— Agora estou melhor, mas já estive pior. Meu Deus do céu, estive no inferno por alguns meses.

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A voz continua inconfundível, mas é inegável que a fala do deputado federal João Rodrigues (PSD) não é a mesma de alguns meses atrás. Especificamente desde 8 de fevereiro, quando o STF determinou o cumprimento imediato da pena de cinco anos e três meses de prisão em regime semiaberto por irregularidades na compra de uma retroescavadeira quando era prefeito interino de Pinhalzinho em 1999.

Cinco meses depois, em 8 de junho, foi autorizado a exercer o mandato na Câmara dos Deputados durante o dia e voltar à noite para a Penitenciária da Papuda. No último sábado, a convenção do PSD-SC aprovou seu nome para concorrer à reeleição. Candidato a governador e presidente estadual da sigla, Gelson Merisio (PSD) ressaltou que os pessedistas acreditam na inocência do parlamentar, mas que ele só terá nome registrado dia 15 de agosto se estiver com a ficha limpa.

Por telefone, em uma conversa de 17 minutos no final da tarde desta segunda-feira (leia a íntegra abaixo), Rodrigues disse que o prazo apontado por Merisio é uma questão de legalidade. Aposta que até lá o STF analise seus recursos: ele pleiteia que a condenação no TRF-4 seja analisada no mérito pelos ministros, o que ainda não aconteceu, e também a prescrição do crime.

— O que me machuca é que o próprio relator do processo (Luiz Fux) me absolve, diz que não tem dano ao erário — diz Rodrigues.

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Ele não esconde a tristeza de ser citado em rede nacional como “deputado presidiário” e diz que esse é um dos principais motivos para tentar concorrer a mais um mandato em Brasília – foi eleito em 2010 e 2014.

— Quero provar para o Brasil que sou inocente. Toda a força da mídia nacional, que me derrete, não gerou impacto em SC para me destruir, porque é uma injustiça.

Antes da prisão, Rodrigues havia lançado sua pré-candidatura ao governo em oposição interna a Merisio. Embora considere que o questão das alianças continua aberta, vê a candidatura do correligionário como irreversível.

— Ele construiu isso. Não tem como desconstruir até porque seria trabalhar contra o patrimônio.

Não ressalva nem mesmo a presença de partidos de esquerda – PDT e PCdoB – na composição do colega. Lembra que já foi pedetista e que tem divergências locais e ideológicas com PT e PCdoB, mas que “isso de ficar apontando o dedo não é uma condição que tenho no momento”. O tom mais ameno se reflete ainda ao comentar a prisão do ex-presidente Lula (PT), que também tenta ser candidato em outubro. Ressalta que o caso do petista tem delações premiadas e documentos, mas acha legítimo que ele “busque o direito que acha que tem”.

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— Não queria criticá-lo ou apontá-lo como se fosse um grande bandido, até porque tem muita gente tanto quanto ou pior que ele por solta por aí.

Antes entusiasta do presidenciável Jair Bolsonaro (PSL), Rodrigues diz que ainda não definiu quem apoiar em outubro.

— O que eu pensava antes de ser preso não é a mesma coisa que eu penso depois de passar por lá. Você muda muito o pensamento sobre imediatismos, sobre milagres. Isso não existe.

Leia a íntegra da entrevista:

Gelson Merisio disse na convenção do PSD-SC que o partido acredita na sua inocência e que por isso sua inscrição como candidato foi aceita, mas que no dia 15 de agosto só serão registrados os candidatos que estejam juridicamente liberados para concorrer. Esse também é seu prazo no aguardo dos recursos?

