Amigos conversam animadamente sobre futebol e, de repente, todos ficam em dúvida em relação a um resultado do Campeonato Brasileiro do ano passado. Rapidamente, um deles pega o celular, acessa a internet e dá a resposta que todos esperavam. Mas se este amigo for o policial aposentado Nelson Mendes Francelino, a ferramenta de busca será bem diferente.
Continua depois da publicidade
Ele certamente se dirigirá a um cômodo no fundo da casa, pegará uma das dezenas de pastas e consultará as anotações que faz no papel. Difícil acreditar que, em tempos em que a tecnologia está tão perto, ainda existam pessoas que preferem o bom e velho caderno de anotação.
Seu Nelson, que tem 66 anos, pode ser considerado por muitos como um homem conservador. Mas podemos defini-lo como alguém que tem um passatempo inusitado. Desde 1982, ele anota os resultados dos principais campeonatos sul-americanos e nacionais, dos estaduais de Santa Catarina e do Rio de Janeiro e da Fórmula 1. O que começou como um hobby se tornou quase uma obsessão, que o aposentado não quer abandonar tão cedo.
– Se eu parar de fazer isso, vou ficar louco. Até a minha mulher admite isso – comenta o ex-policial militar.
Continua depois da publicidade
Todos os dias de manhã, a rotina do seu Nelson é a mesma. Ele acorda por volta das 6h, prepara o chimarrão e se senta à mesa que fica na área de festas, no fundo da casa no Bairro Costa Cavalcante, em Itajaí, esperando a chegada do Jornal de Santa Catarina. Depois de passar por ler praticamente todo o jornal, ele chega na editoria de esporte e dá uma atenção especial às tabelas que mostram os resultados dos jogos do dia anterior.
Ele pega o jornal, vai até a papelaria perto de casa e tira cópia. Então, repassa para o primeiro rascunho e confere com os programas de esporte que passam na hora do almoço. Aí, ele passa para um segundo rascunho e, só depois disso, eles vão para o caderno oficial, escritos em livros ata, e guardados. Com um cuidado especial, usando canetas de diferentes cores para destacar, principalmente, os times de coração e os catarinenses em competições nacionais e internacionais.
– Eu sou muito organizado, não gosto de ver nada fora do lugar – explica seu Nelson.
Cadernos se perderam nas enchentes
Umas das maiores desilusões de seu Nelson foi perder quase todos os cadernos nas enchentes de 2008 e 2011. Além de perder quase tudo o que tinha dentro de casa, ainda teve que conviver com a ideia de que não veria mais aquilo que lhe dá tanto gosto de fazer. Uma desilusão que ele quase não suportou.
Continua depois da publicidade
– Eu fiquei desnorteado em 2008. Saí de casa, fui para o bar e enchi a cara. Depois percebi que isso não resolveu em nada. E desde então, não coloquei uma gota de álcool na boca. Aqui em casa, só cerveja sem álcool e o vinho é apenas para as visitas – comenta.
Mesmo assim ele não desistiu e continua fazendo uma das coisas que mais lhe dá prazer. Acompanhar futebol às quartas à noite e aos domingos à tarde é quase um ritual religioso. E em tempos em que se é possível acompanhar quatro partidas simultaneamente no sistema de mosaico na TV fechada, seu Nelson, que assiste apenas a TV aberta, resolveu colocar dois aparelhos de televisão na sala. Em um, a programação local e, no outro, o sinal vem na parabólica. Por isso, ele consegue assistir a dois jogos diferentes ao mesmo tempo.
– É só deixar uma no mudo. Quando vejo que sai gol, aí troco. No fim do jogo, aproveito e já anoto os resultados, por isso deixo o bloquinho de rascunho na mesa do lado – comenta.
Continua depois da publicidade
Paixão alvinegra declarada por toda a casa
Quando a reportagem ia a caminho da casa de seu Nelson, uma das primeiras perguntas que pensamos em fazer era para descobrir o time de coração dele. Nem foi preciso. Logo na recepção, um relógio com as cores preta e branca e a cruz de malta em destaque nos informavam que ali morava um vascaíno. Em todos os cômodos da casa, há pelo menos uma referência ao clube de coração. E que fala abertamente sobre a situação instável que o time passa.
– Imagina você trabalhar e não saber quando receber. Lógico que vai ficar abalado, não terá a mesma motivação.
Nas anotações dele, foi possível ver que, além do Vasco, outro clube da Série A do Brasileirão aparecia em destaque – o Criciúma. Seu Nelson explicou que, em Santa Catarina, é o clube pelo qual nutre maior simpatia. Na verdade, isso vem da infância. Natural de Gravatal, no Sul do Estado, se acostumou a acompanhar o Metropol. E quando este virou Criciúma, a simpatia também foi transferida de clube.
Continua depois da publicidade
Seu Nelson não se considera um especialista em futebol ou fórmula 1. É apenas um apaixonado pelo esporte e que aproveitou isso para criar um passatempo que lhe dá prazer.