Saúdo o Berbigão, que volta às ruas de Floripa com a missão de reinaugurar o verdadeiro Carnaval de raízes ilhoas, em torno da Praça XV.
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Houve época em que os Carnavais de Florianópolis se orgulhavam de ser “o terceiro do Brasil”, dizia-se – com certo exagero – que só perdia para o do Rio e o de Recife. Vigorava a natural espontaneidade entre os foliões que saíam de sujos pelo centro histórico, além do empenho comovente de Copa Lord e Protegidos, as duas únicas Escolas de Samba que garantiam a “Moveable Feast”, o samba derramado em torno da Praça, ou, como se dizia, “do Jardim ”.
A decadência daquela festa começou nos anos 1970, com a expansão urbana em direção ao aterro da Baía Sul, para onde foi desterrada a maior festa popular da Cidade. Só nos anos 90 esse “décor” começou a ser recuperado, com a providencial invenção do Berbigão do Boca.
Como toda conspiração etílica , o bloco começou numa mesa de bar , nascido do agudo inconformismo com aquela apatia que ameaçava sepultar o Carnaval de rua. Numa quarta-feira de cinzas especialmente lúgubre, meu amigo Paulinho Abraham, o Boca, inspirou-se no Bacalhau do Batata, que até hoje desfila pelas ruas de Olinda. O bloco pernambucano prolongava o Carnaval quaresma adentro – esticando-o até o sábado seguinte. Batata , um garçom com alma de Orfeu, folião sanguíneo, trabalhava durante o tríduo e não podia se diverti . “Vingou-se” prolongando a festa. Pendurou uma peça de bacalhau num estandarte, rodeou-o por um feixe de batatas – e proclamou o seu “Bacalhau” como a continuação do grande banquete.
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Boca não deixou a bandeja cair. Juntou pitadas da irreverência juvenil – que o habilitava aos cascudos do padre Otto, nos bancos do Colégio Catarinense dos anos 60 – a uma insuspeita vocação cardio-vascular para celebrar o tríduo . Adotou o nosso culinário molusco para simbolizar a ressurreição do Carnaval de rua, cercou-se das “mulatas que não estão no mapa” e incorporou o espírito dos foliões memoráveis, criando a ala dos bonecos, tocante homenagem a inúmeras figuras da Ilha.
Pronto! – estava fundado o Berbigão, com a propriedade de ser um bloco “ecumênico”, reunindo expressões de todas as outras Escolas de Samba , mais o folião que estivesse “a fim”.
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O Boca capturou a ideia, mas aperfeiçoou o princípio. Se o negócio era prolongar o Carnaval , por que não começá-lo mais cedo, uma semana antes?