Sol adriático, praias cheias – apesar da lamentável encolha da areia. O verão viveria os seus dias de glória estival não fosse a tortura que é frigir ao sol, encalhado num interminável engarrafamento.

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Um bom consolo é pensar que nos albores do século 20 já foi pior. Sobrava praia, mas não havia estradas. Chegar a Canasvieiras era uma viagem pela estrada velha, até encontrar as pitangueiras à beira-mar. Ar-condicionado, banho de mar e cervejota gelada. Nenhum desses três “refrigérios” existia. Ar-condicionado eficaz é modernidade do terço final do século 20. Cerveja é um “bem” ancestral, vem lá do tempo dos faraós – tudo bem. Mas a condição de hipergelada é “complemento” que dependia da fabricação de um excelente freezer e de bons compressores. Quanto ao banho de mar… acreditem: era proibido.

Imaginem um dia de calor intenso, beirando os 40 graus, lá pela segunda metade do século 19. Tirar a camisa e correr para um mergulho era um crime municipal contra as “posturas”, capitulado no artigo 86 do Código de Posturas Municipais.

A Notícia Histórica de Nossa Senhora do Desterro, de mestre Oswaldo Cabral, registra um interessante caso de banho “castigado”:

“Na força do calor de 1857, quatro rapazes foram tomar banho de mar na Praia de Fora. Um deles era  filho do administrador da Fazenda Provincial, Antônio Justiniano Esteves, o ‘moleque’ que hoje empresta o seu nome à rua que termina justamente no local do seu delito: a rua Esteves Júnior.

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Pais severos eram a marca daquele século. E dizem que o jovem Esteves Júnior pôde sentir no próprio lombo o peso da mão paterna. O artigo 86 simplesmente multava, ‘se fosse cidadão livre’, ou encarcerava, ‘se fosse escravo’, aquele ‘que se pusesse nu e assim se mostrasse nas praias e nas fontes, incorrendo em ato escandaloso’.”

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Nu era qualquer espécie de “pouca roupa”. Banhar-se sem camisa já era estar nu. Praia, definitivamente, não era lugar de passeio, nem de gente. Muito menos de aglomeração de pessoas seminuas. No passado, ninguém jamais conceberia a ideia de sugerir esse público refresco:

– Vamos tomar um banho de mar?

Era o que de mais esdrúxulo poderia acontecer a uma pessoa no verão: pôr-se quase nua neste marzão de Deus.

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