Logo após a entrevista coletiva em que a Polícia Civil apresentou o resultado da investigação do incêndio da boate Kiss e indiciou Mauro Hoffmann por homicídio doloso, os advogados Bruno Seligman de Menezes e Mario Luis Lírio Cipriani, emitiram nota oficial criticando o indiciamento do empresário.

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Confira, abaixo, a nota na íntegra.

NOTA OFICIAL

Os defensores constituídos por Mauro Londero Hoffmann vêm à público, por ocasião do encerramento do inquérito policial que apura responsabilidades relativas à tragédia da Boate Kiss, que consternou a sociedade gaúcha, na madrugada do dia 27 de janeiro, dizer o que segue:

Não causou surpresa, em absoluto, o indiciamento de Mauro Londero Hoffmann pela autoridade policial, na medida em que, por diversas oportunidades, e muito antes de provas fundamentais terem sido coletadas, os delegados que conduziram a investigação anteciparam o seu indiciamento, fato igualmente corroborado pelo Ministério Público, a partir das inúmeras entrevistas concedidas aos mais variados órgãos de imprensa.

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Isso pode ser evidenciado a partir do posicionamento sobre a desnecessidade de prisão preventiva dos outros indiciados por crime doloso, mas do não posicionamento sobre eventual liberdade dos que hoje se encontram presos, deixando ao Poder Judiciário a decisão.

O ato de prender para investigar, de culpar antes de julgar, muito próprios de estados autoritários, serviu para dar uma resposta – equivocada – à sociedade, sangrando o princípio da presunção de inocência, extremamente caro ao Estado Democrático de Direito

O inquérito apresenta impropriedades tanto de ordem técnica, como de lógica jurídica, que serão, ponto a ponto, afastados ao longo da instrução processual, como a esdrúxula imputação de concurso material, ou ainda a diferenciação de imputação de crime culposo para uns e de dolo eventual para outros, sobretudo quando a base da investigação é a da assunção de risco.

Dizer que a casa noturna funcionava de forma temerária, mesmo estando toda sua documentação regular junto aos órgãos públicos competentes, e não indiciar todos os demais envolvidos pela mesma assunção de risco, se é que há, demonstra que a investigação parece privilegiar ou proteger uns, em detrimento de outros, quando o núcleo fundamental de suas condutas teria sido exatamente o mesmo.

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Essa circunstância será fortemente combatida pela defesa.

A investigação lançou mão da responsabilidade objetiva de alguns investigados, expediente de natureza cível, absolutamente inadmitido no direito penal democrático, ao denunciar pessoas que ocupavam certas posições em cargos públicos ou contratos sociais, sem apontar condutas que eventualmente contribuíram para o trágico resultado.

Especificamente a respeito do indiciamento de Mauro Londero Hoffmann, não há razões jurídicas para que responda pelas imputações de crime doloso, em razão de que era, naquela empresa, sócio-investidor, sem quaisquer atividades administrativas, seja relacionando-se com gestão de pessoal, fornecedores, reformas ou programação artística, tampouco com questões burocráticas de abertura e liberação da casa junto aos órgãos públicos.

Saliente-se, que quando Mauro Londero Hoffmann efetivamente ingressou na sociedade, em janeiro de 2012, todas as autorizações legais estavam presentes.

Isso, contudo, não quer dizer que Mauro Londero Hoffmann não esteja absolutamente consternado com a dor de todos aqueles que perderam familiares e amigos, e tampouco que busque se eximir de suas responsabilidades em outras esferas, mas no âmbito criminal não há nexo causal de nenhuma conduta sua, ativa ou omissiva, com o resultado.

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Analisando as mais recentes tragédias brasileiras, em todas elas as imputações aos responsáveis limitaram-se a crimes culposos.

Dolo ou culpa são institutos que não estão condicionados ao resultado, mas sim à conduta do agente. Não é porque uma tragédia é maior ou menor que a culpa deixará de estar presente, dando lugar a uma absurda e inexistente figura de dolo eventual.

Por tal razão, estamos mais do que convencidos de que agora, em ares mais democráticos, em um foro onde será resguardada a ampla defesa, o contraditório e, sobretudo, a presunção de inocência dos acusados, a verdade sobressairá e o direito penal não servirá a interesses político-institucionais, político-partidários ou político-criminais de ocasião.

