Tiffany Tran tem 1,55 de altura e pesa 75 quilos. Ela é vegetariana e faz mestrado em biologia. Além disso, é lutadora de sumô.

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Ela já conquistou o título de sumô dos pesos-médios dos EUA, mas veio até aqui em um fim de semana recente com um objetivo singular: defender sua posição.

– As pessoas acham que o sumô é um esporte de homens gordos e barrigudos de fraldas – afirmou Tran, que compete há quatro anos – Mas não é nada disso.

O recente campeonato nacional de sumô, realizado ao longo de um dia na sala de conferências do Snow King Hotel, na cidade, viu uma série de competidores com todas as formas e históricos. Havia suor, pancadas, tapas, estrias e celulites, além de um arco-íris de tatuagens. Havia um professor do Havaí, um conselheiro de adoção de animais de estimação da Califórnia, um fortão do Tennessee, um estudante universitário do Texas e uma modelo plus size de Idaho.

Uma coisa que o campeonato quase não tinha: muitas mulheres.

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Não é nada fácil convencer mulheres a lutarem sumô, o antigo esporte de contato do Japão. Neste país com quase 315 milhões de pessoas, onde a ansiedade em relação a autoimagem pode ser considerada um esporte nacional, há menos de uma dúzia de lutadoras de sumô que levam a coisa a sério.

Tran está entre as seis americanas que se qualificaram em Jackson Hole para competir internacionalmente, entre as 10 que estavam presentes.

– Ser uma lutadora de sumô pode ser uma experiência solitária – afirmou Tran.

Tradicionalmente, as academias de sumô proíbem as mulheres de competir e o Japão ainda não conta com lutadoras nas ligas profissionais.

Porém o sumô cresceu para muito além do Japão nos últimos anos, em especial na Ásia e na Europa Oriental. A Federação Internacional de Sumô conta com 80 nações registradas, incluindo Botswana, Uzbequistão, Peru e Nova Zelândia. Lutadoras da Rússia, Japão, Holanda e Mongólia venceram recentemente os títulos mundiais amadores. Porém há pouquíssimas nos EUA.

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Ainda assim, muitos fãs pedem para que o sumô seja reconhecido com um esporte olímpico, esperando que (embora isso seja improvável) a oportunidade se ser incluído nas Olímpiadas de 2020 em Tóquio, no país onde o esporte foi criado.

Os esportes de combate femininos têm ganhado cada vez mais espaço nos EUA. Claressa Shields venceu a medalha de ouro do boxe feminino nos Jogos Olímpicos de Londres em 2012, quando a modalidade começou a valer medalhas. As americanas também conseguiram medalhas no taekwondo e no judô.

Nos últimos anos, esportes de combate não olímpicos como o MMA floresceram por meio de exageros televisivos e campeonatos locais.

Entretanto, o sumô americano ainda espera para decolar, afirmou Andrew Freund, presidente da USA Sumo.

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– O que está acontecendo agora é uma iniciativa pioneira – comentou – Estamos começando do zero. É um desafio conseguir treinadores bem formados, fazer a divulgação e familiarizar as pessoas com as regras básicas.

O campeonato recente em Jackson Hole contou com 36 lutadores de 13 a 61 anos de idade. Todos lutaram gratuitamente e pagaram para chegar até lá. Alguns, como Brittany Moreau de 53,5 quilos, eram magros. Outros, como Jay Holder, pesavam mais de 181 quilos.

A maioria usava o mawashi tradicional – que se parece com uma fralda, para os olhos destreinados – sobre macacões de luta ou shorts e camiseta. Eles competiram sobre tapetes de luta reciclados e unidos por fita adesiva.

O cheiro de suor e batatas fritas tomava conta do ar. Em um toque incongruente que lembrava mais Las Vegas do que um dohyo tradicional, os juízes estavam vestidos de terno branco e luvas e gravatas borboleta pretas.

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Jenelle Hamilton, uma peso-leve tática de 59 quilos de Palmdale, na Califórnia, afirmou que tinha dificuldade para recrutar as amigas.

