A autorização para tramitação do segundo pedido de impeachment contra o governador Carlos Moisés (PSL) e a vice-governadora Daniela Reinehr (sem partido), que começou a tramitar na quinta-feira na Assembleia Legislativa, traz três significados. Um simbólico, uma estratégico e outro extremamente prático.
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Simbolicamente, é inédito que dois impeachments tramitem paralelamente no parlamento catarinense – talvez até no país. Na história, Santa Catarina viveu o drama de um processo de cassação de governador por crime de responsabilidade apenas no governo Paulo Afonso Vieira (PMDB), em 1997, quando o escândalo gerado pela operação financeira com Letras do Tesouro Estadual colocou o emedebista na berlinda – faltaram dois votos para o afastamento. Dois pedidos, por motivos diferentes, só Moisés e Daniela.
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Estrategicamente, o segundo pedido de impeachment mantém Moisés e Daniela, mais ele do que ela, sangrando politicamente em um período que poderia ser de entressafra de notícias ruins. A defesa do governador, da vice e do secretário Jorge Tasca, também alvo do primeiro pedido de impeachment, foi entregue na quarta-feira, passando a contar a partir de então o prazo de cinco sessões para análise pela comissão especial do impeachment – um período mais ensimesmado do processo.
Além disso, o segundo pedido traz um episódio que desgasta mais o governo Moisés junto à opinião pública, que é o caso da compra desastrada de 200 respiradores de UTI por R$ 33 milhões – pagos antecipadamente por equipamentos nunca entregues. Foi esse escândalo que descarrilou a gestão do pesselista e que criou o clima para seu impeachment. O nebuloso e burocrático caso da equiparação salarial dos procuradores, que teria sido realizada sem previsão legal, ascendeu pela peculiaridade de o pedido apresentado pelo defensor público Ralf Zimmer incluir também Daniela Reinehr e propiciar novas eleições.
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Daí vem, então, a questão prática que eu citei no começo deste texto. O pedido aceito na quinta-feira aportou na Assembleia assinado por advogados, empresários e representantes de entidades como uma espécie de “impeachment do conjunto da obra”. Relacionava os casos dos procuradores e dos respiradores, mas também casos que nunca ficaram bem explicadas, como a quase contratação milionária de um hospital de campanha em Itajaí, com questões banais ou exageradas, como as tentativas frustradas de Moisés para reduzir o duodécimo dos poderes ou reformar a previdência.
Ao analisar o pedido, a Procuradoria da Alesc desidratou aquela confusão e o transformou em um pedido de impeachment sobre os gastos na pandemia, reunindo respiradores fantasmas e hospital de campanha. Tirou o caso dos procuradores por já estar em análise no primeiro pedido de impeachment e o resto porque não havia razão de estar ali. Manteve, no entanto, o detalhe principal: Daniela Reinehr também é alvo deste pedido de impeachment – por omissão, segundo os autores.
O caso dos respiradores foi tão emblemático que gerou uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) extremamente incômoda ao governo Moisés. Seu relatório final, aprovado dia 19 de agosto, pediu que suas conclusões fossem aceitas pelo presidente Júlio Garcia (PSD) como um novo pedido de impeachment. O ato de entrega do relatório final está previsto para a próxima semana, mas o fato de o caso dos respiradores estão incluído no pedido de quinta-feira, esvazia o ato.
Isso gerou ruído entre os parlamentares, com integrantes da CPI questionando internamente o procedimento. Durante três meses, a investigação parlamentar ouviu testemunhas, analisou documentos, deu luz aos detalhes da transação considerada desastrosa pelo próprio governo, criminosa pelo Ministério Público Estadual. Mas a CPI não inclui Daniela Reinehr, não leva a um provável governo de transição liderado por Júlio Garcia, não resulta em novas eleições para titular do cargo caso o impeachment seja confirmado por um tribunal misto de deputados e desembargadores. Ou seja, um impeachment derivado da CPI não era prático – e agora, está natimorto.
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