Posso garantir que a Redação de um jornal não é uma enorme sala onde se reúne um grupo de estressados, fumantes inveterados movidos a adrenalina e café, ambiente que o cinema tratou de glamurizar ao longo das décadas, quando cigarro ainda era sinônimo de charme. Assim como escritórios convencionais, corredores de hospitais, salões de beleza ou o chão de fábricas, por exemplo, a Redação costuma ser local de muita emoção pessoal que nem sempre transborda às páginas do jornal ou à tela dos sites. Faço uma inconfidência neste espaço dominical para revelar um pouco da cozinha da Redação da RBS em Florianópolis, no aprazível prédio da SC-401, onde estão as redações do Diário Catarinense e da Hora. E escrevo, no final da tarde de sexta-feira, embalado pela emoção da despedida do colega Ewaldo Willerding, editor de Esportes.
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Ouço falar de Ewaldo há quase 20 anos, pois como colega de empresa acompanhei à distância seu trabalho realizado em Florianópolis, com performances sempre destacadas. Mas posso dizer que conheço Ewaldo, de verdade, há um ano e meio, quando desembarquei em Santa Catarina para viver e trabalhar. Na chegada, empatia à primeira vista. Simpatizei com seu jeito autêntico e organizado de ser. E, apesar do germânico Willerding do pai, Ewaldo carrega uma forte porção Tomio no sangue, sobrenome italiano da mãe que não consta da certidão de batismo do filho mas transparece nas conversas e no dia a dia. Numa dessas conversas, no café do jornal, falamos sobre futuro, planos, novos desafios. Esta expressão – Novos Desafios – está pra lá de desgastada, pois costuma ser usada para pessoas consideradas descartáveis por empresas, clubes, chefes.
Não é o caso de Ewaldo, até porque foi manifestada pelo próprio. Depois de anos de Diário Catarinense, sendo a maior parte na mesma editoria de Esportes, Ewaldo está desejoso de realizar outros projetos e buscar novos ares – segundo ele, fora de uma Redação, ambiente em que convive há mais de duas décadas e meia. A vida deste catarinense nascido em 1964 em Itajaí tem sido mesmo de muita intensidade. O leitor nem imagina, mas os horários difíceis do futebol (há jogos se encerrando à meia-noite e a editoria tem então apenas cinco minutos para concluir o material e mandar à gráfica) e a sequência incessante de jogos (tem futebol todos os dias, até sexta-feira!) consomem energia e cabelos. Deixam a vida em família em segundo plano. Nos afastam dos filhos, dos amigos e da vida social. Impõem um sacrifício permanente, e ainda tendo de trabalhar aos domingos, no caso considerado um dia nobre para o futebol.
Em meio a goles de café e percebendo os olhos marejados de Ewaldo, concluímos num domingo desses que era hora de ele passar o bastão para quem, aliás, preparou com grandeza como sucessor: Marcos Castiel, um talento multimídia superafirmado no Grupo RBS. E marcamos a data. E esta data um dia chega, infelizmente.
Foi isso que ocorreu na tarde desta sexta-feira na Redação, 5 de julho de 2013: a despedida serena, mas carregada de emoção, de um grande colega, de um jornalista modelo aos demais, de uma figura ímpar do cenário esportivo catarinense, de uma pessoa especial. Uma saída pela porta da frente, pela mesma por onde ele entrou na RBS há 19 anos, dois meses e 17 dias. Com apenas 27 anos de vida, o Diário Catarinense deve muito a profissionais da estirpe de Ewaldo, que simboliza as gerações responsáveis por firmar a marca DC.
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Este Diário de Redação de hoje tem a singela intenção de agradecer a Ewaldo e a profissionais como ele, que na saída deixam um vazio em colegas de longa data. Ou em amigos cujos laços se estreitaram há apenas um ano e meio.