Diretor de Vigilância Epidemiológica em Santa Catarina durante os governos de Luiz Henrique da Silveira (PMDB), nos anos 2000, Luís Antonio Silva faz críticas contundentes à gestão da pandemia do coronavírus no governo de Carlos Moisés (PSL). Em texto enviado a antigos colaboradores na Secretaria de Saúde, o epidemiologista afirma que o Regulamento Sanitário Internacional aprovado em 2005 pela Organização Mundial de Saúde (OMS) está sendo descaracterizado no Estado e que nunca imaginou que ele “cairia no colo de alguns gestores públicos inaptos de conhecimento e respeito à ciência”.
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Luís Antonio Silva estava à frente da Diretoria de Vigilância Epidemiológica (Dive) em 2009, quando a pandemia da H1N1 atingiu o Brasil e Santa Catarina. Naquele ano, 144 pessoas morreram no Estado em função da infecção. Em uma cenário completamente diferente, com aumento no número de vítimas da covid-19, o ex-diretor defende “a necessidade de medidas de restrições mais rigorosas como alternativa para frear a transmissão e dispor de tempo para que os serviços de saúde possam se reorganizar”. A argumentação do epidemiologista tem como base o volume de mortes em Santa Catarina nas últimas quatro semanas, que ele aponta serem maiores do que as piores projeções da crise do coronavírus.
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– Pelas previsões do modelo do Imperial College London considerando o seu pior cenário, que por si só já é inquietante, rodado aqui em Santa Catarina para as últimas quatro semanas (de 21/02 a 21/03), ocorreria um incremento de 721 óbitos a mais (…). Infelizmente, ontem (16/03) o Estado de SC atingiu o total de 8958 (mortes), ou seja, 1369 óbitos a mais do que o previsto para até essa data – aponta Silva.
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Segundo o epidemiologista, o Estado caiu em um “buraco negro” e que a atual média diária de 117 mortos levaria Santa Catarina a chegar a 21 de março com 2 mil vítimas do covid-19 a mais do que os piores projeções do modelo do Imperial College London. É uma cenário em que “muitos catarinenses estão sendo ‘escolhidos’ para morrer sem acesso ao tratamento em leitos de UTI”, diz o especialista.
– Quantas vidas mais teremos que perder sem uma intervenção efetiva? Alguém se responsabilizará por isso? – questiona.
Leia o texto na íntegra, cuja publicação foi autorizada por Luís Antonio Silva:
Ao validarmos o Regulamento Sanitário Internacional em 2005, na qual Santa Catarina serviu de modelo para a aprovação do mesmo, jamais poderíamos imaginar que tal regulamento seria tão descaracterizado e cairia no colo de alguns gestores públicos inaptos de conhecimento e respeito à ciência. A geração, discussão e aplicação desse conhecimento de formas sistemáticas deverá sempre subsidiar a tomada de decisão para a implantação de estratégias e intervenções adequadas e oportunas para o enfrentamento de situações de emergências em saúde pública.
Senão vejamos. Pelas previsões do modelo do Imperial College London considerando o seu pior cenário, que por si só já é inquietante, rodado aqui em Santa Catarina para as últimas quatro semanas (de 21/02 a 21/03), ocorreria um incremento de 721 óbitos a mais, o que alcançaria o total de 7682 óbitos até o dia 21/03, com média diária de 25 casos, com uma leve tendência de queda na última semana do modelo previsto (14 a 21/03), para uma média de 18 óbitos por dia.
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Infelizmente, ontem (16/03) o estado de SC atingiu o total de 8958, ou seja, 1369 óbitos a mais do que o previsto para até essa data (49 óbitos por dia em média), o que nos dá a exata dimensão do buraco negro em que caímos. Somente nos últimos cinco dias a média diária subiu para 117 óbitos, o que sugere fortemente para os próximos cinco dias (até 21/03) um aumento do registro de aproximadamente mais de 600 óbitos.
Neste contexto, com a realidade mostrando que serão 2000 óbitos a mais do que o estimado até 21/03, se impõem a necessidade de medidas de restrições mais rigorosas como alternativa para frear a transmissão e dispor de tempo para que os serviços de saúde possam se reorganizar. Apostar, simplesmente em estudos de algumas universidades e instituições que apontam que o número real de casos possa ser até 15 vezes maior do que os notificados, assim como a própria história natural do vírus, elevando o percentual de contaminados ocasionando uma possível imunidade ativa de rebanho, é o mesmo que reproduzir o que já está acontecendo onde muitos catarinenses estão sendo “escolhidos” para morrer sem acesso ao tratamento em leitos de UTI. Quantas vidas mais teremos que perder sem uma intervenção efetiva? Alguém se responsabilizará por isso?
Dr. Luís Antonio Silva
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