Por Priscilla Menezes *
Sasha Grey iniciou sua carreira aos dezoito anos atuando em filmes pornográficos e se destacou quase imediatamente. Dizia-se uma performer, alguém que explora os limites do corpo, da sexualidade e das relações entre o viver e o criar. Considerava sua passagem pela indústria pornô uma experiência de auto experimentação, exploração das próprias potencialidades através de vivências intensas e desafiadoras.
Continua depois da publicidade
Por mais de uma vez, falou de Existencialismo em entrevistas, vertente filosófica para a qual a existência precede à essência e o ser só se desvela na prática de uma existência inventada. Assim, foi atiçando curiosidades, por agregar em si qualidades aparentemente paradoxais e pela forma incomum de pensar a própria prática. Sasha Grey costuma declarar que uma de suas grandes metas foi se afirmar positivamente como um ser sexual, sem se colocar como vítima de um sistema opressor, mas como protagonista de sua própria sexualidade.
Aposentou-se aos 21 anos e incursionou pelo cinema convencional, tendo como destaque um papel no filme The Girlfriend Experience de Steven Soderbergh. Seu primeiro livro não é o recém publicado The Juliette Society (Editora LeYa, 2013), mas um menos conhecido chamado Neü Sex (VICE, 2011), no qual apresenta uma série de fotografias e pequenos ensaios onde expõe lampejos de sua vivência no mundo dos filmes eróticos.
Continua depois da publicidade
A artista afirma que fotografar a si própria tornou-se, em certo ponto, uma necessidade, sendo mais uma forma de conhecer e inventar a si mesma. Sua experiência fotográfica pode ser aproximada à de artistas como Nan Goldin, que também retratou sua vivência em um mundo underground de potências violentas e transgressoras. Chegar a The Juliette Society tendo acompanhado a carreira de Sasha até aqui me fez ler o livro com os olhos atentos.
O livro é a narrativa da jornada de Catherine, uma estudante de cinema que se percebe enredada em uma trama de desejos até então desconhecidos por ela. Justapondo citações filmes clássicos, como Belle de Jour de Buñuel, a descrições de labirínticas e apoteóticas orgias, Sasha descreve a história de uma garota que se vê subitamente atravessada por suas potencialidades e seus desejos e a forma como vai lidando com eles, entre equívocos e regozijos.
Apesar de o livro ter uma linguagem de fácil acesso, por vezes, evoca questões densas, como a relação entre o gozo e o divino , a dor e o prazer, a liberdade e o desejo de limitação. Tange questões existenciais com uma narrativa rápida e leve nos faz imergir na experiência de Catherine, de onde é difícil sair sem nos questionarmos acerca de nossas próprias práticas desejantes.
Continua depois da publicidade
Assim, Sasha Grey não se destaca por um manejo raro das palavras, mas por criar uma obra com a qual constrói a si mesma a despeito daquilo que a sociedade estimula, aproximando contrários, frustrando definições, misturando vida com ficção e criando isso que é tão árduo, solitário e inspirador: a invenção singular de uma vida e de uma obra.
* É mestranda em Artes Visuais pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Juliette Society, Sasha Grey. 2013.
Editora Leya. Preço sugerido: R$ 34,00