Ele é como um termômetro: costuma disparar aos primeiros sinais de instabilidade, ou de que algo no organismo não vai bem. Também oscila quando a temperatura esquenta no meio econômico ou político, onde em geral são tomadas as decisões que regem e influenciam o mercado e os investimentos. Foi assim no período que antecedeu a eleição de Luís Inácio Lula da Silva (PT), em 2002, no período posterior à vitória de Dilma Rousseff, em 2014, e também na crise política e econômica de 2015 e 2016.
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Este ano, a indefinição eleitoral que parece acompanhar o país até a escolha nas urnas também provoca uma elevação do dólar. Há 40 dias, a moeda americana só faz subir – saltou de R$ 3,70 no dia 3 de agosto para R$ 4,16 até esta sexta-feira, uma alta de 12,4% em pouco mais de um mês. Comparada a janeiro, quando a cotação do dólar era de R$ 3,13, a alta já é de 32,9%. Para completar, na quinta-feira a moeda americana chegou a R$ 4,20, maior valor desde a criação do Plano Real, em 1994.
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Todo esse cenário reflete diretamente nas empresas e na economia de Blumenau e do Vale do Itajaí. Um dos principais aspectos negativos que já vêm sendo sentidos é o aumento da gasolina, que esta semana teve preço médio de R$ 4,36 em Blumenau, segundo levantamento feito pela NSC Comunicação. Mas o impacto vai muito além das bombas de combustíveis e do consequente aumento de alimentos e produtos transportados pelas rodovias.
A maior parte das indústrias de setores fortes no Vale do Itajaí como o têxtil e o metal-mecânico importam matéria-prima e insumos usados ao longo da produção. Com a alta do dólar, sofrem com o aumento do custo para a compra de produtos essenciais à linha de fabricação.
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É o caso da Blumenau Iluminação, que importa luminárias prontas e também insumos para fabricação própria. Segundo o presidente Renato Medeiros, que é vice-presidente da Associação Empresarial de Blumenau (Acib), os artigos subiram nos últimos meses exatamente a variação do dólar. Ao mesmo tempo, ele confirma que não é possível repassar toda essa diferença para os preços porque o poder de compra dos consumidores não aumentou na mesma proporção. Dessa forma, o jeito acaba sendo a empresa absorver parte da alta da moeda americana.
– Até mesmo os insumos nacionais têm componentes importados e acabam sofrendo aumento. Tem que fazer mais para manter o mesmo resultado. Acredito que entre o primeiro e o segundo turno (das eleições) o câmbio possa até aumentar. Enquanto isso, o jeito é acordar mais cedo e ir dormir mais tarde – diz o empresário.
De janeiro a agosto deste ano, somente Blumenau importou um total de US$ 305 milhões em produtos, segundo dados do Ministério da Indústria e Comércio Exterior. Os itens que mais se destacam são fios, fibras, itens do vestuário e máquinas de costura. Este último representa 4% de tudo que a cidade importa e compõe o rol de equipamentos importados pela blumenauense Welttec para atender indústrias têxteis da região. O proprietário da empresa, Elias Martins, afirma que a compra dessas máquinas no exterior ficou mais cara nos últimos meses com a alta do dólar – acima de 20%, segundo ele.
No entanto, o empresário cita um outro lado desta moeda. Como importar peças prontas de vestuário também ficou mais caro, parte do mercado tem dado preferência à produção têxtil nacional. Para atender essa demanda a mais, as empresas precisam investir e acabam aquecendo as vendas de máquinas, mesmo que a um valor mais alto por causa da moeda americana.
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– O dólar alto tem impacto diretamente no preço. Alguns produtos não são tão impactados porque não têm fabricação nacional, então não existe competitividade que não seja atrelada ao dólar. Mas mesmo assim a performance está melhor que no ano passado – frisa Martins.
Efeito para os produtos acabados
Se para quem compra máquinas ou insumos no exterior o dólar acima dos R$ 4 já pesa nas compras, para quem traz os produtos acabados de fora do país, em moeda estrangeira, a percepção de aumento nos custos é ainda maior. É o caso da Stuttgart, que importa chocolates, cervejas e alimentos variados de países da Europa. Para a empresa, a alta do euro é até mais significativa do que a do dólar e já representa um acréscimo de 20% no custo de compras de janeiro deste ano até agora.
– Tudo que importamos vem da Europa e tem subido na mesma proporção (do dólar e do euro). Isso afeta o custo e não há grandes mágicas, nesse momento você acaba tendo que repassar aos preços – avalia o sócio-diretor de vendas, Frank Hirt.
