Por causa do nome, todo mundo pensa que  a nossa “Desterro” era o destino de todo criminoso deportado pelas Cortes.

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Mas não era bem  assim. Na verdade, os bandidos mais perigosos, os assassinos ou os rebeldes sediciosos, eram desterrados para Angola.

A impunidade vicejava entre os “grandes” da Corte. Pero Vaz de Caminha usou o posto temporário de escrivão da Armada para pedir clemência a um sobrinho, Jorge Osouro, que batera a carteira da Coroa. O sobrinho reincidente em “malfeitos” fora desterrado para São Thomé e Príncipe, arquipélago ao largo da Costa africana.

Alguns notáveis, contudo,  eram “mais iguais que os outros” perante a lei do Desterro, de 1733.

Manoel Manso de Avelar, manda-chuva e chefe supremo da freguesia de Santo Antônio de Lisboa, protegia um padre acusado de homicídio. No perfil psicológico escrito por Oswaldo Cabral, o chefão daquela freguesia “tinha muito de Avelar e pouco de Manso”.

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Ele dava abrigo a um sacerdote de sobrenome “Manço” –  assim, com cê cedilha –  “que nada tinha de parente, mas muito tinha de safado”.

O crime do padre Manço: matou a facadas um jovem do lugar, movido por uma teia de intrigas. Pior: o motivo era “passional”. O padre e a vítima brigavam pelo amor da mesma mulher.

Inconformado, um morador da freguesia  escreveu ao Governador Geral do Brasil, protestando contra aquela impunidade:

– O padre-assassino continua livre, sendo seus aliados os juízes e Manoel Manso de Avelar, seu protetor.

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Esta versão desterrense do “Crime do Padre Amaro” – que Eça de Queirós haveria de escrever apenas em 1875 – ganhou registros policiais e o “devido processo legal” muitos anos depois dos fatos, por conta da instalação de uma Ouvidoria na Província de Santa Catarina.

Deu em nada. E o padre-transgressor continuou fugindo da Justiça, rezando missas, distribuindo hóstias e extrema-unções.

***

A partir da independência, em 1822, Desterro passou a experimentar uma fase de “distensão” em benefício dos “direitos humanos”, bandeira meramente retórica.

As torturas continuaram acontecendo dentro das cadeias. Mas, segundo o historiador Oswaldo Cabral, ao menos o pelourinho do Largo da Matriz foi retirado da vista do povo – “menos para justificar uma melhoria no regime penal, do que para simbolizar uma melhoria dos costumes e dos sentimentos”.

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Já os crimes hediondos podiam esperar. Nada mais parecido com o Brasil de hoje, que herdou a complacência de outrora.

Já havia juízes como Gilmar Mendes, viciados em soltar condenados.

 

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