José Nos, 59 anos, e Iolanda Vaz da Silva Nos, 64 anos, conheciam-se apenas de vista, quando José era padre em Formiga (MG), cidade onde ela morava. Na época, ele sequer cogitava abandonar o sacerdócio e dona Iolanda era casada. Anos depois, por uma coincidência do destino, aproximaram-se por causa do filho mais velho dela, que foi fazer faculdade em Belo Horizonte e, lá, ficou amigo do padre, que estava trabalhando em uma favela da capital mineira.

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Quando esse reencontro aconteceu, ela estava divorciada e ele já pensava em deixar a função de presbítero. Por uma coincidência ainda maior, há 18 anos os dois vieram morar em Joinville e, com a torcida dos dois filhos de dona Iolanda, passaram a namorar e, alguns meses depois, se casaram. Mas eles precisaram percorrer um longo caminho até que se encontrassem.

José foi mandado para um seminário aos oito anos, mal sabia falar o português. Ele vivia em uma colônia alemã no interior do Rio Grande do Sul, em Boa Vista do Buricá.

– Naquela época, pelo menos um filho tinha que seguir o sacerdócio, era motivo de orgulho para as famílias ter filhos padres, e meu pai sempre fez de tudo pela igreja, o gosto dele era ter um filho padre -, comenta.

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Apesar de ter entrado no seminário a desejo do pai, a vida de estudante o encantou e as amizades feitas durante o curso de teologia, associadas aos trabalhos sociais que desenvolvia, cativaram seu José, que dedicou-se com afinco ao sacerdócio.

Depois de 13 anos como padre, a solidão começou a incomodá-lo.

– Não foi uma decisão premeditada, foi um sentimento que surgiu de repente. Quando chegava a Semana Santa ou Natal, por exemplo, eu me colocava inteiramente à disposição da comunidade, atendia direto, fazia confissões até de madrugada, não me importava, mas, depois, todos iam para casa festejar com suas famílias e eu ficava sozinho -, explica José sobre o que motivou sua saída, que se concretizou após a morte do pai.

– Por respeito, acho que jamais teria tomado essa decisão se ele estivesse vivo. Talvez se minha família estivesse perto teria sido bem mais fácil -, acrescenta, ao explicar que havia feito voto de pobreza e atuou em comunidades de várias cidades brasileiras, entre elas, Cianorte, no Paraná, e Formiga e Belo Horizonte, em Minas Gerais, bem distantes da família.

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Foi durante essas andanças como padre que ele e o filho de Iolanda se conheceram e mantiveram contato, mesmo quando José se mudou para Corupá, Santa Catarina. Certo dia, Alexandre veio visitar o amigo e gostou tanto das terras catarinenses que decidiu mudar-se para Joinville. Em seguida, trouxe a irmã mais nova para morar aqui também.

Quando estavam estabilizados, pediram para a mãe, que vivia sozinha em Formiga desde o divórcio em 1990, que viesse para Joinville. Eram meados de 1994, José havia abandonado o sacerdócio havia um ano e trabalhava no setor de RH de um supermercado em Florianópolis. O convívio frequente despertou admiração mútua e, algum tempo depois, começaram a namorar.

– O Nos sempre foi uma pessoa muito alegre, meus filhos gostavam muito dele, daí foi fácil. Ele nunca foi um padre frustrado. Onde ele passou, até hoje o chamam de padre, ele é feliz por ter dedicado os melhores anos da vida dele ao sacerdócio -, afirma dona Iolanda.

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No dia 20 de janeiro de 1995, os dois oficializaram a união no civil – até hoje o afastamento de José não foi ratificado pelo Vaticano – e teve até pedido oficial para o pai da noiva.

Quando optou pelo afastamento, José enviou uma carta para a mãe e para os irmãos explicando os motivos de sua decisão e dizendo que, se o aceitassem de volta, bastaria, apenas, que respondessem àquela carta. Aqueles que não escreveram, telefonaram para dizer que o aguardavam de braços abertos.

Mas foi o casamento com uma mulher divorciada que gerou críticas por parte de alguns membros da família. Entretanto, a preocupação de José era com a opinião da mãe.

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– Ela sempre foi muito silenciosa. Porém, quando fui visitá-la pela primeira vez depois de casado, ela me disse: ‘Filho, eu gostaria muito que você continuasse sendo padre, mas se você é mais feliz casado e se a Iolanda te faz feliz, tudo que desejo é que você seja feliz’ -, conta, relembrando cada detalhe da conversa.

– Apesar de não conversarmos (a mãe de José só fala alemão), sempre saímos para passear e nos damos muito bem. E também temos o intérprete aqui quando precisa -, brinca Iolanda, enquanto aponta a cabeça para o marido.

Após largar a batina, José trabalhou no setor de RH de algumas empresas, com ajuda de alguns padres e seminaristas que o recolocaram no mercado de trabalho, mas são os trabalhos sociais que ainda desenvolve ao lado da esposa que o motivam até hoje. Juntos, eles fizeram palestras e cursos com casais de segunda união para incluí-los nas atividades da igreja, atuaram em grupos catequéticos e litúrgicos e fundaram a Pastoral Familiar em Joinville em 1996. Desde 2000, o casal também dedica-se ao cuidado de crianças recém-nascidas que serão entregues para adoção e não têm onde ficar até que o processo seja concluído.

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Para eles, a união não foi uma mera coincidência do destino.

– Nada é por acaso. Quando você poderia imaginar que um caboclinho do interior do Rio Grande do Sul encontraria uma pessoa do interior de Minas Gerais, a mais de dois mil quilômetros de distância? Isso é por acaso? Não. Tenho certeza que há um plano de Deus para nós -, afirma José, enquanto segura carinhosamente nas mãos de sua mulher.