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É uma razão de legalidade. No dia 15 é o fim do prazo do registro de candidaturas. Sujeito que não estiver com a documentação em dia, não é para registrar mesmo. O meu caso tem alguns diferenciais. Sou o único condenado no Brasil e na história da República com mandato, preso sem transitado em julgado (encerrada a possibilidade de recursos), em instância única (foi julgado diretamente no TRF-4, foro dos prefeitos). Na situação na qual estou hoje deve ter uma meia-dúzia de deputados que estão exercendo o mandato e que deveriam estar cumprindo pena. Não estou torcendo para que sejam (presos), mas eu sou o único. Só sou condenado em uma instância, o TRF-4 por 3 votos a 2, porque o STF não aceitou o meu recurso, ele não me condenou. O que me machuca terrivelmente é que o próprio relator (ministro Luiz Fux, do STF) do processo me absolve de tudo, diz que não tem dano ao erário. O STF e o STJ absolvem o réu quando não há dano. Tanto é que a Câmara dos Deputados, no Conselho de Ética (processo de cassação) não foi julgado se cabia ou não cassação no meu caso, foi julgado se cometi o crime ou não. E foi arquivado por unanimidade. E a Lei da Ficha Limpa diz que quando não tem dano ao erário não se enquadra como ficha suja.

Mas acredita que essa avaliação será feita até o dia 15?

Eu quero que faça amanhã, que tivessem me julgado antes do recesso.

Mas vai dar tempo?

Não tenha dúvida. Não é expectativa, é direito. Isso está sendo dito por quem? Pela unanimidade do Conselho de Ética, e isso inclui o PT. Pelos recursos que estão sendo julgados no STJ.

O seu caso ganhou repercussão nacional, pelo fato de ser um deputado preso…

Eu sou o deputado presidiário. Em nível nacional eu sou considerado um deputado presidiário.

Qualquer movimentação do seu caso vira notícia nacional. Como se sente virando uma espécie de símbolo de políticos envolvidos em corrupção?

A pior coisa para um ser humano é ser acusado de algo que não praticou. Ser vítima de um equívoco, um erro judiciário. Você tem a vida escrachada, a imagem desmanchada a nível nacional. É o pior sentimento. Eu não conheço outra pessoa na história da política brasileira que tenha passado pelo que eu estou passando. Nem Ibsen Pinheiro (deputado do PMDB gaúcho cassado nos anos 1990) que era considerado o maior erro da Câmara dos Deputados. Ele não foi condenado na Justiça. Eu fui absolvido na Câmara, mas uma única condenação, sem direito a dupla jurisdição, é um caso único no Brasil.

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Se o STF não analisar seu caso até dia 15 de agosto, o senhor tem plano B? Apoia alguém?

Não, eu vou na Justiça, eu vou buscar esse direito. Vou brigar na Justiça. Já estou no Supremo, vou para o Tribunal Superior Eleitoral. Vou conseguir esse registro e vou ser candidato a deputado federal. A minha disposição tem duas razões. Primeiro, porque eu gosto de fazer o que eu faço. Mas quero provar para o Brasil que sou inocente. Para o país, porque em Santa Catarina conhecem minha história. Isso é praticamente um assassinato. Em um assassinato o morto é enterrado. Eu, faz cinco meses que estão me arrancando os pedaços. Os caras me matam uma vez por dia. Eu vou disputar para provar ao resto do Brasil que o que fizeram comigo é uma grande injustiça. E para continuar trabalhando com ainda mais vontade do que eu tinha. Se bem que nunca fui preguiçoso para isso. O que me deixou extremamente emocionado foi no ato da convenção do PSD do Estado ter 60% dos prefeitos do partido publicamente declarando apoio à minha candidatura. No momento em que o cara está preso, as pessoas podiam se esconder, não chegar perto, dizer que se arrependeram de ter votado. Mas é o contrário, gente de vários partidos, não só do PSD, declara apoio. Com toda a força da mídia nacional, que me derrete, não gerou impacto em Santa Catarina para me destruir. Tem alguma coisa errada aí, alguma injustiça foi feita.

Como o senhor está analisando o quadro eleitoral do Estado. Homologada na convenção, a candidatura de Gelson Merisio (PSD) é irreversível mesmo?

