Os chamados sintomas comuns correspondem a cerca de metade dos motivos de consultas médicas: 80% das pessoas têm no mínimo um sintoma em um mês. Isso acaba frequentemente sendo motivo para um excesso de medicalização e realização de exames desnecessários. Para o médico, não deixa de ser um desafio separar sintomas comuns, auto solucionáveis, daqueles que exigem uma melhor avaliação. Frequentemente surge um desconforto na relação médico-paciente quando não entendemos a importância dessa subjetividade.
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Um sintoma pode ser definido como uma sensação pessoal desconfortável e que não é mensurável pelo profissional (aquele que pode ser verificado, nós chamamos de sinal). As dores constituem 50% das queixas. Os demais se dividem entre fadiga, mal-estar, tonturas e falta de ar. A melhor abordagem é a que contempla a racionalização e a individualização. Podemos estar diante de sintomas que transcendem a doença onde o subjetivo não é aliado do objetivo. O paradigma é que nem sempre os sintomas são derivativos de doença, mas toda doença começa com um sintoma. Nossa função é entender esta disparidade.
Em outras situações ocorre um problema dualístico. Por exemplo: uma depressão que cursa com dores crônicas… estas seriam sua causa ou consequência? A intensa relação entre o físico e o psicológico é um dos maiores desafios da prática clínica. Um paciente com fibromialgia, com síndrome da fadiga crônica etc é um ser humano repleto de queixas subjetivas. Os sintomas também podem ter causas multifatoriais. A falta de ar, por exemplo, tem mais de uma em um terço das vezes. A melhor avaliação médica não reside em elaborar uma lista de exames. Está em ouvir e avaliar o seu paciente. Diversos estudos demonstram que o diagnóstico pode ser obtido sem nenhum exame complementar em 25% das vezes.
Ironicamente a nossa medicina vem dispendendo cada vez menos tempo para o paciente, tornando o ato médico uma abordagem superficial. As consultas são mal remuneradas e mais exames são solicitados numa espécie de compensação. Sabe-se que em, no máximo, 3% das vezes o diagnóstico virá pela loteria de testes laboratoriais sem justificativa. O que o paciente tem para nos contar é fundamental. Os sintomas mostram as pistas, costumam ser um apelo para a ajuda que pode ser obtida apenas pelo ouvir. O filósofo Sartre diz que corremos o risco de converter as pessoas em objetos porque não experienciamos (nem poderíamos) sua mente.
Ao médico, cabe a razão na sua essência. Saber discernir quantidades apropriadas. Isso se chama virtude. Deveríamos viver uma vida baseada na filosofia, uma vida de razão. Quem não usa a razão não pode ter uma vida examinada. Quando em medicina se resolve um enigma e se salva ou alivia uma vida estamos exercendo a vida da razão. Nossa essencial função.
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