Quando vivia o melhor momento como governador do Estado, no final de 2019, Carlos Moisés (PSL) colocou em prática uma operação política delicada. Em palavras, gestos, entrevistas e alinhamentos, procurou afastar-se do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Ele foi convencido a marcar território mais ao centro na busca de se consolidar como protagonista na política estadual – abrindo mão dos bolsonaristas mais radicais, especialmente os da Assembleia Legislativa.
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Governadores rebatem Bolsonaro por “promoção de conflito” na pandemia; Moisés não assina carta
O movimento não deu certo e deixou Moisés extremamente desguarnecido quando precisou enfrentar a pandemia e a crise gerada pela compra dos respiradores fantasmas. Ficou sem base política e sem torcida – os bolsonaristas eram seus maiores críticos e ninguém aderiu ao Moisés centrista. Desde então, o governador tenta a reaproximação com o presidente Jair Bolsonaro e uma trégua com sua inflamada militância – ainda sem o menor sinal de sucesso. É por esta lógica que Moisés aceita calado a narrativa presidencial de que foram despejados R$ 21,6 bilhões no Estado pelo governo federal para combater a pandemia.
As postagens de Bolsonaro somando valores de repasses obrigatórios, auxílios e outros recursos destinados aos Estados como se fossem uma benesse do Planalto provocaram como reação uma carta assinada por 16 governadores, incluindo nomes alinhados ao bolsonarismo como Ronaldo Caiado (DEM-GO), Cláudio Castro (PSC-RJ) e Ratinho Júnior (PSD-PR). “Em meio a uma pandemia de proporção talvez inédita na história, agravada por uma contundente crise econômica e social, o governo federal parece priorizar a criação de confrontos, a construção de imagens maniqueístas e o enfraquecimento da cooperação federativa essencial aos interesses da população”, diz um dos trechos da carta. O nome de Moisés não estava lá – e nem esperem que esteja em outras cartas.
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A narrativa de Bolsonaro sobre as políticas de combate à pandemia é colocar as culpas, sejam quais forem, nas costas dos governadores. Não à toa, fez sucesso nas redes bolsonaristas a bravata de que os governadores que fizerem lockdown deverão pagar futuros auxílios emergenciais às populações de seus Estados. A carta dos 16 governadores é uma reação a essa narrativa, porque ela não poupa nem mesmo os alinhados. Por isso, nomes como Caiado acabam se somando a oposicionistas óbvios como Flávio Dino (PCdoB-MA) ou os presidenciáveis João Dória (PSDB-SP) e Eduardo Leite (PSDB-RJ). O tucano gaúcho, aliás, foi às redes sociais ainda nesta segunda-feira para destrinchar o que significavam os R$ 40,9 bilhões que Bolsonaro disse ter mandado para o Rio Grande do Sul. Nas redes sociais, Leite afirmou: “o presidente da República mistura, sem explicar, todos os repasses federais (até os obrigatórios pela Constituição Federal) e fala que mandou R$ 40 bilhões pro Rio Grande do Sul. Se a lógica é essa, fica a dúvida: como o Rio Grande do Sul mandou para Brasília R$ 70 bilhões em impostos federais, cadê os nossos outros R$ 30 bilhões que enviamos?”.
Renato Igor: O sorriso de Moisés a Bolsonaro em Santa Catarina
Não espere – e se esperar, espere em lugar confortável – atitude semelhante de Moisés em relação a Bolsonaro em plena tentativa de realinhamento e trégua com Bolsonaro. Ele vai silenciar e apanhar quieto, mesmo quando discordar do presidente. Após enfrentar o pior da crise política local e da própria pandemia, Moisés aposta no rearranjo político com forças tradicionais para concluir em paz seu governo, mas sabe que qualquer plano de reeleição – e a intenção existe – depende de recuperar parte da torcida que perdeu, inclusive entre os bolsonaristas. Moisés acredita que os recursos em caixa podem viabilizar a retomada da popularidade do governo, especialmente com obras de infraestrutura. Mas ele sabe que seu projeto político é incompatível com a pecha de traidor do presidente de quem herdou os votos em 2018, quando era um desconhecido entre os catarinenses.
Na última visita de Bolsonaro a Florianópolis, Moisés discursou como quem tenta convencer o presidente de que é um aliado e ouviu sorrindo as provocações no discurso presidencial. É hora de engolir sapos, entende o governador. Em 2022, se for candidato – e deseja ser -, Moisés pedirá votos para Bolsonaro mesmo que o presidente o ignore, mesmo que o presidente peça votos para outro candidato a governador. Não há mais outro caminho para quem um dia achou que poderia se desacoplar de seu grande cabo eleitoral.
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