Nesta atmosfera pouco cheirosa em que vivemos, a cinco dias das eleições, sinto falta do  cheiro da maresia e do som das ondas marulhando a borda das canoas ancoradas no antigo trapiche da Alfândega. Aliás, o centro histórico está cercado por tapumes, em obras, espera-se que não sejam eternas como costuma ser o ritmo das obras públicas no Brasil.

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Antigamente o local era banhado pelo mar, predominavam o  aroma das ostras, algas e da tinta fresca das baleeiras açorianas, amarradas ao cais do Mercado, descarregando peixe. Outras antiguidades o tempo levou. Onde está o Bar e Confeitaria Chiquinho, endereço da melhor empada e do melhor camarão recheado do Brasil? Entre suas mesas debruçadas para a calçada da Felipe Schmidt, fluía o mais genuíno papo da “manécracia”, entre chopes bem tirados e xícaras da rubiácea, escaldante e liquefeita. As pessoas se queriam bem, mesmo falando de política, em alto grau de civilidade.

Sinto falta do Senadinho e da sua cívica esquina tribunalícia, hoje descaracterizada por uma única portinha, configurando um Senado sem plenário. Onde estão as ostras que se grudavam às escadas do Miramar, arquibancadas das plateias de competições de remo e plataforma das lanchas que, no passado, faziam a ligação com o continente –  movimento hoje banido pelos inimigos do mar? Onde estão os carrinhos-de-cavalo que margeavam a Praça Fernando Machado, ali no sopé da Praça XV, estacionamento dos cavalos brancos (e baios) de Napoleão, valentes puxadores das  carruagens da nossa infância? Onde estão os navios vapores da Hoepcke, casa de navegação que mantinha vivos os trapiches da Rita Maria, da Alfândega e do próprio porto de Floripa, onde hoje se situa o parque de Coqueiros? Aliás, onde estão os trapiches das baías Sul e Norte, promontórios que nas manhãs ensolaradas acolhiam os gazeteiros do Instituto de Educação e do Colégio Catarinense?

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Há nas ruas do centro histórico uma horda apressada e desconhecida, exército em marcha batida para os apinhados terminais de ônibus do centro. Sequer providenciaram uma passagem subterrânea para essa gente destemida e escandalosamente jovem, como a nova cidade que se ergue sobre os cheiros da antiga.

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