A verdade cruel e inescapável é que o verão divide os seres humanos em dois tipos: os que entram no mar mergulhando com obstinação e os que fazem como eu.
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Na inútil tentativa de evitar o frio, sigo um roteiro bem definido, que comecei a desenvolver aos 12 anos de idade e aprimoro desde então. Começo molhando os pés, depois os pulsos e a nuca. Aí paro. Observo o mar por alguns minutos, penso na vida e, se estiver acompanhada, tento convencer a pessoa ao lado de que isso já foi suficiente para me refrescar.
Supondo que não consiga convencer ninguém de coisa nenhuma, prossigo. Mais quatro corajosos passos e alcanço com valentia a primeira rebentação das ondas, aquela que me obriga a molhar as coxas. Neste momento, respiro fundo e desfruto do sentimento de vitória. Por pouco tempo. É aí que começa a pior etapa: a barriga.
Sentir a água glacial molhando o umbigo é uma dessas coisas atrozes. Trinco os dentes e só não choro de vergonha. As próximas fases (ombros, pescoço e, finalmente, o recompensador mergulho) vêm na sequência, não sem dificuldades. Depois disso, ocupo meu tempo pensando no quanto sou tola e como aquele sofrimento poderia ter sido evitado de maneira óbvia: mergulhando de uma vez. Mas não faço parte do privilegiado grupo de pessoas que se jogam. Fazer o quê.
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O verão é assim mesmo. Revelador. Mais do que primavera, outono e inverno, esta é uma estação com possibilidades que dizem muito sobre nós mesmos: mergulho obstinado ou entrada cautelosa, sunga ou bermuda, boteco ou parador de praia, protetor ou bronzeador, açaí ou queijinho coalho. Cada dia impõe opções que traduzem o tipo de férias que procuramos – e o tipo de veranista que somos.
As alternativas são quase infinitas, e em Florianópolis mais ainda. Você pode beber cervejas refrigeradas a gás na praia do Saquinho, onde nem eletricidade há, ou estourar champanhes de R$ 12 mil em Jurerê. Enfrentar engarrafamentos históricos na volta das praias ou anoitecer à beira-mar. Frequentar baladas glamourosas ou calçar confortáveis chinelos para sacolejar no samba. Encarar dias de chuva em abarrotados shoppings ou num dos pouco explorados museus da cidade.
De vez em quando, as escolhas se apresentam tão explícitas quanto na Praia Mole. Lá, é possível disputar espaço nos 960 metros da faixa de areia ou percorrer meia hora de trilha até a prainha vizinha Gravatá – onde existe apenas um barraco de pescador e muita tranquilidade.
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Em outras vezes, as nuances são um pouco menos nítidas, mas muito mais reveladoras. Exemplo clássico é a decisão de onde colocar o guarda-sol. Você sempre pode dar alguns passos e procurar um pedaço de areia livre ou simplesmente cavar um buraco na areia bem em frente àquele casal que, por sua causa, perderá a vista do mar.
Por essas e outras, não são apenas os corpos que ficam expostos na areia da praia. É aí que está a beleza do verão. Não sobra muito o que esconder – nem na superfície, nem na profundeza.
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