A falta de atendimento específico a autistas em Araquari, no Norte de Santa Catarina, tem motivado o estudante Marco Antônio do Rosário a concretizar um sonho de infância. Aos 17 anos, o adolescente quer criar uma associação para atendimento a pais e crianças autistas na cidade. Marco, que atualmente apresenta o grau moderado do transtorno, tem buscado auxílio em órgãos governamentais e públicos para realiza-lo.
Continua depois da publicidade
– Ele pensa muito no próximo. Mesmo quando alguém nos oferece ajuda, ele diz que de nada adianta ajudarem a ele enquanto outras pessoas continuam precisando de apoio – destaca a mãe de Marco, Josiane Alves do Rosário.
Além de Marco, Josiane tem duas filhas gêmeas de dez anos também autistas. Para Marco, este é mais um motivo para a criação da associação. Conforme a Secretaria de Educação de Araquari, só na rede municipal a cidade registra 26 crianças com autismo. Para a mãe de Marco, a falta de entendimento e compreensão de muitos pais ou familiares acaba dificultando o diagnóstico precoce e tratamento.
– Uma equipe multidisciplinar focada no atendimento das crianças e dos familiares ao mesmo tempo traria resultados melhores nos tratamentos – ressalta Marco.
Desde fevereiro deste ano o adolescente tem se dedicado a frequentar sessões da Câmara de Vereadores da cidade e também de Joinville, participado de eventos e levado adiante a ideia. O adolescente também se inspirou em métodos de outras associações que desenvolvem este tipo de trabalho, como a Associação de Amigo dos Autistas (AMA), em São Paulo.
Continua depois da publicidade
Em julho, com ajuda de um advogado, Marco criou o estatuto da Associação de Pais de Autistas de Araquari (Apaa).
O documento ainda não possui registro oficial por não ter diretoria formada, mas conta com 38 artigos que explicam a finalidade e como vai funcionar a estrutura da associação. Entretanto, a família precisa de apoio para conseguir concretizar o projeto.
O estatuto explica, conforme o artigo 3º, que a associação tem a intenção de “atender pessoas com autismo, observando suas características, promovendo sua inclusão social, integrando-se na vida comunitária e de seus familiares”. Além disso, “oferecer o serviço de atendimento educacional especializado às pessoas com autismo em idade escolar, com suporte técnico ao ensino regular onde estas estiverem matriculadas”.
Outro objetivo da associação é “incentivar e promover a participação da comunidade local, das instituições públicas e privadas nas ações, programas e projetos voltados ao atendimento da pessoa com autismo”.
Continua depois da publicidade
Para tanto, a associação deve “facilitar o acesso dos associados e de seus familiares aos serviços assistências do município de Araquari e região, por meio de encaminhamento destes às respectivas instituições responsáveis pelo atendimento nas áreas da saúde, educação, assistência social, esporte, lazer e cultura”.
Confira o estatuto criado por Marco na íntegra:
– O grande problema é que a gente precisa de apoio. É um sonho que ele tem de fazer a associação, mas sem apoio não tem como. As pessoas precisam participar até que a Prefeitura nos conceda um espaço físico. Algumas reuniões com pais, por exemplo, nós fizemos até em praça, e isso é complicado – detalha Josiane.
Outro ponto de atenção sentido por pais de autistas tem relação com os valores gastos com medicações e tratamento. No caso dos filhos de Josiane, as medicações podem custar até R$ 700 por criança e têm duração de 28 dias.
– Neste mês, por exemplo, ele e as irmãs só estão tomando o medicamento porque uma família de Joinville decidiu fazer a doação. Mas para o próximo mês nós não sabemos como vai ser – completa.
Continua depois da publicidade
Pensando em situações como essas, o desejo de Marco também é o de oferecer um espaço na associação voltado à distribuição de medicamentos, com farmácia e profissionais especializados.
Diagnóstico foi ainda na infância
Quando tinha quatro anos de idade, o primeiro diagnóstico de Marco apontou para uma depressão severa. Conforme Josiane, ela já percebia a dificuldade de interação de Marco quando ele era bebê.
