A diminuição da diferença de Fernando Haddad (PT) para Jair Bolsonaro (PSL) nas pesquisas dos últimos dias deu um suspiro de esperança à esquerda. Mas a leve reação de Haddad não se ergueu mais que uma espécie de melhora antes da morte para a coligação PT, PCdoB e Pros.

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O ato final da campanha foi no auditório de um hotel no bairro Paraíso, em São Paulo. Havia menos camisas com estampas engajadas, menos bonés do MST, menos lideranças petistas. Antes mesmo da primeira parcial eleitores já se diziam “com o coração apertado”, celular guardado, sem selfies nem lives como no primeiro turno. Até o vermelho das roupas deixou de predominar. Cenário que revelava indício de uma melancólica derrota depois de muita esperança alimentada nos últimos dias. Agora, o partido promete adotar a resistência na oposição.

A noite de lamento no hotel fechou uma campanha petista que nasceu trôpega. Primeiro pela articulação que insistiu no PT como cabeça da chapa e isolou Ciro Gomes (PDT), afastando a possibilidade de uma chapa única de esquerda. Foram vários os desvios de rota desde a convenção nacional do partido, no começo de agosto. A começar pelo candidato. A primeira aposta foi tentar “botar o retrato do velho outra vez, no mesmo lugar”, como no jingle de Getúlio. A insistência em forçar uma candidatura do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva, preso desde abril, enervou a alta parcela do eleitorado antipetista e foi levada até o último momento, em 31 de agosto.

Diferente do primeiro turno, quando Haddad pregava ser Lula, nesta segunda etapa da votação, Haddad tentou ser mais Haddad. Apostou em uma disputa entre democracia contra o autoritarismo de Bolsonaro. Afastou a imagem de Lula e a cor vermelha da campanha, aderindo ao verde e amarelo. Advogado, mestre em Economia e doutor em Filosofia pela Universidade de São Paulo (USP), Haddad conseguiu ser mais didático no segundo turno. Escancarou as diferenças para o candidato do PSL ao abordar a defesa que Bolsonaro já fez da tortura e as falas que ameaçam instituições como o Supremo Tribunal Federal (STF).

No entanto, a frente democrática que o candidato defendeu, no estilo Diretas Já, não avançou. Nomes como Ciro Gomes e Marina Silva anunciaram apenas um chamado apoio crítico, sem engajamento na campanha. Até mesmo aliados como Cid Gomes (PDT) e o rapper Mano Brown apoiaram o PT ao mesmo tempo em que puxavam a orelha do partido, apontando os erros petistas no governo ou o distanciamento da base de eleitores. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) não se posicionou.

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Mesmo assim, Haddad sai maior desta eleição. Numa disputa em que o PT dizia não ter plano B, ele entrou como prefeito derrotado em São Paulo e alternativa C – já que o substituto de Lula preferido do partido seria Jaques Wagner, ex-governador da Bahia. Em um mês e meio, o professor conseguiu transferir as intenções de voto de Lula, liderar a votação em oito dos nove estados do Nordeste e se colocar como referência democrática em um momento de poucos protagonistas no partido e até na própria esquerda.

Não se pode dizer o mesmo do PT. O partido elegeu quatro governadores, mas todos no Nordeste. Perdeu o governo de Minas Gerais, segundo maior colégio eleitoral do país, mesmo após manobra com o PSB e viu derrotas simbólicas de nomes como Lindbergh Farias, Eduardo Suplicy e Dilma Rousseff, que não chegaram ao Senado. Somado a isso, um sentimento antipetista forte, alimentado por questões como a prisão de lideranças do partido na Operação Lava-Jato, a corrupção na Petrobras e a crise econômica. Com a primeira derrota nas urnas desde 2002 em eleição presidencial, o ambiente agora reserva um desafio duplo para o PT: de um lado, reorganizar o partido com novas lideranças, fazendo a famigerada autocrítica dos erros cometidos quando foi governo. De outro, tentar aproveitar as conquistas alcançadas para se construir na oposição.

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