O ex-diretor-presidente da Comcap investigado pelo suposto esquema na coleta de resíduos sólidos em Florianópolis, Lucas Barros Arruda, diz que a prefeitura já esperava por uma greve da autarquia chefiada por ele, mas nega que tenha feito um acerto prévio com a Amazon Fort, empresa sob suspeita de ter sido beneficiada com contratos emergenciais, sem licitação, em troca de propina para agentes públicos.
Continua depois da publicidade
Siga as notícias do NSC Total pelo Google Notícias
A contratação da empresa terceirizada, que deveria suprir atribuições da Comcap durante uma greve em 2021, levantou suspeita da Operação Presságio por ter sido feita um dia antes de os trabalhadores da autarquia municipal iniciarem a paralisação. Além disso, no mês anterior, a Amazon Fort, sediada em Porto Velho, capital de Rondônia, já anunciava vagas nas redes sociais para trabalho em Florianópolis.
— A gente sabia que ia ter uma nova greve assim que apresentasse o próximo projeto de lei de reforma administrativa. Da minha responsabilidade, era preparar a especificação, o que precisava ser contratado. Isso, sim, estava tudo pronto por parte da prefeitura. Nós estávamos, sim, preparados para uma greve — disse Arruda à NSC TV. Ele assinou o primeiro dos contratos com a Amazon Fort, em janeiro de 2021.
O ex-chefe da Comcap, que ocupava na ocasião um cargo comissionado da gestão Gean Loureiro (União Brasil), não refuta, no entanto, a possibilidade de a empresa ter sido beneficiada por outro agente público.
Continua depois da publicidade
— Eu posso falar da minha parte: eu jamais entrei em contato com empresa nenhuma. Se a empresa tinha alguma informação específica, se alguém entrou em contato com alguma empresa, isso precisa realmente ser apurado. Se teve isso com alguma intenção errada, isso é papel da polícia desvendar.
Movimentação milionária teria vindo de apartamento
Arruda é um dos 11 investigados pela Operação Presságio, que mira o suposto esquema na coleta de lixo. A suspeita inicial sobre o caso partiu de uma denúncia sobre suposto crime ambiental: na ocasião, em 26 de janeiro de 2021, as autoridades encontraram caminhões da empresa Amazon Fort despejando resíduos sólidos em um terreno municipal no fundo da Passarela Nego Quirido, no Centro.
Do local, o lixo doméstico era recolocado em caminhões maiores, que levavam os resíduos para um aterro sanitário em Biguaçu. Esse transbordo havia sido autorizado por Arruda, que também foi secretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da gestão Topázio. O despejo provisório pôde contar com dispensa de licenciamento ambiental, amparada por um decreto municipal de emergência.
Chamou a atenção da investigação o fato de a Amazon Fort ter contado com outros esforços de Arruda para reduzir os custos da empresa. Ele teria contratado, na mesma época e em caráter emergencial, com dispensa de licitação, uma outra empresa para disponibilizar um novo pátio para servir como ponto de transbordo aos resíduos coletados pela Amazon Fort, para que atendesse a região Norte da Ilha.
Continua depois da publicidade
Além disso, Arruda teria chegado a autorizar caminhões da prefeitura a despejarem lixo no pátio de transbordo, de onde a Amazon Fort levaria o material ao destino final. A iniciativa reduziu os custos da empresa terceirizada e ainda aumentou os lucros dela, já que era paga pela quantidade de lixo recolhido.
Os policiais identificaram que, a essa mesma altura, Arruda registrou movimentação bancária de R$ 2,7 milhões, embora contasse com remuneração mensal de R$ 10 mil. Ainda chamou a atenção o fato de o contrato da Amazon Fort, inicialmente vinculado à Comcap, onde Lucas estava lotado, ser repassado à Secretaria Municipal do Meio Ambiente na ocasião em que o servidor também se mudou para a pasta.
À NSC TV, Arruda afirmou que a maior parte do dinheiro identificado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão responsável por fiscalizar movimentações suspeitas, teve origem em um imóvel adquirido com esforços da família. Disse ainda que, ao vender o bem, aplicou o valor recebido.
— Esse dinheiro, de R$ 1 milhão, vem de um imóvel, da venda de um apartamento familiar que estava no meu nome. Movimentação financeira para o Coaf é tudo o que entra e tudo o que sai, ele computa em dobro. Então, nesse dia, para o Coaf, eu movimentei R$ 2 milhões — relatou Arruda, mostrando, à NSC, documentos de escritura desse imóvel, recibos de depósitos e uma declaração de imposto de renda.
Continua depois da publicidade
O que dizem os outros investigados pela Operação Presságio
A investigação conduzida pela Polícia Civil se debruça sobre a suspeita da prática de crimes contra a administração pública, com possível envolvimento de agentes públicos municipais em conluio com particulares, tendo como foco uma licitação para coleta de resíduos sólidos.
Três dos investigados são ligados à Amazon Fort, empresa de Porto Velho, capital de Rondônia, que teria sido beneficiada com contratos emergenciais e com dispensa de licitação para coleta de resíduos em Florianópolis. São eles: Carlos Gilberto Xavier, Iuri Daniel Faria e Andrey Cavalcante de Carvalho.
