Foram 20 centavos que colocaram a política brasileira em curto-circuito em junho de 2013, com os protestos contra o aumento das passagens de ônibus em São Paulo que desencadearam manifestações contra tudo que estava ali. Passados cinco anos, um improvável presidente Michel Temer (MDB) tenta debelar com 46 centavos e mais um punhado de medidas outro protesto que paralisa o país e que eleva em milhares de watts o choque que o Brasil levou e do qual a classe política nunca se recuperou.
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São muitas diferenças entre as chamadas jornadas de junho de 2013 e a atual greve dos caminhoneiros. Cinco anos atrás, o movimento começou estudantil e à esquerda, empunhando uma bandeira pontual, o passe livre. A violência da repressão aos protestos levou mais gente à rua, a insatisfação com os gastos da Copa do Mundo e os indícios de superfaturamento no construção de estádios, a fadiga de material da ampla coalizão política liderada pelo PT no Planalto; diversos fatores levaram as manifestações para longe da origem. Em determinado momento, a esquerda desistiu de disputar aquele protagonismo e deixou a rua livre para manifestantes mais identificados com a direita – um grupo que votou calado no PSDB por anos diante da falta de opções.
Mais uma vez, os protestos em 2018 nascem de uma demanda pontual. O preço do diesel sufoca caminhoneiros e empresários do setor de transporte. Mais uma vez, a internet é o combustível para propagação quase espontânea das manifestações. Em 2013, foi o Facebook; agora, o Whatsapp. Como da outra vez, não há lideranças consolidadas e os políticos estabelecidos têm dificuldades de se aproveitar do movimento.
Mas há diferenças substanciais. A principal é que os protestos de 2013 dependiam de grandes quantidades de pessoas na rua, o que dava limites ao tempo em que a mobilização seria mantida. Os manifestantes conseguiram parar as cidades por algumas horas, depois voltavam para o conforto de casa, para a geladeira cheia, postavam as selfies em pontes fechadas na rede social preferida. Os caminhoneiros tem, sim, condições de realmente parar o país e estão mostrando isso com esmero.
Outra diferença é que o viés dos protestos nasce à direita, sob o signo da antipolítica. A semente lançada cinco anos atrás reequilibrou as forças políticas e levou a uma eleição presidencial que rachou o país em 2014, manteve-se atuante e vitaminou as manifestações que pediram e levaram o impeachment de Dilma Rousseff. Percebem agora o poder capturado por um grupo ilegítimo na urna, no discurso e na prática.
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A cada ação de Temer para tentar fazer os caminhoneiros voltarem ao trabalho, os manifestantes percebem a fraqueza de quem não mais governa e dobram a aposta. Até onde vamos? Difícil dizer. Ainda não entendemos completamente junho de 2013 e a vida nos apresenta um desafio ainda mais complexo. Certamente terá efeito nas urnas. Esperamos que apenas nelas – ou serão centavos caros demais ao país.