Com caneta e papel na mão, o adolescente de 13 anos soluciona problemas, dá respostas e ainda explica como chegou ao resultado das questões matemáticas. Para ele, resolver equações e testes de raciocínio lógico é algo tão simples que parece não perceber o talento que possui. Afinal, a vida já lhe impôs maiores desafios. Nem mesmo a morte do pai, o afastamento da mãe e a mudança para uma casa de acolhimento parecem abalar o emocional do garoto, que apesar das dificuldades supera obstáculos com tranquilidade.

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E foi assim, sem grandes pretensões que João* aceitou o convite da escola estadual em que estuda para fazer a prova da primeira fase da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP), no mês de abril. E deu certo: o jovem obteve boa pontuação e foi aprovado para a segunda fase. Era um sábado à tarde, o estudante nem estava com muita vontade de ir, mas como tinha assumido o compromisso, seguiu em frente. Na época, as questões mais elaboradas, com conteúdos que ainda não havia aprendido no 7º ano, não foram empecilho para João, que deu o seu melhor. Em dezembro, recebeu a notícia de que foi um dos medalhistas de bronze da competição.

– Quando me avisaram eu fiquei feliz, porque tinham algumas questões que eu ainda não tinha aprendido, mas já tinha visto em alguns livros. Eu gosto de desafio, quando vejo um problema fico insistindo até conseguir resolver – conta.

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A vida no abrigo

Sua rotina é parecida com a de muitos meninos de sua idade, não fosse pelo fato de João morar desde março em uma casa de acolhimento para meninos em Florianópolis. Com a mesma naturalidade que resolve os problemas de matemática, ele explica que a morte do pai, em 2010, e os transtornos psiquiátricos da mãe levaram ele e o irmão de 14 anos à situação de acolhimento.

Em meio às circunstâncias da vida, ele não teve seu rendimento escolar prejudicado. O menino conta que sempre foi bom bem na escola, mas a matemática nunca foi sua matéria preferida. Foi no abrigo, quando um dos educadores sociais o apresentou para jogos de engenharia que envolviam cálculos e montagens de modelos em 3D que o garoto desenvolveu mais afinidade pelo assunto:

– Na escola eu sempre gostei de ciências, geografia e biologia, mas ia normal em matemática. Agora eu gosto muito de tecnologia, de jogos para construir coisas. Alguns conteúdos de matemática eu vejo que vou usar muito na vida, na profissão que eu quero – explica.

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Apesar da pouca idade, a habilidade natural para números e o gosto por construções tecnológicas não deixam dúvidas sobre a profissão a ser seguida: quer ser engenheiro civil. No computador que levou para o abrigo, já construiu junto com irmão foguetes em que viajaram para a Lua e Marte.

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Na vida real, o adolescente também se inspira no pai, que tinha o hábito de “construir coisas”.

– Meu pai era engenheiro sem diploma, fez projetos de frigorífico para vender e depois ele mesmo trabalhou – recorda.

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Novos planos para 2016

De férias da escola, João já está com a matrícula confirmada para o 8º ano e diz que pretende participar novamente da competição. Enquanto isso, se distrai com seus jogos de computador e com seu novo vício, o filme Star Wars, que já assistiu três vezes no cinema.

João ainda não sabe quando vai buscar a medalha e o certificado no Rio de Janeiro, mas a notícia de que a premiação inclui uma vaga no 11º PICPrograma de Iniciação Científica Jr– em 2016 animou o menino. No PIC, ele participará de encontros online e presenciais para ampliar seu conhecimento, além de receber uma bolsa mensal do CNPq, material didático, alimentação e transporte.

* o nome do adolescente foi trocado para preservar a identidade e evitar o preconceito.