Sou um ilhéu visceral, daqueles que não conseguem morar fora daqui sem sentir o cheiro da maresia e sem ir, pelo menos uma vez por semana, ao encontro da alma insular que se hospeda no Mercado Público ou nos altos do Morro da Lagoa.

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A Ilha é como uma filha. Mas também sabe ser mãe. De todos os sentimentos humanos, nenhum é mais natural do que o amor pela aldeia, pelo vale ou pelo bairro, ou pela ilha onde vivemos os nossos primeiros anos. O berço, este lugar que é chamariz para os nossos ossos e a nossa carne, fala às nossas recordações conscientes ou inconscientes: um perfume, uma perspectiva, um eco, um bordão, um cheiro – o cheiro da terra molhada, talvez. 

Somos, sou, testemunha de tantas mudanças neste lugar que mexe com os nossos sentimentos. Nossa terra é aquela em que podemos conhecer nossos vizinhos, alegrar-nos com nossos progressos e afligirmo-nos com o nosso luto.

É partilhar com os “comuns” o patrimônio da mesma cultura. É se consolar com o fato de que as gerações vão passando, mas as tradições caminham junto, sem repelir certa “adaptação”.

Dou as boas-vindas aos que chegam e, generoso, até divido com os adventícios o pôr do sol e os espelhos que refletem a beleza da Ilha. Estamos vivendo a mais bela época do ano, o inverno, com sua luz ambarina flutuando sobre o corpo sensual da “Ilha-Mulher”.

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Basta assistir, com devoção, ao maior espetáculo da terra, que é o nascer do sol na Lagoa da Conceição, instante em que o Todo Poderoso revive o melhor momento da “Criação”.

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O ideal seria a chegada do progresso sem profanação. E que os recém-chegados aqui encontrassem o Éden, sem conspurcá-lo.

Melhor seria se nossos pescadores não deixassem de fiar e de lançar suas tarrafas, nossas rendeiras não abandonassem as rendas de bilro e as “tramóias” de bom crivo. E que convivessem, em paz, com os filhos da Web, a grande rede global.

Não devemos ser ingratos, porém. O computador facilitou nossas vidas, tornou “instantânea” a comunicação universal – e já está, aos poucos, decretando o fim da telefonia fixa. Uma economia para o nosso bolso.

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Aceito a “modernança”, mas admito: sou do tempo em que a única rede bem visível era a da pesca artesanal.

 

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