O Ministério Público de Santa Catarina irá apurar os laudos da Fundação do Ambiente de Santa Catarina (Fatma) que liberaram a construção de um shopping em Criciúma, conforme revelado ontem pelo Diário Catarinense. O promotor Luiz Fernando Góes Ulysséa está à frente da investigação. De férias, concedeu esta entrevista na sexta-feira passada, por telefone.

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:::Fatma pede nova análise do terreno destinado para construção de shopping em Criciúma

Ele comenta sobre o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado com o Parque Shopping de Criciúma, do Grupo Angeloni e a Partage, numa área em que havia nascente. Diz estar surpreso com as ações da Fatma que em 23 dias emitiu um de embargo e outro de desembargo.

Diário Catarinense – Havia denúncias de obras em cima de nascentes de água no Parque Shopping Criciúma?

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Luiz Fernando Góes Ulysséa – Chegou a informação ao MP de forma anônima por Florianópolis e instaurei inquérito civil de empreendimento onde teria se edificado, enfim, ia suprimir nascentes e cursos d’água. Foi verificado que essa área – que aliás foi desmembrada -, onde empreendimento vai se instalar não há nascente e curso d’água.Foi assinado um Termo de Ajustamento de Conduta no qual o empreendedor se compromete a observar o distanciamento que a legislação federal ambiental trata. Onde tem nascente, numa circunferência de 50 metros, não pode ter nenhum tipo de edificação e naqueles cursos d’água, que é o caso onde a largura do curso não é superior a 10 metros, tem que respeitar a preservação permanente, que são 30 metros.

DC – O que diz o TAC?

Ulysséa – Eles se comprometeram a não apenas observar esse distanciamento como recuperar o que ocorreu anos atrás. Da parte do MP não vimos nenhum impedimento que pudesse haver para este empreendimento. Tanto é que posteriormente ele recebeu a Licença Ambiental Prévia e a Licença Ambiental de Instalação. Posterior a isso, chegou também a informação de que na outra área do outro shopping (das Nações), quando da terraplenagem, ocorreu o aterramento e a canalização de um curso d’água. Quando obtive essa informação, requisitei à Famcri (Fundação do Meio Ambiente de Criciúma) que se deslocasse à área. Não obstante a própria Famcri tivesse expedido a Licença Prévia e de Instalação, de fato ocorreu o aterramento ou a canalização. Para minha surpresa veio a informação que ocorreu. Foi instaurado outro procedimento para verificar a circunstância.

DC – Com relação à área nova do Parque Shopping Criciúma, chegaram mais denúncias sobre nascentes?

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Ulysséa – Era uma área única e muito grande e houve o desmembramento. Desde o início, a ideia era edificar onde não se encontra nascente e curso d?água. Ainda assim se comprometeram em preservar o distanciamento. Essa área é acidentada, tem declive e curso d’água. Com chuva provavelmente acumula água. Pode ter ocorrido no passado, na década de 1950, que ali o lençol freático é baixo e ali é uma área que tem umidade. Nascente não foi constatado. Tem um loteamento do lado que no passado pode ter sido aterrado algo. Os empreendedores fizeram sondagem do terreno e não ficou demonstrado.

DC – O senhor conhece o local?

Ulysséa – Estive na área e como leigo e não vi essa característica de nascente e curso d?água. O que não impede depois em algum momento alguém demonstrar isso. Durante o processo de licenciamento, a Fatma acabou participando do processo e também encaminhou técnicos para essa área e não constatou nada. Te confesso que no primeiro momento embargaram não sei por que e depois liberaram. Primeiro fizeram embargo para que não desse continuidade a qualquer edificação. Ocorre que não havia qualquer edificação. Então, não dá para embargar aquilo que não foi iniciado. Segundo, eles não diziam qual área estavam embargando. Embargaram dois imóveis. Depois soube que levantaram o embargo porque não constataram nada. O que posso afirmar que existe é uma discussão comercial muito grande entre dois empreendedores que sabem que não tem condições de Criciúma – e ouvi deles isso – de ter dois shoppings desse porte. Então, é uma guerra comercial muito grande.

DC – A disputa é grande?

Ulysséa – O que eu soube é que algumas lojas âncoras assinaram com um dos grupos e que, se não saísse a licença, iria haver desistência e poderiam migrar de um para o outro. Por parte do MP não temos nada a ver com a guerra comercial.

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DC – A Fatma levou 23 dias para embargar e levantar o embargo. O senhor poderia formular alguma hipótese de por que isso aconteceu tão rápido?

Ulysséa – Na verdade, é a primeira vez que eu vejo isso ocorrer. Me causou surpresa foi o embargo da Fatma. Porque a Fundação Municipal pode licenciar e estava fazendo. Chama a atenção, sobretudo, porque a todo momento o órgão ambiental (Fatma) menciona o número reduzido de servidores e, de repente, embarga um empreendimento que já tem processo de licenciamento no órgão municipal. Como também me chamou a atenção a forma lacônica como isso ocorreu. Essa surpresa minha foi no sentido de que 20 dias depois levanta o embargo. Não sei se fizeram estudo. Solicitei cópia do procedimento à Fatma. Deve estar chegando. Também fiquei curioso e quero saber como ocorreu todo esse procedimento, até para o MP verificar se houve algum tipo de excesso ou comportamento nada tradicional. A gente vai verificar o que ocorreu. Aí se pode, eventualmente, chegar a outra situação, como interferência política ou não. Quero saber como fundamentou o embargo e depois se levantou o embargo.

DC – Alguma suspeita do que pode ter levado a esse embargo e desembargo em pouco tempo?

Ulysséa – Posso afirmar que fiquei surpreso. Normalmente a Fatma diz que tem número reduzido de técnicos, e os municípios criaram, por conta disso, fundações municipais de meio ambiente para dar vazão a licenciamentos. Causou surpresa. Agora afirmar que foi algo premeditado, ou sei lá com outras intenções, seria leviano. Na prática nunca vi isso ocorrer. Existem situações em que tenho que oficiar mais de uma vez a Fatma para que tome providência. Ela não é tão ágil para embargar empreendimento. Tenho caso concreto que demoraram a tomar essa providência. Se o embargo que ela fez foi pertinente, sem dúvida, também não dá para fazer nenhuma perícia na área para em 20 dias depois levantar o embargo.

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