Uma pesquisa publicada este mês pelo Instituto Patrícia Galvão e a Locomotiva Pesquisa Estratégica revelou contradições entre os entrevistados sobre o que caracteriza violência sexual e as justificativas que acabam legitimando a agressão. Pelo menos mil pessoas de cinco regiões do país foram ouvidas em julho deste ano.

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“Enquanto a culpabilização das vítimas segue presente, questionamentos ao machismo ganham força na percepção da população”, é uma das conclusões da pesquisa que procurou qualificar a percepção e o comportamento da população brasileira sobre a violência sexual.

Apesar da falta de entendimento sobre o que caracteriza a violência, 96% dos entrevistados concordam que é preciso ensinar os homens a respeitar as mulheres e não as mulheres a ter medo. Além disso, 97% concordam que “sóbria, chapada, vestida ou pelada”, nenhuma mulher merece ser estuprada.

— A violência sexual é uma espécie de violência de gênero fruto de um sistema ainda patriarcal, machista e sexista que acaba, muitas vezes, fazendo que esse tipo de violência ainda ocorra contra a mulher nos seus mais diversos espaços — destacou a delegada Tatiana Bastos, da Delegacia da Mulher de Porto Alegre, que é especialista no assunto.

Confira a pesquisa na íntegra

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Só que em um das alternativas, 89% afirmam que estar bêbado não é justificativa para um homem abusar de uma mulher, mas 20% ainda acham que transar com uma mulher alcoolizada não é violência sexual.

—É sim considerado estupro quando alguém mantém relação com uma mulher contra a vontade dela ou quando ela não tem condições de expressar a sua vontade, seja por estar drogada ou embriagada. Essa condição é equiparada a pessoa com deficiência (mental ou física) — lembrou a delegada regional do Norte de SC, Tânia Harada, que já atuou na Delegacia de Proteção à Criança, Adolescente, Mulher e Idoso (Dpcami) de Joinville.

A delegada destaca ainda uma situação comum entre as vítimas que deveria ficar mais clara na lei, que é a paralisação como reação pela surpresa do ato e até por medo do agressor.

— Como exemplo eu cito um caso que atendi uma vez, quando o tio agarrou a sobrinha de 18 anos. Ela paralisou, não conseguiu reagir, foi considerado estupro — disse Tânia.

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A pesquisa também revelou que nem todas as mulheres têm consciência sobre o que caracteriza violência sexual. Num primeiro momento, 11% das mulheres afirmaram já ter sofrido violência sexual, mas diante de uma lista de situações, 39% reconheceram que já foram submetidas a algum tipo de violência sexual.

Entre os homens, a consciência é ainda menor. Espontaneamente, 2% dos homens admitem ter cometido violência sexual contra uma mulher, mas diante de uma lista de situações, 18% reconhecem terem sido violentos.

Sobre o motivo, 69% das mulheres atribuem a violência sexual ao machismo, enquanto 42% dos homens ainda justificam que a violência sexual acontece porque a mulher provoca. No entanto, a delegada Tatiana lembra que essa justificativa dada pelos homens em pesquisas não reflete a realidade das ocorrências, uma vez que a roupa ou o lugar que ela frequenta não influenciam no crime, pois ele ocorre em situações diversas.

— Faz parte da cultura do estupro, que acaba sempre culpabilizando e responsabilizando a mulher por esse tipo de violência, o que não se reflete nos dados estatísticos. Não tem relação quanto a roupa que ela usa ou o lugar que ela frequenta — concluiu.

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