As “narrativas” e a invenção de uma “pós-verdade” tomaram conta das redes sociais e começam a, perigosamente, reescrever o que é verdadeiro. A mentira tornada verdade.
Continua depois da publicidade
Nem há grande novidade nisso. O libelo de George Orwell contra o Estado totalitário, que reescrevia a história no clássico 1984, também denunciou o “duplipensar” da política:
– A linguagem política é destinada a fazer com que as mentiras soem como verdades e a simples brisa receba uma aparência de solidez.
No seu livro “Auto-Engano”, Eduardo Gianetti da Fonseca se vale da filosofia e da ética para analisar o comportamento prático do brasileiro, a partir de uma reflexão de Niestzsche:
– Mentir para os outros é exceção. A principal mentira é aquela que a pessoa conta para si mesma.
Continua depois da publicidade
No Brasil, está em ascensão a “narrativa”. Uma versão interesseira dos acontecimentos: quem conta está criando a “pós-verdade”, como se esta, a “verdade”, comportasse mais de uma versão.
É a tal história: repetir mil vezes uma mentira acaba convencendo o seu autor de que está espalhando uma verdade. É o auto-engano, tão ao gosto do político tupiniquim, conjugado pelo verbo transitivo direto “prometer”:
– Eu prometo criar 10 milhões de empregos. Eu prometo um salário mínimo de R$ 3 mil…
Em tempo de guerra, mentira como terra. Em tempo de campanha, mentira como banha.
***
Gianetti foi buscar na língua inglesa a equivalência dessa fraude. Chama-se “self-deception”. E estranha que os dicionários da língua portuguesa não tenham adotado um vocábulo de significado correspondente. Por isso, criou o neologismo “auto-engano”, destinado a seguir um longo trajeto na lexicografia nacional. O “auto-engano” e o “me engana que eu gosto” são práticas mais do que consagradas nas relações eleitos-eleitores.
As eleições de 2018 constituem uma nova chance de redenção. Das urnas não emergem mentiras. Desde que os eleitores não estejam contaminados por mentiras contadas como se fossem verdades.
Continua depois da publicidade
Se o mundo ficar ao sabor das “narrativas”, teremos muitos governos ilegítimos. A cartilha de Donald Trump vai prevalecer e a verdade será o que o seu twitter disser.
Leia outras crônicas de Sérgio da Costa Ramos