Quando ele chega, o corpo se contrai. As pessoas se encolhem debaixo de uma coberta. Mas o frio é intrinsecamente bom pra se tomar um tinto de estirpe, como o chileno Montes Alpha, aquecendo as orelhas com um daqueles antigos bonés de abotoar no queixo.
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É bom pra subir a Serra a fim de “traçar” um frescal e devorar uma ovelha. É bom pra tomar um “camargo” em Lages, com os “índios” em torno da lareira. Café forte com leite espumante, servido em caneca de ferro esmaltado, adoçado com açúcar mascavo.
Frio é bom pra “estraçalhar” uma costela assada em fogo-de-chão, com “paçoca” tipica da terra: charque socado no pilão, misturado com farinha de mandioca – um incrível prato tropeiro, dos tempos das velhas trilhas.
O ciclo do frio faz bem à vida e aos romances desatados numa noite de lareira acesa. Paradoxalmente, o frio é calórico. Convida para um vinho cor de rubi, mais os fondues, os pinhões, as carnes, os chocolates, os licores de aroma forte.
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Houve época – ali pelos anos 1980 – que o frio e as nevascas pareciam ter abandonado as nossas estações alpinas. Os prefeitos de São Joaquim e Lages “rezavam” por uma “nevezinha” – e nada. A partir do século 21 parece que as nevascas resolveram se materializar, comparecendo com a adequada assiduidade ao calendário turístico.
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Voltaram as neves cinematográficas, capazes de alegrar a criançada e fornecer o “barro branco” para os bonecos e as “balas” para o canhoneio das ruas. A simples “perspectiva” da neve tem o condão de materializar diante de mim o “espectro” do prefeito Cândido Prudente da Silva – o “tio” Pruda – que Deus o tenha. O alcaide das neves joaquinenses costumava convocar os jornalistas ao primeiro sinal de uma “quirera”. Para que a clarinada não resultasse em frustração, fazia a ressalva:
– Olha, o tempo está para neve. Mas sabe como é: prever neve é muito difícil. Apenas um grau centígrado separa um pingo de chuva de um cristal de gelo… Olha, mas se não der neve, o amigo não perde a viagem: já tem uma “ovelhinha” suando na brasa…
E fazia “nevar” frescais, ovelhas e carreteiros – regados a vinho tinto.
Saúdo o “friozim” que chega e todas as suas lembranças mastigáveis.
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