A aprovação em primeiro turno da reforma da previdência na Câmara dos Deputados parece ter feito o presidente Jair Bolsonaro (PSL) desligar de vez qualquer dispositivo interno de autopreservação. A tática do confronto direto e sem margem a conciliação contra qualquer setor da sociedade que possa ser visto como adversário foi utilizada desde o primeiro dia do mandato, mas ganhou força desde então – a provocação em que cita o desaparecimento do pai do presidente da OAB nacional durante o regime militar é o ápice até agora de uma espécie de “desliturgia” do cargo.
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Olhando para a política catarinense, tema mais identificado com esta coluna, chama atenção como o estilo de Bolsonaro é praticamente oposto ao do governador Carlos Moisés da Silva. Ambos foram eleitos na mesma onda 17, mas não há aqui no Estado esta legitimação através do confronto. Para entender essas diferenças, é importante fatiar a onda político-eleitoral vivida ano passado.
Em determinado momento, não preciso detalhar aqui, Bolsonaro tornou-se o elo de três movimentos que ganharam força na sociedade. O desejo de mudança é o mais corriqueiro deles – as eleições de 1986 para os governos estaduais e a vitória de Lula em 2002, por exemplo, também tinham esse componente.
Além desse desejo, outros dois movimentos confluíram para Bolsonaro: o sentimento de aversão à política em geral e o antipetismo em particular. É por isso que o atual presidente disparou nas pesquisas após Fernando Haddad (PT) ganhar alguns pontos quando a candidatura Lula foi indeferida – some-se aí, claro, o clamor do atentado em Juiz de Fora.
Moisés foi beneficiário indireto da onda 17, todos sabemos. Praticamente desconhecido, chegou ao governo com uma votação inédita e consagradora. Em Santa Catarina, a esquerda e o PT não são adversários diretos – nunca chegaram a um segundo turno estadual. Para legitimar-se no cargo e perenizar como força política, o governador precisa atender ao desejo de mudança e à aversão aos políticos tradicionais. É o que tem buscado fazer, apesar de alguns lideranças do PSL e bolsonaristas reclamarem do tom moderado e conciliador.
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Enquanto isso, Bolsonaro precisa – e sente-se bem assim – manter a corda esticada. Há muitos nomes para ocupar o espaço de candidato conservador nos costumes, liberal na economia e reformista. Ele é único disposto fazer o confronto com a esquerda e manter viva a polarização entre o petismo e o antipetismo. Acostume-se, vai ser sempre assim.