Tente pesquisar a palavra "Florianópolis" no Google Imagens: praticamente todas as fotos que aparecem como resultado são dominadas por tons de azul e verde, sempre com o mar em destaque. Não é à toa, claro: considerada "a capital turística do Mercosul", Floripa atrai visitantes principalmente por causa de suas 42 praias; de todos os tamanhos, estilos e temperaturas da água – algumas agradam aos surfistas, outras são perfeitas para famílias com crianças, outras atraem os aventureiros e fãs de trilhas…

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Mas a verdade é que, pela maior parte dos 347 anos de história da cidade, os florianopolitanos não viam o mar como local ou fonte de lazer – e o banho de mar, hoje uma prática quase óbvia para quem vive pertinho da praia, não era um hábito apenas ignorado: dependendo do caso, era até mesmo proibido.

"O mar era local de trabalho, no caso dos pescadores, e também meio de transporte: ninguém chegava à ilha por terra, chegava-se pelo mar", lembra o historiador Sérgio Luiz Ferreira, que há anos pesquisa o assunto, e, nos anos 1990, fez dele tema central de sua dissertação de mestrado, no livro O banho de mar na Ilha de Santa Catarina: O lazer na orla marítima de Florianópolis.

Outro motivo que levava as pessoas às praias era ainda menos glamouroso: jogar no mar as fezes e a urina acumuladas em penicos ao longo da noite. É fácil deduzir que a ideia de mergulhar voluntariamente nas mesmas águas onde se despejava os dejetos era simplesmente impensável. "Essa coisa de associar o mar ao lazer é muito recente", diz Sérgio.

O historiador relata que, na Europa, o banho de mar começou a se tornar hábito em meados do século XVIII, principalmente como tratamento medicinal. No Brasil, em grandes cidades como o Rio de Janeiro, a prática passou a se espalhar no final do século XIX; mas só chegou à Ilha de Santa Catarina no final dos anos 1920 e começo dos anos 1930 – de início, a passos tímidos.

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A base da pesquisa de Sérgio foram jornais da época; e, de acordo com as matérias publicadas, o estudioso percebeu que, antes de começar a naturalizar o banho de mar, a mídia fez um esforço proposital no sentido de popularizar o banho – sim, o banho diário, em casa, para lavar o corpo. "A maioria das pessoas lavava só os pés diariamente; o banho de corpo inteiro era feito no máximo uma vez por semana", diz Sérgio. "As casas não tinham banheiro. As residências ricas até tinham 'quartos de banho', que eram locais onde havia uma grande bacia, mas que não era usada todos os dias."

As praias pioneiras em Florianópolis no sentido de ser usadas como locais para banho e mergulho foram a Praia do Müller, entre a altura da Rua Arno Hoeschl e a Praça Esteves Júnior, e a Praia de Fora, dali até onde hoje se localiza o Beiramar Shopping: ambas eram frequentadas principalmente por moradores das ruas Bocaiúva e Almirante Lamego, cujas casas tinham os fundos voltados para o mar; e acessadas pela Rua Esteves Júnior (então Rua do Passeio, batizada depois de Formosa e Senador Mafra), primeira ligação entre o Centro e a baía Norte. As duas praias foram aterradas, nos anos 1960 e 1980, e deram lugar ao espaço onde hoje fica a Avenida Beira-mar Norte.

A construção e inauguração da Ponte Hercílio Luz, em 1926, fez com que as pessoas passassem a construir casas de verão na região de Coqueiros. "Em Coqueiros ainda é possível ver muitas casas antigas de veraneio, que hoje foram transformadas em comércio", conta Sérgio. "Nos anos 1960, dizia-se que a região era 'a Copacabana catarinense'."

Um grande passo na direção da popularização do "veranear" foi a inauguração do Hotel Balneário de Canasvieiras, exatamente no ano de 1930. "Quem vinha veranear muito na ilha era o pessoal da Serra, da região de Lages; como a família Ramos, que governava na época de Getúlio Vargas", afirma o historiador. "Eram tão poucas pessoas que faziam isso que os jornais noticiavam quem estava veraneando. É interessante notar que quem usava o mar como lazer era justamente quem não usava o mar como trabalho: os pescadores frequentemente nem sabiam nadar." O chamado veraneio também era muito mais curto que a temporada de verão de hoje em dia. "As pessoas veraneavam só entre o Dia de Reis e o Carnaval", diz Sérgio.

