Nicolle Avelino da Silva, de 17 anos – que completará 18 no próximo dia 7 de novembro – acordou cedinho no último sábado, dia 15. Estava ansiosa e não falava de outra coisa: ela iria para a sua primeira balada. A festa, que já estava sendo programada há mais de um mês, contou com a presença de cerca de 10 amigos da jovem. Todos estreando na pista, em uma festa com músicas e decoração anos 80, no Celeiro¿s Beer, em Biguaçu.
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Durante a semana anterior, Nicolle e os amigos lembravam aos pais e professores a todos os momentos: “sábado é dia de balada”, “a nossa balada”, enfatizavam. Era o assunto da galera, não tinha escapatória. Os pais tinham que dar um jeito em levar este pessoal para a festa.
Com a ajuda da mãe, a dona de casa Simone Paiva Avelino da Silva, 46, Nicolle comprou uma blusa nova para a grande noite. Uma de ombros de fora, com listras brancas e pretas, como pede a modinha.
— Eu que escolhi — disse ela.
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Até salão de beleza foi marcado. A jovem ganhou uma escova nos cabelos morenos do cabeleireiro e vizinho Marcelo Ferreira, e uma maquiagem – pó, batom e uma sombra cor-de-rosa, para dar uma realçada no olhar.
Preocupada, antes de sair, deu mais uma conferida se o batom e o cabelo estavam em ordem.
— Ai, será que tá bom? — comentou uma nervosa Nicolle, como quase todos os adolescentes que vão para a primeira balada.

Por volta das 22 horas, seguiu para a fila da boate, onde encontraria os demais colegas. Mas antes, pose para a selfie, que a mãe fez questão de encaminhar para toda a família via Whatsapp. No carro, Nicolle colocou uma música para entrar no clima: Ludmilla.
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Se a menina estava ansiosa, os pais, Simone e o administrador Amarildo José da Silva, 45, estavam ainda mais.
— Como eu me sinto com a primeira balada da filha? Péssimo (risos). Pai acaba sendo sempre mais protetor com a filha mulher, não é? — brincou Amarildo.
Simone foi uma das organizadoras da ação junto da irmã e madrinha da menina, Gabriela Paiva Avelino, 44. As duas conseguiram o apoio do DJ da casa, Kavalinho (Jocelito José Silva), e ganharam ingresso para os jovens, além de dois camarotes exclusivamente para eles.
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— Estou curiosa para ver o que ela vai sentir na pista de dança, o que vai achar. Mas estou confiante que ela vai gostar. Ela adora dançar — relatou Simone.
— Essa vai ser uma noite que eles vão lembrar pelo resto das vidas — profetizou o DJ Kavalinho. E não é que ele tinha razão?
Prontos para a próxima
A diferença do dia tão especial para este grupo de amigos é que todos eles frequentam a Associação Amigo Down, de São José. Eles têm síndrome de down. Ir para uma festa, se divertir com amigos, pais e outros baladeiros de plantão era mais do que importante: era fator inclusivo e de orgulho para as famílias.
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— A ideia, a princípio, seria fazer um bailinho para eles na própria associação, que completa em outubro 25 anos. Mas insisti para levarmos numa boate de verdade, para eles verem como é, se sentirem incluídos — explicou Simone Avelino.
Os pais dos jovens acompanharam a primeira aventura da galerinha, que tinha entre 16 e 34 anos. Osmar Linder Júnior, com 32 anos, por exemplo, mesmo fã de rock n´roll, foi um dos que mais ¿causou¿ nas pistas. Dança muito, o rapaz. A mãe dele, a aposentada Lourdes Pierre Linder, 72, quase não pode levar o filho por conta de um problema de saúde.
— Mas ele insistiu tanto durante a semana. Ele queria ir para a balada. A gente faz tudo pelos filhos, não tem jeito — disse ela, feliz com a decisão que tomou ao ir à festa.
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A galera nem chegou a ir para o camarote, a pista de dança era o destino. E eles mandaram a ver. Maria Fernanda da Silva Purificação, 19, estava tímida no início. Mas mostrou que adora a arte da dança e se esbaldou.
— Ela até treinou os passinhos em casa — contou a mãe, Silvana Bittencourt da Silva Purificação, 56, que estava tão satisfeita quanto a filha durante a noite.
Na pista, as diferenças passaram despercebidas. Enquanto os costumeiros clientes da balada dançavam, a galera da Nicolle também. A roda de dança uniu várias pessoas. Teve gente que só foi embora às 4h da manhã. Era sábado a noite, não é mesmo? Todos merecem.
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Coração tem que estar preparado

— Como assim você não vai me levar na minha primeira balada?
Com esta intimação, a técnica em higiene bucal Franciany Freitas da Silva, 34, não teve escolha. Ela sabia que precisava levar a filha, Nicolly Vitória da Silva, 16, para a festa.
— Eu não ia conseguir ir. Minha filha mais nova estava um pouco doente. Mas a Nicolly estava tão ansiosa, tão contente para ir, que eu precisava. Consegui deixar a minha outra menina com o pai, para estar junto dela neste momento — explicou a mãe.
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Nicolly também acordou às 7h no sábado, de tão nervosa que estava. Ela queria usar um jeans rasgado, algo descolado. Mas aconselhada pela mãe, colocou um lindo vestidinho azul com flores para estrear na pista.
A preocupação com o visual colheu frutos. Nicolly encontrou o amigo Osmar Linder Júnior, com quem dançou juntinho a noite inteira. Huuummm…
— Está arrepiante para mim. Estou tentando digerir ver a minha filha abraçadinha com o amiguinho (risos). Mas ela já é mocinha. É muito carinhosa, e ele também. Ela está muito feliz por estar aqui, e isso tudo vale a pena — descreveu a mãe.
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Inclusão
A presidente e fundadora da Associação Amigo Down, Elizabeth Gomes de Andrade, lembra que há seis anos um outro grupo de jovens foi pela primeira vez para uma festa, apelidada de ¿Balada Down¿. Observou que é uma oportunidade para as pessoas ao redor entenderem e também para os pais perceberem que não há diferenças entre as pessoas.
— Eles namoram, querem casar, fazem faculdade. As pessoas precisam aceitá-los na sociedade — continuou a presidente.
Este tipo de ação, avalia Elizabeth, que também é mãe de um jovem com síndrome de down e que se tornou especialista no assunto ao longo dos anos, ajuda a mudar algumas percepções. Para ela, quanto mais mostrar o jovem com síndrome de down, melhor.
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— Este diagnóstico de médicos do passado, para não sair na rua e preservar a criança, está acabando. Se os pais aprenderem a mostrar os filhos, a inclui-los eles em todas as ações – ir em restaurante, escola, qualquer outra festa – vai estimular os jovens. A ideia é diminuir as diferenças — observa Elizabeth.
A pedagoga e professora de arteterapia dos jovens, Vivian Beuttemmüller Senra, acompanhou a animada galerinha na boate e estava radiante com o resultado. Não só dançou com os jovens, mas pode analisar a reação deles.
— Não é só importante para elas, mas para as outras pessoas que desconhecem o que é síndrome de down verem que eles se divertem como todo mundo — comentou a professora.
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