Indústrias ganham em competitividade no exterior
Se para uns a oscilação da moeda americana aumenta o custo de compras e faz as empresas não verem a hora de o efeito eleitoral sobre o câmbio passar, a alta do dólar permite que algumas empresas tirem bom proveito deste momento. É o caso da blumenauense Altona. A empresa vende peças fundidas de aço para países como Estados Unidos, Canadá, México e mercado europeu. Como a companhia consegue comprar a maioria dos insumos no mercado interno, em reais, acaba ficando com o melhor dos mundos, que é apenas o efeito positivo do dólar alto nas vendas para empresas de outros países.
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– No momento atual a empresa torna-se mais competitiva em relação ao exterior. Estamos indo em busca do mercado externo com mais agressividade. Mas sempre tomando alguns cuidados. Não podemos nos basear nesta cotação porque ela tende a se estabilizar em um valor menor do que esse em breve – avalia o presidente Cacídio Girardi.
O gerente-executivo do Sindicato Patronal das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e do Material Elétrico (Simmmeb), Maurício Rossa, confirma que a flutuação muito extrema do dólar não favorece ninguém e que a previsão do setor é de que até o início do ano haja variação cambial grande, até que o mercado conheça a política econômica e as primeiras ações do novo governo.
O presidente do Sindicato das Indústrias de Fiação, Tecelagem e do Vestuário de Blumenau (Sintex), José Altino Comper, reconhece que para exportações esse momento de dólar elevado pode favorecer algumas empresas. No entanto, ele alerta que apenas entre 5% e 10% da base de 5 mil empresas ligadas ao sindicato, em 18 municípios do Vale do Itajaí, vende para o mercado externo. Dessas, em geral as exportações não ultrapassam a marca de 10% do faturamento.
Além disso, o dirigente lembra que mesmo que a empresa aproveite esta alta do câmbio para firmar novos contratos ou vendas com o exterior, até o momento de entregar o pedido, que é quando o comprador irá pagar, o dólar já poderá estar em uma cotação menor.
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No fim das contas, para o empresário a cotação do dólar nas alturas acaba sendo bem mais prejudicial à indústria têxtil do que benéfica, porque todas acabam tendo maiores custos de produção com o aumento dos insumos e da matéria-prima. E, no caso das pequenas empresas, apenas este lado negativo acaba entrando na conta.
– Primeiro chega o custo para depois ver se vai gerar a receita – resume Comper.
O economista e professor da Furb Nazareno Schmoeller avalia que os ganhos na exportação, embora importantes, não chegam a compensar o quadro porque a participação no mercado externo ainda é pequena. Também porque esse reflexo costuma ocorrer em médio prazo, já que exige mais tempo para dar resultados até prospectar novos clientes fora do país e fechar negócios com o novo valor da moeda. Ao contrário do aumento da matéria-prima, que é imediato. Para ele, o ideal é um dólar de equilíbrio, que pode não estar tão distante assim de se concretizar.
– O dólar não deve subir mais por muito tempo, não tem mais espaço. Pode haver ainda alguns picos por causa da eleição, mas a ideia é que comece a estabilizar, baixando inclusive de R$ 4, que é a expectativa do mercado – pontua Schmoeller.
Reflexos também para quem vai viajar
A alta do dólar também afeta o dia a dia dos moradores de Blumenau e região. Literalmente. A servidora pública Carina Nuber, 43 anos, se programa para viajar duas vezes ao ano para fora do país. Há um ano, diante da inconstância da moeda americana, ela passou a anotar em um caderno todo dia a cotação para analisar quando ela está em queda e, assim, ir comprando aos poucos a moeda para as viagens. O próximo destino são os Estados Unidos, no fim de outubro. Para essa viagem, ela ainda não comprou todo o dinheiro e até cogita pagar no cartão de crédito para quem sabe pegar uma cotação mais baixa em novembro.
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– A casa de câmbio me passa por Whatsapp a cotação todos os dias e anoto para acompanhar a variação. Espero que ele dê uma boa baixada até o dia da viagem – brinca a moradora de Timbó.
No Banco Daycoval, casa de câmbio onde Carina pega as informações de cotação dia a dia, a supervisora Jana Arizio diz que não há diminuição no volume de vendas. A orientação é sempre comprar aos poucos para obter um valor médio e, quem está comprando agora, no máximo diminui um pouco o orçamento que pretendia converter.