Era o primeiro dia de aula de 2011 na Escola Bolshoi Brasil, em Joinville, e a pernambucana Gabriela Ramalho parecia não saber o que fazer com tanta empolgação e ansiedade. Mesmo assim, parecia lembrar de um ensinamento antigo, apesar de seus dez anos de idade.

Continua depois da publicidade

— Nada de nervosismo, porque nervosismo atrapalha o trabalho da bailarina! — respondeu ela sobre seu sentimento à equipe de reportagem do jornal A Notícia que, naquela manhã de segunda-feira, cobria o primeiro dia de aula dos alunos da primeira série da instituição que, desde 2000, leva crianças do país inteiro a deixarem suas casas muito antes da idade adulta para buscarem o sonho de tornar-se um bailarino profissional.

Aquele já era o segundo encontro da menina de Petrolina com a reportagem do A Notícia. Em novembro de 2010, quando mais de 500 bailarinos de todo o Brasil passaram por Joinville para a audição nacional, que oferecia 80 vagas para alunos novos, Gabriela e a mãe, Cláudia, haviam sido entrevistadas pelo jornal A Notícia, quando a empolgação ainda superava a angústia pela separação.

Claudia é uma bailarina clássica que deixou os palcos para tornar-se professora de dança. Ela viu a filha dando os primeiros passos no balé na escola que ela mesma mantinha no piso térreo de casa, em Petrolina. Era natural que a menina compartilhasse a mesma paixão e o mesmo sonho que a mãe, mas, no caminho para a realização do sonho, a oportunidade e a saudade dividiriam espaço.

Gabriela tinha nove anos quando passou na seletiva da Escola Bolshoi. Ao mudar sozinha para Joinville, para morar em uma casa social com outros 13 alunos, foi difícil se acostumar à nova vida.

Continua depois da publicidade

— Eu era filha única e muito apegada à minha mãe. Me sentia perdida, não conseguia mais saber o que queria. — recorda ela.

Claudia chegava a deixar a escola que dirigia em Petrolina por até três meses com outros professores tomando conta para vir a Joinville ficar com a filha, até que a situação começou a levá-la a perder alunos.

— No primeiro ano, eles acharam que era uma situação temporária, que a Gabriela ia desistir e voltar pra casa e minhas ausências iam acabar. No fundo, eu também pensava, e até torcia para ela voltar pra casa — conta Claudia.

Ela tentava dividir a mãe cheia de saudades e preocupações da professora de balé que sabia o quanto era importante para um aspirante a bailarino ter a formação do Bolshoi no currículo. Buscava, em conversas com outros profissionais do balé, encontrar força nos conselhos para superar a distância.

Continua depois da publicidade

Enquanto isso, em Joinville, Gabriela encontrava "outras mães" em coordenadoras de escola e mães de outras alunas com quem dividia a casa e a rotina. E, com ajuda da tecnologia, contava com a mãe que estava a 2.500 quilômetros de distância, mas encontrava em vídeos-chamadas até para ajudar a estudar para as provas de física.

Mãe e filha precisaram ser fortes até que uma vaga de professor em um curso de dança em Joinville acabou trazendo Claudia para Joinville. Há dois anos, ela transferiu o estúdio de dança de Petrolina para a nova cidade e, neste fim de semana, enquanto Gabriela comemora o diploma profissional aos 18 anos, a mãe estará junto para celebrar o sucesso depois destes oito anos de desafios.

— Agora eu a chamo de guerreira. A primeira etapa do desafio já passou, e há um longo caminho pela frente — afirma a mãe.