Carlos é pai de Iuri. Ambos são administradores da empresa, enquanto Andrey é advogado da Amazon Fort. Os dois primeiros teriam negociado interesses da empresa com agentes públicos. Já os dois últimos teriam feito saques em dinheiro vivo em Florianópolis, o que pode ter sido destinado ao esquema.
A Amazon Fort comunicou, em nota, ter prestado um serviço com extremo grau de excelência e transparência em Florianópolis. Afirmou ainda que irá colaborar para a elucidação dos fatos. “Não há qualquer crime a ser apurado, o que será devidamente esclarecido no momento oportuno”, escreveu.
Continua depois da publicidade
O advogado Andrey Cavalcante de Carvalho afirmou, também à reportagem, atuar efetivamente como advogado da Amazon Fort e ter recebido com surpresa os fatos relatados no processo. Disse ter plena confiança na própria lisura e declarou que atuará firmememente em defesa de sua honra.
Outros dois investigados, para além de Arruda, já ocuparam cargos de secretariado na prefeitura de Florianópolis. São eles: Ed Pereira (União Brasil) e Fabio Braga (PSD).
Braga assinou os três aditivos ao contrato original com Amazon Fort, para estender os serviços ainda emergencialmente e com dispensa de licitação, na ocasião em que era secretário de Meio Ambiente. Ele foi exonerado do cargo no dia em que foi alvo de busca e apreensão.
O ex-secretário também teria se reunido com Lucas Arruda e dois dos nomes à frente da Amazon Fort, Carlos Gilberto Xavier e Iuri Daniel Faria, pouco antes de assinar o segundo termo aditivo.
Continua depois da publicidade
Já Ed Pereira, então secretário de Turismo, Cultura e Esportes, teria recebido a dupla de empresários na Passarela Nego Quirido, em ocasião em que teria sido acertada a troca de vantagens ilícitas.
O ex-secretário Ed Pereira afirmou, em vídeo divulgado pelas redes sociais no dia em que foi alvo de busca e apreensão, não ter medo da investigação nem ter nada a esconder. Ele acrescentou ter cooperado com a operação da Polícia Civil e estar confiante de que a Justiça será feita.
Já a defesa do ex-secretário Fábio Braga comunicou, em nota, que não há que se falar em qualquer participação dele em atividades suspeitas ou espúrias.
Afirmou que ele passou a gerir o contrato da Amazon Fort na qual pasta que chefiava em razão de uma reforma administrativa da Câmara e que, por diversas, instou a gestão municipal a realizar processo de licitação para o serviço de coleta, o que foi feito em duas ocasiões. Um primeiro processo, de julho de 2021, teria sido suspenso em razão de acordo de greve. O segundo, do mesmo ano, foi judicializado.
Continua depois da publicidade
— Insta lembrar, igualmente, que todas as contratações foram autorizadas pelo comitê gestor da prefeitura municipal, composto por cinco secretários, do qual meu cliente não tem assento. Ainda, importante mencionar que toda a fiscalização do contrato, que era pago por tonelada de resíduos recolhidos, sempre foi fiscalizado por funcionários de carreira da Comcap, bem como são aferidos por balanças certificadas pelo Imetro. Não bastasse, os técnicos do Tribunal de Contas e o próprio Ministério Público de Contas, consideraram os contratos regulares —, escreveu, ao NSC Total.
Todos os demais cinco investigados teriam vinculação com Ed Pereira, de acordo com os investigadores. Tratam-se de Samantha Santos Brose (esposa dele), Gilliard Osmar dos Santos, Gustavo Evandro Ribeiro Albino, René Raul Justino e Bernardo Fernandes Santos. A suposta participação deles estaria no recebimento e no depósito de valores que teriam o ex-secretário de Turismo como destinatário.
A defesa de Gustavo Evandro Silveira Albino afirmou, em contato com o NSC Total, que ele deverá ser ouvido pela Polícia Civil, com a qual está disposto a colaborar o máximo possível. Disse ainda que o agora ex-servidor comissionado não tem participação alguma no esquema pelo qual é investigado.
A defesa de René Raul Justino afirmou ter recebido a investigação com tranquilidade, por entender que ele é citado no processo apenas por ser funcionário vinculado à secretaria chefiada por um dos principais investigados (Ed Pereira) e não ter envolvimento com qualquer ato ilícito. Acrescentou que, na altura dos fatos investigados, atuava na Câmara e que, a fim de aguardar o esclarecimento dos fatos, entregou por conta própria um pedido de exoneração do cargo que ocupava na prefeitura de Florianópolis.
Continua depois da publicidade
A defesa de Samantha Santos Brose afirmou em nota que ela possui fontes lícitas de renda, que serão devidamente comprovadas ao longo do processo.
“A busca e apreensão, com a colheita das provas, ainda não foi finalizada. Muitos documentos que foram apreendidos, e outros que serão oportunamente trazidos, servirão para esclarecer os fatos, e comprovarão a inocência dos nossos clientes. Estamos confiantes que se fará Justiça, ante as infundadas acusações”, afirmou o advogado de Samantha em nota ao NSC Total.
O ex-servidor comissionado Gilliard Osmar dos Santos e a defesa de Bernardo Fernandes Santos não responderam às tentativas de contato da NSC.
Leia mais
Esquema do lixo em Florianópolis teve dinheiro vivo e pequenos depósitos para evitar suspeitas
Continua depois da publicidade
Vereadores em Florianópolis avançam com CPI contra esquema do lixo