Vou pedir licença ao leitor para sair deste cotidiano inédito que estamos vivendo e olhar para o futuro. Quando estiver no passado a ameaça da pandemia, quando tivermos chorado nossas perdas e reconstruído nossos negócios, quando nossas autoridades eleitas pararem de bater cabeça – perdoe esse excesso de otimismo -, enfim, quando essa loucura passar, teremos muitas lições para assimilar. Uma delas, possivelmente, deve ser a forma como lidamos com nosso sistema de representação política.
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Na semana que passou, o Congresso Nacional e Assembleia Legislativa tiveram que se adaptar aos tempos de isolamento social e implantar versões improvisadas de um plenário virtual – com os parlamentares votando à distância projetos importantes para mitigar os efeitos das restrições impostas à sociedade como forma de diminuir a força da infestação do coronavírus.
Na Assembleia Legislativa, vimos quórum cheio para votar uma autorização de financiamento internacional que governador Carlos Moisés (PSL) pediu ainda no ano passado – R$ 1,7 bilhão para quitar um empréstimo de 2012 junto ao Bank of America, no governo Raimundo Colombo (PSD), melhorando as condições. Além disso, cinco projetos apresentados pelos deputados estaduais no início da própria semana com medidas para aliviar o peso do isolamento social determinado pelo Estado – suspensão de corte de luz, água e gás, proibição de demitir professores ACTs durante o Estado de emergência, etc.
No Congresso, senadores e deputados federais vão encarar as duras medidas do pacote enviado em medida provisória pelo presidente Jair Bolsonaro para minimizar os efeitos da paralisação do país sobre a economia, os empregadores e os empregados. Discussões vitais feitas com os parlamentares em suas casas, em suas cidades.
Eu disse que ia falar do futuro, estou falando do presente para exemplificar. Temos um modelo de representação que não é muito diferente do que se fazia no tempo do Império e da República Velha. Elegemos representantes e a presença deles na sede do Legislativo nas capitais federal ou estaduais garante a existência e a rotina dos parlamentos. Para viabilizar isso, assessores aqui e lá, gabinetes, passagens aéreas, carros alugados, apartamentos funcionais. Um gasto que hoje é considerado inevitável, mas que está na raiz de boa parte do descrédito e da impopularidade que os legislativos vivem diante de uma sociedade muito suscetível aos discursos fáceis da antipolítica.
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Volto a falar do futuro possível. Claro que é preciso deixar claro como e quando usar as ferramentas que permitem as sessões virtuais, definir quando é imprescindível a presença física do parlamentar em Brasília, Florianópolis e outras capitais, garantir a participação em tempo real da sociedade. Mas essa experiência das sessões virtuais, com pautas enxutas e determinadas de forma objetiva, pode e deve inspirar mudanças no jeito de legislar no Brasil. Afinal, os tempos do Império, da República Velha, do fraque, da cartola e da bengala, ficaram para trás. Hora de olhar para o presente/futuro.
Artigo publicado nas edições de 28/3/2020 das revistas DC, AN e Santa