– Ele não chorava e não gostava de colo. Eu precisava anotar os horários porque não tinha como saber quando ele estava com fome, por exemplo – conta a mãe.
Foi em 2014 quando a família recebeu o diagnóstico que confirmou o transtorno em um grau severo. Marco apresentava alguns comportamentos repetitivos, agressividade e dificuldades em se comunicar.
Continua depois da publicidade
Segundo ela, o quadro começou a mudar quando Marco conheceu uma associação no Rio Grande do Sul.
– Todo mundo dizia que ele não seria capaz de nada. Os próprios médicos diziam isso – relembra.
Foi no estado gaúcho que Marco começou a receber auxílio e, inclusive, onde fortaleceu o impulso para a criação da associação em Santa Catarina. Em 2017 a família retornou a Araquari por dificuldades financeiras e, desde então, Marco tem buscado um tratamento semelhante ao que recebia no Rio Grande do Sul.
Josiane conta que percebe a dificuldade de algumas pessoas e, principalmente, de familiares em relação ao entendimento sobre o transtorno. Para ela, esse é um dos fatores mais importantes para o desenvolvimento deles e também para fortalecer pais e mães de crianças autistas.
– Não é fácil lidar no dia a dia, existe muito preconceito. Eu tenho dificuldades para encontrar emprego, por exemplo. Toda a vez que falo que tenho três filhos autistas, automaticamente sou descartada das vagas. E, além disso, tem todo o preconceito de familiares e situações de bullying que eles enfrentam nas escolas – conta a mãe.
Continua depois da publicidade
Marco recebe homenagem na Câmara

Na última terça-feira (10), Marco recebeu uma homenagem na Câmara de Vereadores de Araquari. Na placa, a frase destaca o esforço do adolescente: pela luta ao reconhecimento dos autistas no município de Araquari.
Para a entrega da homenagem estiveram presentes representantes como o deputado Estadual João Amin e o deputado Federal Rodrigo Coelho.
– Esse dia vai ser marcado na minha história e na [história] da minha mãe não só pela própria homenagem, mas por sua simbologia. É a primeira vez que eu venho aqui em uma tribuna fazer um discurso em meio a tanta gente. Talvez, se fosse anos atrás, eu não teria essa mesma capacidade. Para mim é bastante complicado falar para tantas pessoas porque tenho sérias limitações relacionadas à comunicação. Se estou aqui é porque estou lutando para fazer uma associação e o meu objetivo é que os direitos das pessoas com deficiência sejam cumpridos – disse durante o discurso.
O que é o autismo?
O Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) é um problema psiquiátrico e que envolve dificuldades para interação social, dificuldade com a linguagem e comportamento repetitivo e restritivo. Conforme a Organização Mundial de Saúde, as causas ainda não são determinadas, mas há fatores que tornam uma criança mais propensa a ter o TEA, como fatores genéticos e ambientais.
Continua depois da publicidade
Por envolver situações e apresentações variadas quanto à intensidade dos sintomas, a graduação do transtorno pode variar de mais leve a mais grave e, por isso, deve ser tratada de forma exclusiva de acordo com cada diagnóstico.
Os sinais do transtorno podem variar entre a dificuldade de interação social, comunicação e ações repetitivas. Em alguns casos, há sinais que também podem se manifestar em algumas pessoas com o espectro autista, como surtos nervosos, automutilação e agressão. Além disso, a hiper ou hiposensibilidade também podem se manifestar de forma diferente nos cinco sentidos do autista. No caso do Marco, alguns barulhos causam incômodo, como o ruído de ventiladores ou de aparelhos de condicionador de ar, por exemplo.
Em outros casos, o espectro autista também pode vir acompanhado de deficiência intelectual. No entanto, também há pessoas que apresentam alto funcionamento e habilidades.
Leia as últimas notícias de Joinville e região.
Continua depois da publicidade