Contemplando a beleza indizível de Itaguaçu, lembro-me de uma crônica do velho Rubem Braga, enaltecendo a reverência portuguesa pelo mar e pelos seus navegadores.
Continua depois da publicidade
Descrevia um encontro de lisboetas, no Rio, com o transatlântico luso Santa Maria. O belo barco aparecera na enseada de Botafogo, desaparecera atrás do Pão de Açúcar para ressurgir em Copacabana, Ipanema e Leblon, sempre acompanhado pelos “patrícios” – que o seguiam por terra, e de táxi!
Belo “Santa Maria”. Ao ressurgir, ao largo da Avenida Atlântica, já em mar alto, os portugas deliraram, atirando seus chapéus para o alto e gritando para os passantes:
— É o Santa Maria! O Santa Maria!
Pois aqui, na Ilha de Santa Catarina, esta visão do transatlântico não teria sido possível, eis que o velho porto da cidade já não serve mais pra nada, desde os anos ditos “dourados”, os 1950 e 1960.
Continua depois da publicidade
Até parece que a cidade, medularmente marinha, “garrou nojo do mar”, como diria um Mané genuíno. Sabemos que, houve época, o trânsito de embarcações entre a Ilha e o continente era intenso, como retratava em suas telas o “marinheiro-pintor” Eduardo Dias.
O que secou não foi o mar. O que se escoou pelo ralo foi a vontade política dos que tinham a obrigação de zelar pela boa navegação, mantendo o porto e os trapiches em boas condições de uso, ligando Floripa ao Mundo.
***
Só navega em Floripa quem nutre uma invencível vocação para Cristóvão Colombo. Ou quem consegue içar o seu barco, da terra para o mar, ou vice-versa, reunindo para isso uma guarnição de forçudos navais, dispostos a carregar o barco “no muque”, ou sobre carroças, como fez Giuseppe Garibaldi com o “Seival” e o “Farroupilha” – ou seja, será necessário quase uma revolução, um movimento sedicioso.
Nosso mar rendilhado deveria ser a solução ideal para a imobilidade urbana. Deveríamos todos ser Colombos, Américos e Cabrais, a bordo de suas “Santa Marias, Pintas e Ninas”, rumo aos trapiches de Cacupé, Sambaqui, Santo Antônio, Jurerê, Canasvieiras, Cachoeira do Bom Jesus, Ponta das Canas – enfim, rumo a todas as nossas belezas de areia fina e águas tépidas.
Continua depois da publicidade