindo outras coisas, mas não é o que quero agora para mim – quem sabe, em alguns anos – avalia.
Vinicius considera o teatro uma paixão, e que uma profissão complementa a outra, mas foi o trabalho na arte que permitiu um novo horizonte para a atividade na empresa:
– O teatro é responsável por me dar um olhar mais sensível às questões humanas, valores e princípios que geralmente não existem nessas profissões corporativas.
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