Dizem os especialistas — e nem falo no doutor Freud — que sonhamos todos os dias, mas não nos lembramos de todos os sonhos. Só nos lembramos da parte final, vizinha do despertar. É a apoteose do cinema mental, quando o “filme” já está próximo do seu costumeiro “happy-end”.
Continua depois da publicidade
Ocorre que os tempos andam tão sinistros que passei dias sem sonhar. Ou só vi filmes em preto e branco — alguns, apresentados como pesadelos, estrelados por essa turma de políticos que trocou a “política” pela “polícia”.
Talvez a manhã típica de um verão embaciado, em que predominam os dias carrancudos, de ventos uivantes e tempestades assassinas — tenha me estimulado a sonhar “colorido”. Um legítimo “Cinemascope”. Color by De Luxe e som Dolby Stereo, como nas melhores telas de cinema.
Os sonhos em cores, com direito a Oscar de efeitos especiais, são aqueles que ocorrem num estado de “semivigília”, o cérebro ainda em intensa atividade, o olho na “posição REM – [Rapid Eye Moviment]. Ou seja, o olho ainda vivo, “ladino”, como diria um bom Mané.
Sonhei que o Brasil acordara “outro”. As grandes cidades amanheceram sem favelas e sem tiroteios. Os políticos fizeram um “mea culpa” e se regeneraram. Houve até casos de “haraquiri”, à maneira do resgate japonês da própria honra, o sujeito se auto-estripando, envergonhado da própria conduta criminosa.
Continua depois da publicidade
Já imaginaram? Um Brasil “limpinho” e asseado, tudo de volta aos seus lugares. Bolso era bolso, cueca era cueca, os “propineiros” chegaram a fazer fila no Banco do Brasil. E sabem pra quê? Foram lá devolver a mesada indevida…
Acreditem ou não: no meu sonho colorido, vereadores e deputados fizeram aprovar um projeto de lei, de origem parlamentar, tornando “voluntária” e “honorífica” a sua atividade cidadã. Todos abdicaram dos salários e das mordomias — até do auxilio-moradia!
***
No meu sonho, a Justiça não era tarda, nem falha, as cadeias eram albergues dignos e humanos. E o Brasil se igualara à Escandinávia, como um dos países de menor índice de acidentes de trânsito do planeta.
Acordei com sol e com as cores da manhã deslumbrante, que as cigarras saudavam lá fora, os ipês e as buganvílias derramados em roxo e amarelo.
Continua depois da publicidade