Um dispositivo criado por cientistas gaúchos está na lista de projetos que podem ser testados pela Nasa, agência espacial americana, até o fim do ano. O aparelho para coletar sangue de astronautas em missões espaciais foi desenvolvido no Centro de Microgravidade da Pontifícia Universidade Católica (PUCRS) sob supervisão da doutora em medicina aeroespacial Thais Russomano.

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A finalidade do dispositivo é evitar a contaminação do sangue pelo ambiente e do ambiente pelo sangue, oferecendo análises mais precisas. Para entender o desafio, deve-se lembrar que a força gravitacional se aproxima do zero no espaço. Se um copo quebra, por exemplo, os cacos não caem, flutuam. O mesmo pode acontecer com o sangue coletado de um astronauta.

– Há o risco de ele se espalhar, infectando os equipamentos, a própria espaçonave ou outros astronautas – diz Thais, coordenadora do Centro de Micrograviade.

Foi essa lacuna que ela e sua equipe buscaram preencher ao criar o coletor, cujos primeiros protótipos são do século passado: 1999. De lá para cá, o trabalho foi para aprimorar o equipamento e torná-lo mais compacto, leve e fácil de manusear. A primeira versão pesava 600 gramas, enquanto a atual é 30 vezes mais leve.

– Uma redução interessante, já que, para sair do planeta, a Nasa cobra por quilo – diz um dos envolvidos no projeto, Mario Vian, também da PUCRS.

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O aparelho coleta sangue anaerobicamente, ou seja, sem contato com o oxigênio e o gás carbônico do ar. Sem a interferência dessas substâncias, os resultados dos exames são mais certeiros: estima-se que, em uma crise de asma do paciente, sejam necessários apenas cinco minutos para que o analisador revele a condição sanguínea.

A comprovação do funcionamento do dispositivo veio em 2006, quando foi testado durante voos que simulam o ambiente espacial. Pela facilidade de uso, o dispositivo também pode ser utilizado na Terra, em hospitais, ambulâncias, postos de saúde e consultórios médicos. A PUCRS já está buscando parcerias para a fabricação e a comercialização do produto, concebido para ser descartável.

O equipamento ganhou visibilidade internacional. Integra um protocolo de pesquisa da Universidade de Oxford, na Inglaterra, que depende da aprovação da Nasa para voar na atmosfera e avaliar a função pulmonar de astronautas no espaço. Os velhos protótipos e o modelo atual foram incluídos na exposição permanente do Museu de Ciências de Londres.

– Uma recompensa inestimável para um pesquisador – resume a médica.

Como funciona

– O lóbulo da orelha é massageado com um creme vasodilatador, para concentrar o sangue

– Encaixa-se o lóbulo da orelha do paciente no aparelho

– Gira-se o dispositivo e o bisturi se expande, fazendo um corte milimétrico no lóbulo

– Ao girar novamente a estrutura, o sistema de coleta se alinha ao corte e puxa de três a quatro gotas de sangue

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– O dispositivo é acoplado a uma máquina de análise, que poderá verificar a concentração de gases arteriais no sangue, entre outros tipos de exames