Eu não conhecia Marielle Franco. Até dois dias atrás, ela era uma desconhecida para a grande maioria dos brasileiros, com exceção dos que vivem na cidade do Rio de Janeiro, onde ela foi a quinta vereadora mais votada nas últimas eleições. Um grande feito para uma mulher. Um feito maior ainda para uma mulher negra e um feito quase impensável para uma mulher, negra, pobre e nascida e criada no complexo de favelas da Maré.
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Eu não conhecia Marielle Franco. Não sabia nada sobre ela, nem sobre as dificuldades que teve na vida para estudar, mas dá para imaginar que não deve ter sido fácil. Quantas mulheres, nas mesmas condições, conseguem fazer faculdade e, mais ainda, um mestrado? Marielle, infelizmente, era uma exceção à regra de que universidade no Brasil é para filho de rico.
Eu não conhecia Marielle Franco. Mas conheço muitas mulheres que, como ela, criam seus filhos sozinhas, e passam a vida sendo discriminadas pela sua cor, sexo, condição social. E muitas delas estavam à frente das multidões que saíram às ruas desde a tarde de quinta-feira, para pedir justiça e punição para os assassinos da vereadora e também de seu motorista, Anderson Pedro Gomes, o jovem pai que deixa órfão um filhinho de um ano.
Eu não conhecia Marielle Franco. Mas reconheço agora a sua força em cada punho cerrado erguido por uma mulher em todos os cantos do Brasil desde a sua morte. Observo a força e o poder de Marielle nas lágrimas derramadas em rostos femininos, especialmente nos de pele negra. A vereadora foi morta por ser mulher? Provavelmente não. Por ser negra? Também não. Foi assassinada por que incomodava. Ousou mexer com poderosos e foi mais uma vítima da violência que tanto condenava.
Seus assassinos _ não só quem disparou a arma, mas os que estão por trás disso _ queriam calar uma voz, e conseguiram. Marielle emudeceu. Mas sua luta ganhou ainda mais força e repercussão. As Marielles estão se multiplicando pelo país, e suas vozes, se tornando um coro, um dia hão de serem ouvidas.
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