Pela presente, reafirmamos a mais absoluta confiança nas instituições democráticas e, sobretudo, na inocência de Mauro Londero Hoffmann.

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Santa Maria, 22 de março de 2013.

Assinam, Bruno Seligman de Menezes (OAB/RS 63.543) e Mario Luis Lírio Cipriani (OAB/RS 39.461)

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Os dados que constam nas mais de 13 mil páginas do documento começaram a ser apresentados pouco depois das 14h30min no anfiteatro Flávio Miguel Schneider, no Centro de Ciências Rurais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).

– Nós não estamos aqui para agradar a todos. Estamos aqui para apontar os fatos tecnicamente – disse Arigony no início da sua apresentação.

Somatório de causas

Entre as causas apontadas pela Polícia Civil para as mortes na Kiss, estão a lotação excessiva da casa, a existência de apenas uma porta de saída, o acendimento de um sinalizador por um integrante da banda, barras de ferro instaladas irregularmente próximo à porta, que dificultaram a saída das pessoas. Além disso, segundo o delegado, no momento do incêndio o vocalista da banda Gurizada Fandangueira não avisou aos frequentadores sobre o início das chamas.

Veja o resumo de causas disponibilizado pela Polícia Civil:

1 – O fogo teve início por volta das 3h da madrugada do dia 27/01, no canto superior esquerdo do palco (na visão dos frequentadores), deflagrado por uma faísca de fogo de artifício (chuva de prata) empunhado por um integrante da banda Gurizada Fandangueira.

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2 – O extintor de incêndio, localizado ao lado do palco da boate, não funcionou no momento do início do fogo.

3 – A boate Kiss apresentava uma série das irregularidades quanto aos alvarás.

4 – Havia superlotação: no mínimo 864 pessoas estavam no interior da boate.

5 – A espuma utilizada para isolamento acústico era inadequada e irregular, feita de poliuretano.

6 – As grades de contenção (guarda-corpos) existentes na boate atrapalharam e obstruíram a saída de vítimas.

7 – A boate tinha apenas uma porta de entrada e saída.

8 – Não havia rotas adequadas e sinalizadas para a saída em casos de emergência.

9 – As portas apresentavam unidades de passagem em número inferior ao necessário.

10 – Não havia exaustão de ar adequada, pois as janelas estavam obstruídas.

Confira aqui o relatório do inquérito disponibilizado pela Polícia Civil

VÍDEO: polícia apresenta imagens que embasaram indiciamento criminal

Confira algumas das informações sobre os depoimentos colhidos ao longo dos interrogatórios:

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– 199 pessoas afirmaram que lotação era superior a 1 mil pessoas.

– 83 pessoas falaram que o vocalista da banda usou fogo de artifício em sua mão e o ergueu em direção ao teto.

– 50 pessoas declararam que havia mais fogo nas laterais do palco da boate Kiss.

– 181 pessoas viram que o fogo se iniciou acima do palco.

– 65 pessoas viram que jogaram água no foco do incêndio.

– 108 pessoas declararam que o vocalista e um segurança tentaram usar extintor que não funcionou.

– 153 disseram não ver luzes, placas ou sinais indicando saídas de emergência.

– 84 pessoas afirmaram que seguranças impediram saída por segundos ou minutos.

– 124 pessoas afirmaram que barras de contenção próximas à saída obstruíram a saída.

– 178 pessoas afirmaram que havia fogos em outras ocasiões, inclusive com aromatizador de ambientes.

– 18 pessoas afirmaram que não havia treinamento para uso de extintores nem orientação para evacuação em grandes tumultos ou incêndio, nem meio de comunicação imediato entre os funcionários da boate Kiss.

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– 24 pessoas confirmaram que houve diversas reformas na boate. Depoimentos indicam que eram feitas sem responsável técnico ou projeto aprovado.

– 17 pessoas afirmaram que Mauro Hoffman participava da administração e possuía poder de mando.

– 47 pessoas confirmaram terem presenciado civis entrando no momento do incêndio e retirando vítimas.

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