Gerou algum estardalhaço nas redes sociais o editorial da Folha de S. Paulo intitulado “Jair Rousseff” – texto que traça um paralelo entre a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e o atual, Jair Bolsonaro (sem partido), a partir da questão fiscal. O mote seria o apetite apresentado por Jair em furar a lei do teto de gastos, aprovada em 2016 como um antídoto ao descontrole imputado a Rousseff.

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Como era de se esperar, mas talvez até um pouco mais do que o previsto pelo jornal paulistano, o artigo desagradou gregos e troianos – bolsonaristas e petistas não suportaram a comparação entre aquela e aquele que representam seus ódios políticos. A análise do editorial em tuítes e postagens faz parecer que todas as características de Dilma e Bolsonaro foram igualadas, não que se tratava de provocação pontual.

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Mas este texto não é um desagravo à Folha, que não precisa do meu suporte. O título que usei já entrega que o editorial e sua repercussão me deixaram com vontade de catarinizar a provocação. Pensando um pouco, não é difícil traçar paralelos entre Dilma, a presidente impichada, e o governador Carlos Moisés (PSL) alvo de um processo de impeachment na Assembleia Legislativa.

Moisés e Dilma eram estrangeiros na política quando foram escolhidos para concorrer aos cargos que lhe deram expressão. O catarinense muito mais do que a mineira radicada no Rio Grande do Sul. Ela ocupou cargos nos governos gaúcho e federal antes de ser alçada pelo então presidente Lula (PT) à Casa Civil após seus homens-fortes, Antonio Palocci e José Dirceu, caírem em desgraça. Virou braço-direito e foi ungida por Lula como o nome da sucessão petista. Em sua primeira eleição, virou presidente. Na segunda, foi reeleita. Mas nunca adquiriu o traquejo político que notabilizou o antecessor, nunca deixou de ser a escolhida de Lula.

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Moisés foi eleito como “o governador do Bolsonaro”, também não tinha expressão política. Os cargos que ocupou na hierarquia do Corpo de Bombeiros não foram além do comando regional em Tubarão. Virou candidato a governador pela relação pessoal que tinha com Lucas Esmeraldino, então proprietário da franquia do PSL em Santa Catarina. Na antevéspera do prazo final das convenções partidárias foi indicado candidato porque nem mesmo o PSL acreditava que era possível eleger o governador. A onda Bolsonaro foi tão forte que ele virou governador com 71% dos votos no segundo turno. Moisés e Dilma compartilham, assim, a experiência de ter em um padrinho seu maior atributo eleitoral.

Há outra semelhança, no entanto. Com as canetas de presidente e governador nas mãos, a gerente e o comandante se negaram a ser meras marionetes da figura política que os elegeu. Ambos tentaram traçar rumos próprios na composição de seus governos, nas prioridades. Os dois apresentaram dificuldades em lidar com a política estabelecida, com os aliados possíveis, em dialogar com o parlamento. Fazer política sempre foi difícil para Dilma e ela se cercou de conselheiros com muito apetite e pouco talento, como Aloizio Mercadante. Fazer política tem sido difícil para Moisés e ele se cercou de conselheiros com muito apetite e pouco talento, como Douglas Borba.

Os paralelos são um exercício interessante de fazer em política. Não para igualar situações, conjunturas e personagens, mas por permitirem observar as regras práticas que regem a conquista e a manutenção de poder. Dilma estará nos livros de história como uma presidente improvável e pouco hábil de um país em curto-circuito e em fim de ciclo – e pelo impeachment que sofreu. A história do também pouco hábil e improvável governador Moisés ainda está sendo escrita, há margem para que ele escape do mesmo destino. Para isso, é sempre bom observar os paralelos.

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