A artista têxtil, designer e ambientalista, Nara Guichon, 66 anos, foi a única brasileira selecionada para a 1ª Bienal Internacional de Arte Material Contemporânea que acontece de junho a outubro na China. Das 150 obras escolhidas entre as 2 de duas mil inscritas, apenas oito são de artistas latino-americanos. Do Brasil, apenas o trabalho de Nara. 

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A primeira Bienal Internacional de Arte Material Contemporânea é organizada pelo Instituto de Arte do Departamento de Arte e Design da Universidade de Tsinghua, em Qingdao. A exposição vai de 20 de junho a 20 de novembro, e depois será levada para Beijing. A obra da brasileira se chama “Dormência” e tem como matéria-prima principal redes de pesca abandonadas e recolhidas junto ao litoral da Ilha de Florianópolis. Nara ainda utilizou algodão rejeitado pela indústria têxtil ou proveniente de roupas, também descartadas como lixo.

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Desde 1998 a artista trabalha com redes, as quais são transformadas em peças como tapetes, chales, mantas, esponjas. 

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– Dormência surgiu de forma espontânea, e não como um projeto pensado e elaborado. Recebeu este nome para dar uma sacudida neste estágio letárgico e entorpecido de grande parte da população que, por comodismo ou ignorância, continua com hábitos de consumo desenfreados e que nos leva para a crise climática e a morte do planeta.

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Quando o assunto é a obra que desenvolve, Nara prefere falar em resultados e não significados: 

– A grande colheita aos longos dos anos foi que, depois da venda direta para pessoas na porta da minha casa, no sul da Ilha, as peças foram levadas para o mundo. Com isso, algumas pessoas absorveram a ideia e começaram a criar com esta matéria-prima.

A artista reconhece que trabalhos como o dela trazem ganhos ao meio ambiente. Mas alerta sobre as ameaças que seguem: hoje 46% do lixo oceânico é formado por redes de pesca. Para ela, a questão exige uma mudança de comportamento: 

– Não conjugo mais o verbo comprar, mas criar. Temos material disponível no planeta para mais 300 anos fechando a produção e reaproveitando o disponível. O emprego e a economia não seriam afetados, pois se fixariam no reaproveitamento de tudo o que está aí. Poderíamos ganhar dinheiro, mas de uma forma limpa – sugere.

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Nara Guichon vive no Sul da Ilha de Santa Catarina há 39 anos e sempre se destacou pelo trabalho ecologicamente sustentável nas peças de roupa que produzia como tecelã, usando fios tingidos com pigmentos naturais, tornando-se referência com premiações nacionais e internacionais. Agora, mesmo voltada exclusivamente às artes plásticas, ela continua fazendo dos cuidados com o meio ambiente sua maior inspiração, reaproveitando materiais.

Veja imagens da obra da artista Nara Guichon:

Para se ter uma ideia da importância de “Dormência”: estima-se que cerca de 640 mil toneladas ao ano de redes são lançadas ao mar e carregadas através dos oceanos pela força das marés. As redes podem ficar nos mares e oceanos por até 6 mil anos. 

– A chamada “pesca fantasma” aniquila de maneira cruel milhões de animais marinhos todos os anos: tartarugas, focas, leões marinhos, golfinhos, tubarões e centenas de espécies de peixes e crustáceos. Quando a morte não se dá por prisão (o animal prende-se na rede e fica impossibilitado de se locomover ou se alimentar), ela ocorre por ingestão dos fragmentos das redes.

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Em 2020, Nara recebeu uma menção honrosa na Bienal Ibero-Americana, em Madrid, pelo vestido “Maréa”, feito com ecoprint e reuso de redes de pesca. A técnica usa impressão botânica e as folhas que caem das árvores são a matéria-prima utilizada. Entre 2016 e 2019, a artista foi premiada pelo Museu da Casa Brasileira. 

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“Dormência” já está na China, depois de uma viagem de dois meses. A Bienal será apresentada inicialmente on-line e, posteriormente, peças de arte selecionadas serão exibidas em galerias de arte e museus em toda a China, bem como em várias outras galerias na Europa e na América.

Quem é?

Nara Guichon é artista têxtil, designer e ambientalista. Gaúcha de Santa Maria, vive e trabalha, desde 1983, em Florianópolis. Sua atividade está alicerçada em três eixos: práticas manuais com fios (tricô, crochê, bordado, tear), valorizando saberes artesanais; reaproveitamento e sustentabilidade, promovendo o consumo ético e consciente; e o respeito ao meio ambiente, participando de atividades de recuperação da Mata Atlântica, no Brasil, bem como desenvolvendo trabalhos artísticos que evocam esse mesmo bioma.

Com contínua e reconhecida trajetória como tecelã, Nara Guichon concebeu e desenvolveu, entre 1975 e 2015, um vigoroso trabalho nas áreas de design e moda sustentáveis, que lhe rendeu diversos prêmios nacionais e internacionais.

Desde 2017, tem se voltado exclusiva e silenciosamente à produção artística. 

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