Depois de ser indiciado pelo Ministério Público de Santa Catarina por suspeita de improbidade administrativa, o secretário de Desenvolvimento Regional de Brusque, Jones Bósio (PSD), anunciou a exoneração do cargo nesta quinta-feira. Em coletiva de imprensa, o secretário se defendeu das acusações de enriquecimento ilícito e dano ao erário no processo que responde com outros quatro réus e alegou motivos de saúde ao deixar a pasta.
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Com mais de 2 mil páginas, o inquérito aponta irregularidades em dois contratos que somam R$ 1,6 milhão assinados com a Alfa Terraplanagem após a enchente de 2011 – o secretário era diretor-geral da pasta na época.
Sandra Regina Eccel, ex-titular da pasta; o pai de Jones, Vendelim Bósio; Cristiano Cunha, responsável pela Alfa na época em que os serviços foram contratados; e Tiago Luy, engenheiro civil da SDR, também estão entre os acusados.
O promotor de Justiça Daniel Westphal Taylor alega que há falhas nos procedimentos de dispensa de licitação e que, além do pagamento por serviços que não foram executados pela Alfa, a empresa contratada era administrada pelo pai de Jones.
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A investigação revela que a razão social da empresa estava registrada em nome de Hilda Bósio – mãe do secretário – e Valtamir Cesari, mas o responsável pelas atividades era Vendelin. Segundo o promotor, Hilda e Valtamir apenas emprestaram o nome para abrir a razão social, em 2008. Em junho de 2011, Hilda vendeu sua parte para Cristiano Cunha, marido de uma sobrinha. Na ocasião a empresa deixou de se chamar VHB Serviços Ltda. e passou a atender por Alfa Terraplanagem.
“(…) Essa venda, porém, era meramente de fachada: Vendelim Bósio, pai de Jones Bósio, continuava vinculado à empresa, o que era de pleno conhecimento do então diretor-geral da SDR”, escreve o promotor.
Além do grau de parentesco, o promotor diz que a rápida ascensão econômica de Cunha chamou atenção do MP. No processo de dispensa de licitação e na assinatura dos contratos ele aparece como responsável da Alfa, mas “(…) pouco tempo antes de firmar estes contratos no valor de R$ 1,6 milhão, ele exercia, na própria SDR, a função de digitador, ganhando R$ 700 mensais”.
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Em depoimento, Cristiano mencionou que o R$ 1,6 milhão foram sacados na boca do caixa e usados para sublocar os serviços contratados. Por isso, a promotoria pediu também a quebra de sigilo bancário da empresa e da conta de Jones Bósio.
A primeira operação apontou que os pais de Jones retiraram cerca de R$ 820 mil da conta corrente de uma empresa que, formalmente, não pertenceria a eles, o que provaria que Cristiano não administrava a empresa sozinho. Além disso, no mesmo período o secretário teria recebido R$ 7 mil da Alfa e que a quantia seria “uma compensação pelo convite para a prestação dos serviços”.
“Era de conhecimento de Jones que a empresa em questão funcionava em uma casa de madeira (…) e não possuía qualquer funcionário ou maquinário, de forma que, como o próprio Cristiano Cunha admitiu, a realização do serviço foi objeto de sublocação”, argumenta David Westphal Taylor, concluindo que Cunha e a então secretária Sandra Eccel também estariam cientes da irregularidade.
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O gerente de Infraestrutura da SDR, Tiago Luy, responsável pelas medições que permitiram à Alfa receber o valor contratado, também é réu no processo.
CONTRAPONTOS*
Jones Bósio
Em uma coletiva de imprensa na quinta-feira à tarde, Jones Bósio, até então secretário de Desenvolvimento Regional de Brusque, falou sobre o pedido de exoneração do cargo. Apesar de informar que ainda não foi notificado pela promotoria sobre a denúncia de improbidade administrativa na contratação da empresa Alfa, em 2011, Bósio argumentou que antes de entrar na política a família já administrava empresas de terraplanagem.
– Na época deste contrato meu pai não era dono da empresa. Agora eu estou pagando a conta – criticou.
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Durante a coletiva, Bósio mostrou relatórios das famílias beneficiadas com o serviço de terraplanagem na época da enchente e garantiu que os documentos foram entregues à promotoria. Por fim, afirmou que a decisão de sair da secretaria partiu dele e que não quer causar prejuízo ao governo e à pasta.
Bósio, que também é presidente do PSD em Brusque, disse que deixa o cargo para cuidar da saúde e que não pretende abandonar a vida política, entretanto não descarta pedir afastamento do cargo que exerce no partido.
Sandra Regina Eccel
Por telefone, a ex-secretária Sandra Eccel, que hoje ocupa um cargo junto ao governo estadual em Florianópolis, também informou que ainda não foi notificada da ação. Sandra ressalta que não tem pleno conhecimento do conteúdo das acusações que recaem sobre ela, mas que, apesar disso, comentaria o ocorrido.
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Ela garante ter todos os documentos relativos aos serviços executados na época da calamidade e que, na ocasião (2011), todo o trabalho de terraplanagem foi supervisionado pela Defesa Civil de Brusque. A ex-secretária afirma ainda que todo o barro retirado das residências e terrenos na época foi usado pela prefeitura da cidade em obras do PAC de Macrodrenagem e que ela teria documentos que comprovam esse processo. Por fim, Sandra se defendeu ao mencionar que a denúncia pode ter sido feita por motivos políticos.
*Os demais acusados, Cristiano Cunha, Vendelin Bósio e Tiago Luy, não foram encontrados pela reportagem.
Auditoria aponta prejuízo de R$ 742 mil aos cofres públicos
O promotor apontou ainda que nenhuma das dispensas de licitação detalhou o serviço que deveria ser feito pela empresa – que consistia em retirar o barro das residências atingidas pela enchente em Brusque. Sem o detalhamento a administração não teria condições para cobrar a excussão dos serviços. A confirmação de informalidade dos serviços fica evidente ao Ministério Público quando o responsável pela Uller Locação, umas das empresas subcontratas pela Alfa, declara desconhecer a existência de qualquer projeto e afirma que os trabalhos foram feitos sem ele.
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Segundo Taylor, a informalidade com que os R$ 1,6 milhão foram geridos trouxe graves prejuízos ao erário. Também usada na investigação, uma auditoria da Secretaria de Estado da Fazenda apurou que a contratação gerou um prejuízo total de R$ 742.292,63. Entre as irregularidades, a auditoria cita o fato de os serviços não terem sido previamente orçados e o pagamento por ruas que não passaram pelas obras.