É nítido o apreço do presidente Jair Bolsonaro pelos eventos da Academia Nacional da Polícia Rodoviária Federal, localizada em Florianópolis. Ano passado, esteve na capital catarinense em outubro para uma aula inaugural de uma turma, agora veio para a formatura de outra. Curiosamente, ambos os eventos aconteceram em momentos cruciais do que chamamos de bolsonarismo e sua consolidação como força política.
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Em 2019, Bolsonaro chegou a Florianópolis em meio ao auge da crise do PSL que culminaria em sua saída do partido. Desta vez, veio a Santa Catarina no momento em que os números da apuração da eleição americana apontam a provável derrota do aliado e guia político Donald Trump. Nos dois momentos, o presidente usou no discurso para mandar recados importantes.
Sem maior contexto dentro do que o evento propunha, Bolsonaro tomou a iniciativa de citar o presidente dos Estados Unidos e a eleição cuja apuração vem sendo liderada pelo adversário Joe Biden. Lembrou que torce por Trump, embora em um tom que pode ser lido como resignação diante da derrota do aliado.
– O momento do Brasil ainda é difícil. Assistimos à política externa. Temos nossas preferências e o que acontece lá fora interessa para cada um de nós aqui dentro. Assim sendo, somente uma coisa nos encoraja e fortalece: sempre Deus acima de tudo. Eu não sou a pessoa mais importante do Brasil, assim como Trump não é a pessoa mais importante do mundo. A pessoa mais importante do mundo é Deus. A humildade tem que se fazer presente entre nós – disse, textualmente, o presidente aos formandos da Polícia Rodoviária Federal.
A eleição de Trump em 2016, baseada em um discurso antípoda ao politicamente correto, abusando (e até exagerando) da antipolítica e das redes sociais para enfrentar não apenas os Democratas, mas a própria política tradicional dos Republicanos, foi mais do que uma inspiração para Bolsonaro chegar a presidência em 2018. Não à toa, seus seguidores engajam-se na torcida pela reeleição de Trump como se fosse um prenúncio da reeleição de Bolsonaro, da mesma forma que os adversários veem a possível vitória de Biden como uma virada dos ventos da política mundial. Neste momento, tudo é desejo, não mais do que isso.
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É curiosa, no entanto, a fala de Bolsonaro em Florianópolis. Amenizadora, no momento em que bolsonaristas – liderados pelo filho Eduardo Bolsonaro, deputado federal -aderem às teses antidemocráticas de Trump de que a eleição americana está sendo fraudada. É curiosa, mas não é de se estranhar. Porque acontece justamente em um momento que Bolsonaro se aproxima cada vez mais dos partidos do Centrão, que estão lhe garantindo não só governabilidade no Congresso Nacional, como certa tranquilidade política.
Não à toa são fortes as especulações de que o presidente possa desistir da criação do Aliança pelo Brasil para optar pela filiação a um partido mais tradicional – como o o PP, legenda em que esteve de 2005 a 2016, ou o PL. Nos eventos pelo país, Bolsonaro tem feito elogios aos integrantes locais desse grupo. Nesta sexta-feira em Florianópolis, não foi diferente. Recém apontado como um dos vice-líderes do governo no Senado, Jorginho Mello (PL) foi o único político catarinense referenciado no discurso presidencial – mesmo com a bolsonarista Daniela Reinehr, governadora interina, presente.
– Quero louvá-lo aqui pelo Pronampe (linha de crédito aprovada a partir de projeto de Jorginho). O seu projeto que deu condições para que milhões de empregos deixassem de ser extintos aqui no Brasil – disse Bolsonaro.
Não entendam como aleatórias ou improvisadas as citações do presidente aos políticos locais. Em 2019, no auge da crise com o PSL, Bolsonaro usou o discurso para elogiar a lealdade dos deputados federais Caroline de Toni e Coronel Armando, que naquele momento assinavam as listas pela manutenção de Eduardo Bolsonaro como líder da bancada do PSL. Naquela época, os Bolsonaros ainda disputavam o controle da legenda, antes de decidir abandoná-la. Neste momento, de novo em Florianópolis, o presidente indica mais uma vez os rumos de seu grupo político.
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