A área de mata ciliar que deve ser preservada nas propriedades rurais é o principal motivo das divergências sobre o Código Estadual do Meio Ambiente, aprovado terça-feira na Assembleia Legislativa. O projeto agora precisa ser sancionado pelo governador de Santa Catarina, Luiz Henrique da Silveira.
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A mata ciliar é toda a vegetação que cresce às margens de cursos de água. O Código Florestal Brasileiro determina que sejam preservados 30 metros dessa vegetação. No código estadual, a distância é reduzida para 10 metros (em propriedades acima de 50 hectares) e cinco metros (para as menores). Um artigo no projeto define que as áreas serão consolidadas como estão hoje.
Para os ambientalistas, a alteração afetará a quantidade de água disponível para consumo. A diretora jurídica do Instituto Mangue Vivo, Rode Martins, destaca ainda outro argumento contra o tamanho da área de preservação determinada pelo governo do Estado: o conflito com o código federal.
– A ausência de regras claras faz com que os empreendedores fiquem temerosos de iniciarem uma implantação e depois serem autuados e terem as licenças cassadas ou não terem as licenças. Nessa situação, os estados devem detalhar aquilo que a União não detalhou. Porque já se viu que muitos funcionários públicos foram questionados judicialmente porque têm divergências técnicas entre os vários órgãos do sistema nacional de meio ambiente. Se o Estado detalhar, proporcionaria segurança jurídica para os servidores e também para os agricultores e empresários.
Rode acredita que, em casos de ações jurídicas, a Justiça continuará a adotar o código federal para analisar a questão.
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– Quando os órgãos ambientais forem a campo fazer a autuação, qual a regra que vão usar? E nas ações penais que o Ministério Público vai promover? Evidente que a federal, porque ela vem sendo usada até hoje como diretriz. Hoje já temos leis estaduais que flexibilizam as normas ambientais, mas elas não vem sendo acatadas pelos órgãos.
A diretora também critica o fato de o tamanho das áreas de mata ciliar a serem protegidas não ter sido definido com base em estudos científicos.
– Existe uma crítica na sociedade de que o código florestal federal não partiu de bases técnico-científicas, partiu de conceitos empíricos. O código estadual, na medida em que restringe de 30 para apenas cinco metros, também não fez isso com base técnico-científica. Ele caiu no mesmo erro. E o que é pior é que vários estudos de vegetação ciliar têm demonstrado que há uma variação muito grande, porque depende do tipo de solo – se é arenoso, argiloso – e depende da declividade.
Rode Martins acredita que, na prática, o código não vai alterar o cotidiano das pessoas e será só mais uma tese de defesa que os produtores que avançaram sobre a vegetação ciliar poderão utilizar.
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– Diante da situação de enchente que vivemos, e sabedores que somos de quanto o poder público paga para tratar a água por conta da incapacidade das margens estarem perfeitas para fazer a filtração, isso vai na contramão da história.
Agricultores defendem o projeto
De acordo com as entidades ligadas aos produtores rurais no Estado, e que apoiam a lei, o projeto legaliza 40 % das áreas produtoras de aves e suínos e 60% das produtoras de leite de Santa Catarina.
– Se for mais de cinco metros (de preservação), muitos agricultores não vão ter condições de continuar sua produção – destaca Nelton de Souza, vice-presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Santa Catarina (Faesc).
Souza acredita que o meio ambiente não será prejudicado com o código.
– Santa Catarina é um estado que já fez o dever de casa, temos 41% do território catarinense com florestas primárias, segundo levantamento da Fundação do Meio Ambiente (Fatma), e apenas 16% está sendo ocupado com lavoura e pecuária. Então ambientalmente falando nosso Estado está bem, graças ao produtor rural que tem sabido cuidar no geral. O código não dá abertura para desmatamento, para fazer crimes ambientais.
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Assim como o Instituto Mangue Vivo, a Faesc também critica o fato de a área de preservação das matas ciliares ter sido definida sem base científica.
– O federal já foi de cinco metros. Depois aumentou para 30 sem dado científico nenhum. Foi apenas algum legislador que bolou. Assim como o de cinco não tem dado técnico nenhum que diga que deve ser. Há muito poucos trabalhos de pesquisa. E nós preconizamos que em Santa Catarina seja feito um estudo bacia por bacia, para dizer se deve ser cinco metros, 10, ou mais.
Souza defende que a legislação federal seja flexibilizada para que os estados possam se adaptar à sua realidade.
– O principal, que já está sendo trabalhado pela Câmara dos Deputados em Brasília, é flexibilizar para que os estados possam adaptar a legislação às suas condições. Isso vai sair. E Santa Catarina já fez na frente.
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