Todos os anos, como já acontece na atual Flip de Paraty, volta à agenda velha/nova discussão sobre o formato do livro – de papel ou virtual – e sobre a ameaça da perda de mercado da tradicional embalagem.
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O escritor Rui Castro, um dos convidados do encontro mundial de escritores, sustenta, com verve, que o livro tradicional é eterno. E continua dando de 10 a zero nos formatos virtuais.
– Se um dos veículos tiver que morrer, o leitor ficará sabendo deste funeral por um livro de papel…
O livro-papel é imortal. Júlio César morreu assassinado, em 44 AC., antes de construir uma grande biblioteca romana, consumada por Trajano, a “Úlpia”, no século II depois de Cristo. No século XX, não houve regime, iluminista ou obscurantista, que não cultivasse as suas bibliotecas, das quais são paradigmas a do Museu Britânico, a da Academia Francesa, a de Lênin e a do Hermitage.
A biblioteca se informatizou e evoluiu de tal modo que, hoje, elas estão eletronicamente ao alcance de qualquer internauta. A maior biblioteca do mundo – a do Congresso americano – está disponível ao comando de uma tecla. E a maior das livrarias on-line, a Amazon, vende bem o Kindle, aparelho do tamanho de um livro de bolso, pesando apenas 300 gramas, capaz de receber o download de qualquer dos seus 88 mil títulos.
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O mágico aparelho-leitor dispensa o computador. É uma espécie de celular receptivo que já armazena muita literatura, ao ponto de se transformar numa imensa biblioteca virtual.
Com ele, todo o universo da cultura mundial estará em segundos na sua mão. De repente, você pode comandar a entrada de, por exemplo, Os Maias, de Eça de Queirós. E escolher o capítulo em que o Ega estraçalha com volúpia um “Bife em frigideira de barro à Lisboeta”. Ou alinhar Crime e Castigo, de Dostoievski, no trágico momento em que a angustiada Sonya decide acompanhar Raskolnikof à Sibéria, para junto com ele “cumprir pena” pelo assassinato da velha Alena Ivanovna.
O Kindle pode não substituir os livros usuais – diz o dono da Amazon, Jeff Bezos – “mas faz coisas que um livro não faz”.
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O livro tradicional, contudo, revela fôlego de gato e viverá bem mais do que sete vidas. Imagino que viverá para sempre, pois desperta no leitor um vínculo tátil e olfativo.
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Livro não prescinde de cheiro, bolor e traças – ao correr do tato humano. É insubstituível nas mãos e no coração do homem.