No momento em que o volume de negócios entre Brasil e Argentina dá sinais claros de recuperação, indústrias gaúchas voltam a encontrar problemas para vender para o país vizinho. Além de sapatos, tênis e sandálias, cargas de alimentos são barradas na fronteira, causando prejuízo de mais de R$ 7 milhões por mês.

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Autorizações para a importação de mercadorias têm sido negadas ou canceladas pelo governo de Cristina Kirchner sem nenhuma justificativa oficial. Apesar do valor ainda ser considerado pequeno – representa 4,4% na balança de exportações do Estado para a Argentina -, já preocupa empresários, que temem a reedição da ação protecionista praticada pelos vizinhos no passado recente.

A Oderich é uma das atingidas pela restrição. Por falta de liberação da Casa Rosada, a empresa se vê obrigada a manter no estoque milhares de latas de milho prontas para consumo e que foram vendidas para distribuidoras argentinas. As informações em espanhol e a marca estampada na embalagem impedem que o produto seja oferecido a outros clientes.

– São 25 carretas que deixamos de embarcar. É um prejuízo de R$ 1,5 milhão por mês – estima o empresário Marcos Oderich.

A estratégia agora é sensibilizar o governo brasileiro para que faça a mediação do impasse. Até o momento, no entanto, o Ministério do Desenvolvimento não tomou posição oficial.

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– Falta uma medida mais enérgica do governo brasileiro. Os argentinos dão tratamento diferenciado só quando convém – critica o diretor de exportações da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs), Cezar Müller.

A indústria calçadista faz coro às queixas. Em agosto, 346 mil pares de sapatos ficaram parados nas fábricas.

– O prejuízo chega a US$ 6,2 milhões, mas pode ser maior. A primeira remessa da linha primavera-verão serve como teste. Se o consumidor gosta do produto, o comerciante encomenda mais pares. Se a autorização chegar dois meses depois, já é tarde – afirma o presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Heitor Klein.

Apesar de ainda não ter recebido reclamações formais de outros setores, o presidente da Câmara de Comércio Brasil-Argentina, Alberto Alzueta, diz que o descontentamento dos empresários brasileiros é cada vez maior. Nascido em Buenos Aires e radicado em São Paulo, Alzueta conta que durante seminário realizado na Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), na semana passada, vários segmentos da indústria se queixavam de dificuldades para negociar com os vizinhos.

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– Após oito meses de tranquilidade, começaram a surgir novamente problemas para exportar. O governo Kirchner tem adotado essa estratégia silenciosa. Não assume a barreira, mas nega permissões quando bem entende. A tendência é de que o atraso para essas liberações aumente devido à fuga de dólares que o país enfrenta – explicou Alzueta.

Com a justificativa de proteger a combalida indústria do país, o poderoso secretário de Comércio Interior argentino, Guillermo Moreno, não tem pudor de tomar alguma decisão que possa prejudicar a relação amistosa entre vizinhos. De 2008 para cá, diferentes medidas causaram impacto direto na balança comercial entre Brasil e Argentina.

Primeiro, foram as licenças não automáticas, que obrigavam o importador a cumprir uma série de requisitos para poder trazer produtos ao país. Depois, o governo argentino passou a exigir a Declaração Jurada Antecipada de Importação (DJAI), uma maneira alternativa de controle da balança comercial. Empresas argentinas só podem gastar um dólar em produtos importados se assumirem o compromisso de trazer outro.

– Fizemos tudo absolutamente igual ao que vínhamos fazendo. Pedidos que antes eram aceitos estão sendo recusados e não recebemos nenhuma explicação. Isso preocupa, pois lá é destino de 16% das nossas vendas para o Exterior. É reedição das antigas barreiras – diz John Schmidt, da West Coast, umas das empresas que tiveram a venda de produtos impedida.

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Segmentos de máquinas buscou mais parceiros

Denílson Silveira, responsável pela distribuição da Piccadilly no Mercosul relata problema semelhante. No último mês, 20 dos 22 pedidos foram negados.

– Quando o dólar começa a ficar atraente para quem exporta, os velhos problemas argentinos aparecem de novo – compara.

Uma das principais vítimas do temperamento instável do vizinho no passado, o setor de máquinas agrícolas ainda não teve o desempenho afetado pelas novas restrições argentinas. O motivo é o bom momento que o agronegócio brasileiro vive. Com a demanda em alta, os fabricantes conseguem manter as vendas para o mercado interno.

– Às duras penas aprendemos a lição. Procuramos outros parceiros comerciais e reduzimos nossa dependência. Por isso, os impactos são bem menores neste ano – explica Claudio Bier, presidente do Sindicato das Indústrias de Máquinas e Implementos Agrícolas do Estado (Simers).

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