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É bom lembrar que ir do Centro a Canasvieiras era uma verdadeira aventura: a SC-401 só veio a ser inaugurada no início dos anos 1970; e, até então, a estrada que levava ao Norte da Ilha passava por João Paulo, Saco Grande, Santo Antônio de Lisboa… "E era uma estrada de areia", Sérgio completa. "Frequentemente os veículos atolavam. Era uma viagem de um dia inteiro." Assim, por algum tempo, o Hotel Balneário permaneceu como a única grande construção no bairro – só mais tarde os florianopolitanos, ou mesmo moradores de outras cidades de Santa Catarina, passaram a construir casas de praia na região. "O veraneio no Sul da Ilha demorou mais a se desenvolver justamente porque levou mais tempo antes de abrirem estradas naquela área", relata Sérgio.

Ainda seria um longo caminho até a época dos banhos à fantasia – uma prática relacionada ao mar que também é testemunha de uma época passada, já que se perdeu com o passar dos anos: no século passado, durante o Carnaval, diversos clubes florianopolitanos (o Coqueiros Praia Clube, o Avante) promoviam festas à fantasia que terminavam em banho de mar, combinando duas formas de celebração. O historiador Sérgio tem um testemunho pessoal dessa era: "Eu cresci participando dos banhos de mar à fantasia em Sambaqui", narra.

De início, porém, sequer tomava-se banho de mar com o sol alto: quem adotava a prática costumava entrar na água somente de manhã muito cedo; às vezes mesmo de madrugada, ou à noite. O sol era considerado prejudicial – o hábito de ir à praia para se bronzear só surgiu nos anos 1960. Mas tomar banho de mar no escuro também tem a ver com outra questão crucial: como as pessoas lidavam com permitir que os outros vissem seus corpos com menos roupas do que era considerado "decente".

"Os jornais relatam que, na Praia de Fora, vivia um senhor chamado Aarão Bonifácio, que alugava quartinhos para as pessoas trocarem de roupa", conta Sérgio. "O gesto de tirar uma camada de roupas na frente de outras pessoas, mesmo usando outra muda por baixo, era considerado indecente. Temos que pensar que até mesmo um homem que saísse na rua 'em mangas de camisa', ou seja, sem paletó, era considerado escandaloso." Marisa Ramos foi a primeira pessoa a usar um biquíni de duas peças em Florianópolis, já nos anos 1960 – e se tornou um nome conhecido na cidade simplesmente por isso. "Foi de fato uma revolução nos costumes. Esse era justamente um dos motivos pelos quais o hábito de tomar banho de mar não era visto como coisa de 'gente de bem'; embora existam relatos do século XIX, por exemplo, de que os escravos já adotavam esse costume."

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Nota sobre os banhos de mar publicada no jornal
Nota sobre os banhos de mar publicada no jornal “O Estado” em 1932 (Foto: Hemeroteca da Biblioteca Pública de Santa Catarina)

O pensamento da época provocou até um curioso incidente envolvendo um nome famoso da história de Florianópolis: o de Esteves Júnior, senador do Brasil durante a República Velha. Uma notícia do jornal O Argos da Província de Santa Catarina publicada em 1857, muito antes da prática do veraneio começar a se normalizar, dizia o seguinte: "No dia 11 do corrente, em alto dia, foram lavar-se na Praia de Fora quatro pessoas, entre estas o filho do administrador da Fazenda Provincial, Antônio Esteves Júnior, que foi admoestado pelo inspetor do quarteirão respectivo, fazendo-lhe ver que o artigo 86 do Código de Posturas Municipais proíbe semelhante abuso."

Notícia publicada no jornal
Notícia publicada no jornal “O Argos da Província de Santa Catarina” em 1857 (Foto: Hemeroteca da Biblioteca Pública de Santa Catarina)

O tal artigo 86 deixava claro que multava se fosse "cidadão livre" e encarcerava "se fosse escravo", "quem nu se mostrasse nas praias e nas fontes, em uso escandaloso que fica proibido". Na data do incidente, Esteves Júnior tinha 25 anos e estava em Florianópolis para passar as férias, já que estudava no Rio de Janeiro, onde o costume de tomar banho de mar já existia.

É quase irônico que o nome de Esteves Júnior hoje batize justamente a rua usada pelos primeiros banhistas de Floripa para alcançar as Praias do Müller e de Fora: no final da rua, havia até um trapiche, usado pelos moradores para mergulhar. Na época do delito do então futuro político, o espaço havia sido "liberado" há pouco tempo: até meados dos anos 1840, havia ali uma fortaleza, o Forte de São Francisco Xavier da Praia de Fora. Depois da demolição do forte, foi construída no local a praça Jardim Lauro Müller, onde hoje estão localizados dois canhões desenterrados das ruínas do forte. A praça também mudou de nome: atualmente, chama-se, quem diria, praça Esteves Júnior.