Eu acredito que é. Fez a convenção, buscou espaço, alianças com partidos de pequeno e médio porte. Acho que não tem mais volta, não tem como voltar para trás. Ele construiu isso. Não tem como desconstruir até porque seria trabalhar contra o patrimônio. Acho que a candidatura dele é irreversível.

Acha que o PP de Esperidião Amin vai integrar a aliança?

Acho que tudo é possível até o fechamento das convenções. Aí, tudo é possível. Absolutamente tudo.

O senhor chegou a dizer ano passado que não queria partidos de esquerda na coligação. Merisio fechou com PDT e PCdoB. É um problema para o senhor?

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Com o PDT nunca tive problema, já fui pedetista. Sempre tive divergências com o PT, por razões locais lá em Chapecó, com o próprio PCdoB. Te diria hoje, no momento em que vivo, não tenho mais o direito de apontar dedo para ninguém, mas continuo pensando como pensava em razão de comportamentos, posições, ideologicamente falando. Ou seja, eu divirjo, mas isso de ficar apontando o dedo não é uma condição que tenho no momento.

Como o senhor avalia a situação do ex-presidente Lula (PT), que também está preso e deseja ser candidato à presidência?

Eu acho que ele tem direito a defesa, como qualquer cidadão brasileiro. Não quero aqui condená-lo, mas não posso inocentá-lo. Nosso país passou por graves problemas históricos em decorrência de tudo que ocorreu. O presidente Lula deixou coisas boas, não dá para dizer que foi tudo ruim. Mas não foi muito melhor do que os outros que passaram e que aqui estão. A política brasileira é contaminada por várias questões na história, desde o governo Fernando Henrique (PSDB), o próprio Sarney (MDB), Collor, a própria Dilma (PT). Mas eu acho que não ele (Lula) pensar, sonhar ser candidato porque existe uma condenação com delações premiadas, documentações. Elas são questionadas pela defesa dele, então não tenho o direito de dizer que ele é o bandido. O presidente Lula está buscando o direito que ele acha que tem. Ele tem o direito de achar, tem o direito de se defender. Não queria criticá-lo ou apontá-lo como se fosse um grande bandido, até porque tem muita gente tanto quanto ou pior que ele por solta por aí.

Já tem candidato à Presidência da República?

Não tenho. Minha tendência é aguardar as definições das candidaturas, o fechamento das alianças do PSD. Vou avaliar com muito cuidado. O que eu pensava antes de ser preso não é a mesma coisa que eu penso depois de passar por lá. Você muda muito o pensamento sobre imediatismos, sobre milagres. Isso não existe.

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Como está sua rotina no Congresso?

Como agora estamos em recesso, acabo despachando por telefone com os prefeitos do interior. Questões de emendas, que sempre ficam enroscadas, falta documento. Estou fazendo uma rotina normal sem a atividade das sessões.

Como foi aquele momento em que o senhor chegou a ter o suplente convocado para substituí-lo e no mesmo dia veio a decisão autorizando a volta ao trabalho? Chegou a ter os funcionários exonerados.

Logo que fui preso já tinha feito a exoneração de alguns porque não ia precisar de todos. Naquela véspera, ficou aquela sensação do mandato conquistado com voto direto, trabalho, suor, sacrifício. E de repente você estava sendo afastado de uma forma injusta. Mas a regra era essa: quatro meses de ausência, tem que chamar o suplente.

Ficou chateado com o suplente Edinho Bez (MDB) pela velocidade nas exonerações?

Cada um age como quer. Se ele achou que era correta a forma dele, eu não tenho nenhuma avaliação a fazer. Eu, com certeza absoluta, em primeiro lugar, se fosse chamado como suplente para assumir o lugar de alguém que sai do mandato dessa forma, eu seria solidário à pessoa. Só isso. Poderia ter recebido meu chefe de gabinete ou pelo menos visitado meu gabinete para ser solidário aos meus colaboradores. Mas às vezes a pessoa está muito ocupada, não teve tempo. Isso não me machuca mais do que me machucaram.

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