Se todas as expectativas do mundo político e jurídico se confirmarem na sexta-feira e o governador afastado Carlos Moisés (PSL) sobreviver ao processo de impeachment, restará à governadora interina Daniela Reinehr (sem partido) a infeliz coincidência de ser a bolsonarista que entregará ao titular um Estado em vermelho. No caso, 13 das 16 regiões do mapa catarinense marcadas pela cor que representa o risco gravíssimo para transmissão do coronavírus.
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Não se trata de responsabilizar unicamente a governadora interina pela situação que vive o Estado – a maior ocupação de leitos de UTI no Sistema Único Saúde em toda a pandemia, como apontou reportagem do Diário Catarinense na quarta-feira. É inegável, no entanto, que o governo vacilante de Daniela Reinher tem parte no problema. Em 30 dias no cargo, completados nesta quinta-feira, o interina falhou em suas articulações para virar titular, em mostrar respaldo político ou popular e se mostrou titubeante até em questões banais – como apagar um tuíte em que dizia às pessoas que usassem máscaras.
Ao fim de 30 dias e na véspera do julgamento que deve recolocá-la na função de vice-governadora, a marca de Daniela em sua passagem pelo governo é a imagem em que tira a máscara ao constatar que era a única autoridade que a utilizava o utensílio durante a formatura da Polícia Rodoviária Federal em que fez de tudo para mostrar alinhamento ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), incluindo tirar a máscara. A governadora interina gastou seus primeiros dias correndo atrás do presidente por um vídeo – conquistado – mas não conseguiu convencer a política catarinense de que estava em condições de governar o Estado.
Ela tentou, sem sucesso, mudanças de impacto no secretariado. Não conseguiu. Esforçou-se pela liberação das aulas presenciais ao mesmo tempo em que o mapa do coronavírus se tingia de vermelho. Como cereja do bolo, promoveu uma estranha e desastrada revogação do aumento salarial dos procuradores do Estado que motiva o processo de impeachment que afastou Moisés. Um gesto brusco de descolamento que deve aprofundar o fosso entre ela e o titular do cargo, última tentativa de criar um fato novo na véspera do julgamento do mérito da chamada “verba de equivalência” pelo órgão especial do Tribunal de Justiça. A vitória dos procuradores, por 12 votos a sete, vai ajudar a pavimentar a volta de Moisés ao cargo que já estava decidida pela política. O factóide de Daniela, incentivada pelo criador de factóides Ralf Zimmer Junior – autor do pedido de impeachment – só serviu para carimbar à interina a marca da inconstância nas posições.
O mundo da política, e não falo apenas dos deputados estaduais, mas também dos prefeitos eleitos nas principais cidades, já trata Moisés como governador de fato. Ele aproveitou o mês ausente para se mostrar mais humilde, atencioso, disposto à conversa. Foram muitas, dentro e fora da Casa d’Agronômica ou por telefone. A grande expectativa é como será o retorno de Moisés ao cargo e quanto ele estará disposto a abrir o governo para composições políticas. É o que devemos ver nos próximos meses. Há expectativa por um governo de coalizão. A primeira aliança a ser consolidada é o MDB, que já apoiou o primeiro ano de mandato do governador afastado e que estaria encaminhando a reaproximação, fechando feridas de quem se sentiu parceiro tolerado, não desejado. Moisés quer mostrar que será diferente.
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Com o presidente da Assembleia, Júlio Garcia (PSD), o gelo foi quebrado. Nos últimos meses, o governo Moisés tratou o presidente do Legislativo como o inimigo a ser combatido na batalha do impeachment, enquanto o parlamento via na assunção do pessedista ao comando do Estado a solução para a crise política. Ambos foram derrotados pelo surpreendente voto do deputado estadual Sargento Lima (PSL) no Tribunal do Impeachment, livrando Daniela do afastamento e impedindo a improvisada gestão parlamentarista de virar realidade.
Derrotados, Moisés e Júlio baixaram as armas, conversaram. Moisés foi à Alesc na primeira semana de afastamento, na última quarta foi a vez de Júlio ir à Casa d’Agronômica, acompanhado do líder da bancada do PSD, Milton Hobus. Os pessedistas não devem participar do governo, mas vão baixar o tom. A conversa tratou do futuro, do fechamento do ano no Executivo e no Legislativo. Uma conversa com o governador de fato, dois dias antes dele retornar ao cargo.
Quando isso efetivamente acontecer, Daniela deve voltar ao exílio de poder na residência oficial de vice-governador, em Coqueiros, de onde comandou o Estado nas últimas semanas. Pela relação tensa estabelecida com a equipe de Moisés nos últimos 30 dias, será o posto de figura decorativa que exerceu na maior parte do tempo. Não conseguiu ir além disso.
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