Em uma descrição de uma frase só, soa como utopia. Uma companhia de dança criada com recursos milionários, apoio irrestrito do governo, bailarinos com carteira assinada, corpo técnico experiente, um futuro teatro próprio. E brasileira. A São Paulo Companhia de Dança (SPCD), atração desta segunda na Noite de Gala do Festival de Dança de Joinville, nasceu esse bebê grande e ambicioso, há pouco mais de um ano.

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A proposta faz parte de um projeto amplo (e polêmico) do governo paulista para valorizar a dança. Em Joinville, os bailarinos da SPCD apresentarão duas obras do balé clássico do século 20. “Les Noces”, com coreografia de Bronislava Nijinska, foi encenada pela primeira vez em 1923. Narra uma cerimônia de casamento de camponeses na antiga Rússia, numa época em que as noivas conheciam os futuros maridos apenas no dia do enlace e se preparavam para serem submissas a eles e às famílias deles.

“Serenade” foi criada na década de 30 pelo coreógrafo George Balanchine sobre “Serenata em dó maior para cordas”, de Tchaikovsky. É uma obra feminina, para bailarinas brilharem, apresentada segundo os padrões registrados pelo coreógrafo. O projeto da SPCD é percorrer do século 19 ao 21: clássico, moderno, contemporâneo e seus híbridos. Os espetáculos desta segunda são escolha da organização do festival.

– Acho que a ideia era mostrar os clássicos no sentido de que são obras que duram no tempo. Impactaram na dança do século 20 e até hoje encantam plateias no mundo inteiro. Balanchine tem uma frase que adoro: ?balé é vida, pertence às pessoas que a executam naquele tempo e lugar?. O balé tem movimento até nisso, muda conforme quem dança – acredita a diretora artística adjunta Inês Bogéa.

A jovem companhia tem no repertório seis peças. Estreia a sétima em outubro em São Paulo. Ainda sem título, tem coreografia da carioca Daniela Cardim (radicada na Holanda) e trilha original, que será executada ao vivo pelo quinteto de cordas Quintal Brasileiro.

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– Daniela utiliza as pontas, ferramenta do balé clássico, mas de uma maneira contemporânea – afirma a diretora artística Iracity Cardoso.

A SPCD exige muito de seus bailarinos, que chegaram no domingo em Joinville. A formação clássica, por si só, não é tudo.

– Eles têm de ter flexibilidade e inteligência enormes para absorver o repertório – diz Iracity.

Em sete meses de 2008, a SPCD trilhou o caminho do projeto ao concreto. Foi criada em janeiro; as audições para selecionar os bailarinos foram em fevereiro; os primeiros ensaios, em abril; e a estreia no palco, em agosto. A maratona de seleção peneirou 800 candidatos até chegar a 40, em cinco cidades brasileiras e em Buenos Aires. Entre os selecionados, vários bailarinos com passagens bem-sucedidas pelo Festival de Dança.

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Os salários podem chegar a R$ 8 mil. Ninguém ainda ganha isso, mas os primeiros bailarinos recebem mais de R$ 6 mil. Faz parte do projeto que o secretário da cultura de São Paulo, João Sayad, classificou de “busca pela excelência”. A busca deve custar R$ 13 milhões anuais para a manutenção da SPCD, mais R$ 300 milhões para erguer o complexo cultural (que abriga três teatros) até 2012. Nesta segunda, Joinville vai ter um vislumbre do que um investimento maciço é capaz.