– Todo mundo quer assistir, mas ninguém quer participar – afirmou.

Trent Sabo, caminhoneiro de Idaho e competidor dos pesos-médios, afirmou que o sumô ainda carregava um certo estigma.

– Que mulher americana quer ser conhecida como uma lutadora de sumô? – questionou Sabo. Ele foi o treinador de diversas mulheres na competição, mas afirmou que o esporte ainda tem um longo caminho à frente.

Ainda assim, gosta do esporte porque tem a oportunidade de viajar e conhecer pessoas. E ele gosta de nadar contra a maré.

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– Não é um esporte dos mais comuns – afirmou Sabo.

Os patrocinadores são raros no sumô.

– Não há chuteiras Nike no sumô – afirmou Kelly Gneiting, o lutador aposentado de 193 quilos que organizou o evento em Jackson Hole. Sua filha de 16 anos, Sarena, competiu este ano pela primeira vez, recebendo o título júnior de pesos-pesados.

As regras do sumô são muito simples: derrube seu oponente ou tire-o do ringue por meio de uma série de técnicas, incluindo agarrar o mawashi. Os lutadores começam batendo palmas uma única vez para acordar os deuses, então levantam os braços para mostrar que não estão armados.

– Trata-se de demonstrar que estão limpos – afirmou Gneiting.

As lutas geralmente duram poucos segundos, o que pode tornar o esporte desagradável para assistir. Cada combate se parece mais com uma trombada na zaga do que com a narrativa cheia de rounds de uma luta de boxe.

Um a um, os competidores são pesados em uma balança de banheiro, uma prática que frequentemente impede a entrada de mulheres, afirmou Amanda Soule, uma peso-pesado de Boise, em Idaho.

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– As pessoas perguntam se não podem colocar o peso que aparece na carteira de motorista – afirmou Soule, que tem pouco menos de 168 quilos – Por isso acho que esse é um grande problema desde o princípio.

Soule, que é modelo plus-size, contou que começou a lutar sumô há 10 anos após assistir a uma luta em Tóquio.

– Esse é um dos lugares onde meninas grandes também podem competir – comentou.

Soule afirmou que “as pessoas olham mais” quando ela conta que é lutadora de sumô, do que quando revela seu emprego como modelo erótica.

Quando as lutas começaram, as mulheres tentaram encontrar uma sala onde pudessem se trocar. A busca não foi bem sucedida. Ao invés disso, três mulheres colocaram seus mawashis escondidas atrás das arquibancadas quase vazias.

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– Quero que fique superapertado – afirmou Soule.

Tran queria competir na divisão de pesos-médios, mas não havia ninguém contra quem ela pudesse lutar. Por isso entrou na divisão aberta, na qual terminou em terceiro lugar.

– É preciso confiar em seu corpo – disse Kendra Brinker, massagista de Idaho Falls que participará de competições internacionais pelos EUA. Ela lutou usando uma sombra azul nos olhos e com o cabelo preso em forma de moicano.

Hamilton, uma das menores lutadoras que se qualificou para os campeonatos mundiais em Taipei no mês de agosto, ficou em primeiro lugar em sua divisão, assim como Soule e Tran. Nenhuma delas sabe se poderá pagar a viagem.

– Se você gasta com o sumô, não sobra dinheiro para as outras coisas – afirmou Hamilton – A vida exige muito e precisamos fazer escolhas.

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Com o cair da noite, Celine VanHoye, de Highland Village, no Texas, que pesa 56,7 qulos, assistia um homem de 181 quilos atacar seu oponente como um rinoceronte. VanHoye, de 18 anos, venceu a competição aberta de júniores naquela manhã e ficou com a medalha de prata na competição feminina dos pesos-leves durante a tarde.

De braços cruzados, ela observava, estudando silenciosamente os movimentos daquele homem enorme. Ela ainda vestia seu mawashi em torno da cintura.

Será que ela seria páreo para ele? Ela franziu as sobrancelhas.

– Eu poderia tentar – respondeu.