No primeiro ano de mandato de Carlos Moisés (PSL) à frente do Estado, a vice-governadora Daniela Reinehr (PSL/Aliança) exerceu aquele papel que Michel Temer (MDB) um dia definiu como “vice decorativo”. Nada de importante lhe caía nas mãos, suas costuras políticas eram ignoradas ou desautorizadas. Emparedada, sumiu.
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Mais do que a ação de Daniela Reinehr, foram os contextos políticos nacional e estadual que lhe deram a condição de escapar do isolamento imposto pelo núcleo duro que cerca o governador do Estado. O racha nacional entre os fiéis ao presidente Jair Bolsonaro e aqueles que queriam fazer do PSL um partido para além do bolsonarismo foi o mais importante desses contextos. A saída de Bolsonaro para criar o Aliança pelo Brasil precipitou escolhas que não precisariam ser tomadas agora. Na separação de bens, Moisés logo optou pelo PSL “com a cara do governador”.
No contexto estadual havia uma expectativa pelo racha, especialmente em função do rompimento dos deputados estaduais Ana Campagnolo, Felipe Estevão, Jessé Lopes e Sargento Lima com o governador. Eles estadualizaram o racha nacional e Moisés aceitou o jogo. Estava mesmo difícil a convivência. Foi insuflada por esse grupo – bolsonarista, verborrágico e disposto ao confronto – que Daniela Reinher fez o movimento rumo ao Aliança, anunciando que iria para o partido do presidente justamente no dia em que o deputado federal Eduardo Bolsonaro estava em Criciúma para uma celebração bolsonarista.
Mas o perfil de Daniela é mais discreto que o de sua turma e ela logo se recolheu. Agora, depois de viver 14 dias de interinidade como governadora e em meio a um pedido de impeachment feito na medida para sangrar Moisés politicamente, a vice tenta mais uma vez mostrar disposição para o protagonismo. Em entrevista ao colega Renato Igor, admitiu distanciamento do governador e se autoconcedeu a missão de tratar diretamente em Brasília – onde supostamente as portas lhe estão mais abertas – a vinda de recursos federais para o Estado. Quase um governo paralelo.
Na história recente de Santa Catarina não vivemos esse tipo de antagonismo entre governador e vice eleitos. Eduardo Pinho Moreira (MDB), quando vice, às vezes fazia alguma reclamação em público – mais para atender bases do partido ou da região. O estranhamento entre os dois deu-se quando Colombo renunciou e o emedebista disse que o Estado estava quebrado.
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Luiz Henrique da Silveira (PMDB) manteve Pinho Moreira e Leonel Pavan (PSDB) calmos durante seus mandatos – cujos meses finais lhes deu junto com aposentadorias. Paulo Bauer (ainda no PFL) foi fiel e discreto no governo Esperidião Amin (1999-2002), assim como José Hülse com Paulo Afonso Vieira (1995-98) e Antonio Carlos Konder Reis com Vilson Kleinübing (1991-1994). Por aí vai.
O antagonismo entre Moisés e Daniela é uma das expectativas que 2020 traz para o cenário político catarinense. Vai depender muito do perfil da vice, até agora titubeante nos momentos de confronto. A chance bateu mais uma vez à porta da residência oficial da vice-governadora. O mesmo Michel Temer que citei no começo do texto pela definição de vice decorativo é o que se soube deixar de sê-lo quando lhe bateu à porta expectativa de poder.