Com 52 anos de palco nos teatros catarinenses, 50 peças no currículo e 70 anos de idade, o veterano Édio Nunes ainda consegue feitos inéditos, como com o monólogo Eu Confesso!, escrito e dirigido sob medida por Antônio Cunha. Imagine Deus revelando sua versão sobre o processo da criação, com detalhes inusitados. É basicamente esse o enredo da peça que estreia na sexta-feira, dia 4 de abril, no Teatro Armação, Praça XV, no Centro de Floripa, e segue em cartaz de sexta a domingo, às 20h, durante todo o mês de abril.

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Na entrevista à coluna, Édio conta um pouco da sua vida de artista e do frio na barriga que está sentindo em subir ao palco sozinho pela primeira vez. A representação está no DNA deste homem de cabelos brancos, voz firme e arte na alma que já participou de 40 filmes, entre longas, curtas e vídeos. É também um dos fundadores do Grupo Armação em 1972, do qual faz parte até hoje.

Quando você estreou no teatro e em qual peça?

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Meu primeiro trabalho foi em 1962, há mais de 50 anos, no extinto Teatro Universitário de Santa Catarina, o Tusc. Era uma montagem do Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna, e subi ao palco para ser o segundo cangaceiro. A peça, embora uma comédia, trata do drama vivido pelo povo nordestino, sua luta contra a seca, miséria e fome. Éramos 16 em cena, dirigidos por Odília Carreirão Ortiga, responsável por eu ter permanecido nesta “brincadeira” até hoje.

O saudoso colunista Beto Stodieck estava no elenco?

No elenco estavam o Darci Pacheco, Edelmira Rodrigues como Nossa Senhora; a Iara Pedrosa, cujo personagem Palhaço era a própria representação do autor. Mas a participação de Beto Stodieck, como Frade, foi algo inusitado. Sistematicamente Beto acompanhava nossos ensaios e quando da estreia, um problema pessoal gravíssimo com o ator que fazia o Frade, não me recordo o nome dele, fez com que Beto, “sob chicote” subisse ao palco e permanecesse até o final da temporada.

Como se sente agora com o primeiro monólogo?

Está sendo minha primeira experiência e estou vivenciando, mas acho que sentirei a verdadeira resposta a partir da estreia, nesta sexta, no Teatro Armação. Na realidade todos os trabalhos que executei até aqui foram divididos com parceiros e parceiras e a troca cênica sempre me deu um suporte e garantia. É um grande desafio contar no palco somente consigo.

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O que encantou você no texto?

Não é uma comédia, mas o Cunha (Antônio) coloca a visão dele sobre o processo da “criação” com toques irônicos e críticos, passando uma leveza para o texto. É um relato que Deus faz a si mesmo sobre o processo de criação, é só isso que vou adiantar (risos).

Você tem formação ou já fez alguma atividade além de atuar?

Sou formado em Direito, mas nunca exerci de fato a advocacia. Aproveitei o bacharelado para desenvolver carreira de nível superior na Secretaria da Fazenda, onde me aposentei em 1989, do cargo de auditor interno. Antes de estudar Direito fui jogador, e dos bons, de futebol de salão, mas as lesões me tiraram da quadra e me jogaram no palco e no set.

O filme de estreia…

A primeira experiência foi no início dos anos 1970, com um curta ainda em super 8 (sim, sou do tempo do super 8 também, risos). Mas o filme não foi finalizado. Com isso, Desterro (1991), do Eduardo Paredes, é o meu primeiro filme.

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Quantos filmes e peças na carreira?

Participei de inúmeros projetos no curso de cinema da Unisul e tive a felicidade de trabalhar com muitos dos mais competentes cineastas catarinenses. São uns 40 filmes, entre longas, curtas e vídeos, e uns 50 espetáculos de teatro nestes meus 52 anos de atividade. Aqui incluo também recitais de poesia e leituras dramáticas.

Qual personagem deu mais prazer?

Sem dúvida o Beto do texto do Millôr Fernandes Os Órfãos de Jânio, dirigido por Paulo Roberto Rocha. Foi um prazer fazer esse personagem, com texto elaborado a partir da renúncia do presidente da República Jânio Quadros e que focava no Brasil pós-Jânio. Eu, nascido em 1944, fui contemporâneo desse tempo e a realidade exposta por Millôr era referente a personagens que eu conhecia.

E o mais difícil?

As dificuldades maiores foram nas montagens de O Inspetor Geral, de Nicolai Gogol, direção de Norton Makowiecky; e Contestado – A Guerra do Dragão de Fogo contra o Exército Encantado, texto e direção de Antônio Cunha. Em ambos os trabalhos eu representava mais de um personagem, trocando suas personalidades em pouco tempo, incluindo a própria aparência, figurino, adereços e maquiagem.

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Resumindo o trabalho atual:

Não era o meu sonho fazer um monólogo, mas convidado pelo Cunha, ainda mais dentro de um projeto que marcava meus 50 anos de carreira e os 40 do Grupo Armação, aceitei e me senti honrado.