Ramon Regis Luiz, 20 anos, havia trabalhado até as seis da tarde e voltava da casa de um amigo. Era noite de sexta-feira, por volta das 23h. No fim da Rua Engenheiro Udo Deeke, no bairro Salto do Norte, teve o caminho interrompido por um automóvel que, segundo a mãe, Marinez Lara de Moraes, 46, teria cortado a frente do jovem. Fazia seis meses que ele havia comprado a moto em busca de mais economia e rapidez no deslocamento para o trabalho. Ramon acabou sendo a primeira vítima fatal do ano em acidentes envolvendo motos. Oito meses depois, para Marinez ficaram a saudade do filho único, a casa vazia e um desejo de apelo a todos aos condutores.

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– Os motoristas em geral precisam ter um pouco mais de consciência e respeito. A moto é um veículo de locomoção para o trabalho. Não é porque eles são adolescentes que estão brincando, eles precisam ser respeitados como eles respeitam os carros – defende.

Foram nas noites dos fins de semana, quando uma parte dos jovens aproveita para se divertir e outros veem uma oportunidade de faturar uma grana extra, que se concentrou a maior parte dos acidentes fatais com motociclistas em Blumenau neste ano. Dos 16 óbitos registrados no perímetro urbano, 11 envolvem motociclistas. São 68,75% das mortes, a maior proporção nos últimos seis anos.

Entre as 11 mortes envolvendo motociclistas, oito ocorreram entre sexta-feira e domingo e no horário da noite, entre 18h e meia-noite. O perfil das vítimas é outro ponto que chama a atenção. Nove das 11 vítimas motociclistas tinham entre 17 e 33 anos.

A educadora de trânsito Márcia Pontes reconhece que o público jovem costuma se arriscar mais do que outras faixas etárias e ver na moto a concretização de um sonho de metal, como cantava Herbert Vianna em Vital e Sua Moto. No entanto, ela alerta que apesar de ser associado com horários em que os jovens vão para a balada, as noites e madrugadas dos fins de semana são também os horários em que há mais trabalho para os motoboys. Profissionais que costumam se arriscar bastante para entregar o lanche ou a pizza quentinha e evitar reclamações, dos clientes ou dos patrões.

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– Muitos deles têm dois ou mais empregos, estão pagando a moto então trabalham mais. Muitos têm pouquíssimas horas de sono, o que é um agravante a mais, e até fazem uso de drogas para se manter acordado ou superar o frio da madrugada. Isso tudo potencializa o risco – frisa.

Mas antes que alguém pense em demonizar o motociclista, Márcia faz questão de destacar que, a exemplo do caso de Ramon, muitos acidentes são provocados por motoristas de carros. Por isso a necessidade de atenção ao retrovisor ao mudar de faixas, ruas ou desviar de buracos. Segundo ela, o ideal é que o retrovisor mostre apenas uma mínima parte da lataria do carro para aumentar o campo de visão ao lado. Olhar também o retrovisor de dentro, movimentar a cabeça para escapar dos oito pontos cegos que um carro possui e aproveitar as janelas e áreas envidraçadas são outras dicas para evitar acidentes.

– Depois de um acidente muitos condutores falam “eu não vi o motociclista”. Mas a gente não vê o que não procura. Procure, que vai encontrar – alfineta Márcia Pontes.

Para a especialista, uma mudança nessa situação passa por encontrar uma linguagem para conscientizar os jovens e os motoboys e, ao mesmo tempo, por uma nova mentalidade dos proprietários de bares e restaurantes, que precisariam entender que quando um motoboy comete imprudências a empresa dele está se associando a isso.

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Gastos coletivos chegam a R$ 1,7 bilhão

Um levantamento do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) de 2012 estabeleceu em R$ 1,7 bilhão o prejuízo causado por todos os acidentes de trânsito em Blumenau – não só com motociclistas – entre 2004 e 2011. O número leva em conta os salários dos socorristas, combustíveis das viaturas, custos dos congestionamentos, medicamentos, cirurgias e outros gastos relacionados. O dinheiro, segundo Márcia Pontes, daria para comprar mais de 6,6 mil ônibus ou construir mais de 1,6 mil centros de educação infantil.

O especialista em Segurança no Trânsito Emerson Luiz Andrade também manifesta a preocupação desses altos custos para o Estado e cita dados da Associação Brasileira de Prevenção dos Acidentes de Trânsito (Vias Seguras) de que para cada morte no trânsito há 10 vítimas e cinco delas ficam com sequelas irreversíveis. Andrade confirma que o cansaço do final da semana e o deslocamento de motociclistas a trabalho podem contribuir para o alto número de acidentes nesses dias e horários. Para ele, a longo prazo, a solução para diminuir esses casos passa por três pilares: fiscalização efetiva e diuturna, educação entre os condutores e dentro das escolas para formar as novas gerações e punição efetiva dos órgãos de trânsito para condutores que ultrapassaram os 20 pontos na habilitação. A curto prazo, porém, a única saída é um apelo direto aos motociclistas.

– Pela vulnerabilidade do veículo, o motociclista acaba sendo a maior vítima. Se diminuir um pouco a velocidade, aprimorar o olhar ao redor, a distância, vai aumentar a percepção, a área de visão e o tipo de reação. Muitos dizem que os motoristas dos carros não tomam esses cuidados, mas esse é mais um motivo para eles redobrarem a precaução – pontua.

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