Dono do Maranhão, aí incluídas as ilhas, os museus, os azulejos de São Luís e os governos estaduais, distribuídos entre ele próprio e a filha, eterna candidata, o patriarca José Sarney é um ser atemporal – umhighlander, muito mais imortal do que o escritor de fardão.
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Pois Sarney promete no seu site: “Cumprirei a minha promessa de me retirar da política no ano que vem. Vou cuidar dos meus bisnetinhos”.
Antes, será de novo cabo eleitoral da filha, na sua tentativa de governar o mais pobre dos Estados pela terceira vez.
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O riso, como diria o filósofo Henri Bergson, é uma convulsão histriônica, provocada pelo bom humor. E o humor seria “a quebra da lógica”. É daí que nasce o riso. Um chefe “popular”, cujos netinhos já têm filhos, anunciar que vai se aposentar da política para cuidar dos bisnetinhos, é um insincero. Político cascudo só abandona o ofício depois de empalhado. Seria até o caso do netinho duvidar: – Ah, bisa, conta outra…
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Pois nosso Sarney avisou, em meio à consternação geral dos puxa-sacos, que chegou ao fim a sua interminável carreira política, iniciada nos anos 1940 como vereador de São Luís, com direito a mandatos eternos na Câmara e no Senado.
Quantas vezes o Frank Sinatra se despediu da ribalta? E o Pelé? E o Romário? E o Ronalducho? E o Caubi Peixoto?
Quem sabe Sarney não deixa pra 2020, quando se despediria como atleta da “Paraolimpíada para os Patriarcas da Quarta Idade”?
O “Patriarca” de Garcia Márquez também “morria” de vez em quando. Encontravam-no desfalecido e carcomido pelos urubus em seu gabinete, “com a mesma roupa e na mesma posição”.
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Os súditos não choravam. Os desafetos não se animavam. Sabiam que era uma morte passageira. O velho sempre ressurgia de seus surtos de catalepsia, para o temor de toda a gente:
– Meu Deus, pra quê fui falar mal dele?
De vez em quando, sua amante, Letícia Nazareno, desfazia-se em pranto, fazendo crer que eram veementes os indícios de sua morte.
– Acho que agora o coitadinho se finou.
Mas o patriarca ressuscitava, mais autoritário do que nunca. Quando completou 186 anos, contra todas as esperanças do povo, foi para o balcão do Palácio anunciar:
– Estou sentindo uma comichão. Acho que é a coceira da terceira dentição.
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